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Macri busca o apoio do Brasil para mudar a política latino-americana

Novo presidente argentino e Dilma Rousseff querem fechar um acordo comercial com a UE Um segundo ponto de interesse é se afastar de Nicolás Maduro

O presidente eleito Mauricio Macri, na semana passada.
O presidente eleito Mauricio Macri, na semana passada.prisa

Mauricio Macri e Dilma Rousseff vêm de mundos muito diferentes. Ele é um milionário que vem da direita argentina e ela é uma ex-guerrilheira e integrante da esquerda brasileira. Mas os dois parecem interessados em um entendimento para fazer clara mudança na política latino-americana. Macri coloca o Brasil como sua prioridade absoluta. A possibilidade de um acordo do Mercosul com a União Europeia (UE) é um objetivo prioritário dos dois para sair da crise. Também concordam que devem se afastar do venezuelano Maduro, embora Dilma rejeite a proposta de Macri de aplicar a cláusula democrática contra a Venezuela.

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Dilma, Lula e o Partido dos Trabalhadores trabalharam muito duro para impedir a vitória de Mauricio Macri na Argentina. Lula passou uma semana em Buenos Aires fazendo campanha com Daniel Scioli, e a presidenta recebeu o candidato em Brasília e prometeu ajuda. Mas, depois do inesperado sucesso eleitoral de Macri as coisas estão mudando rapidamente na América Latina. O argentino já esqueceu essa ajuda de Dilma ao kirchnerismo e colocou sua equipe, especialmente Fulvio Pompeo, homem-chave nas relações internacionais, trabalhando para conseguir que o Brasil seja seu parceiro estratégico. Ele fechou uma visita de Macri ao país para esta sexta-feira, antes de sua posse. O presidente eleito se reunirá com a presidenta em Brasília e com empresários em São Paulo.

Dilma não gosta da estratégia de Macri com a Venezuela porque acha que ele vai muito rápido. O argentino, que quer dar um giro de 180 graus na política externa de seu país e se aproximar dos Estados Unidos e da UE, prometeu que na próxima cúpula do Mercosul no dia 21 de dezembro vai solicitar a aplicação da cláusula democrática para a Venezuela pela prisão de opositores como Leopoldo López. Dilma não vai concordar, entre outras coisas porque isso significaria ainda mais problemas internos no Partido dos Trabalhadores. “A cláusula não pode ser usada em cima de suposições. Para aplicá-la contra a Venezuela devem existir fatos qualificados”, disse a presidenta.

A presidenta do Brasil está marcando, pela primeira vez em seu mandato, um afastamento da Venezuela

Macri corre o risco de ficar sozinho ao querer chegar tão longe de forma tão rápida. Mas Dilma está marcando, pela primeira vez em seu mandato, um afastamento da Venezuela. Inclusive enviou uma carta a Maduro. Embora o conteúdo não tenha sido revelado, sabe-se que continha certo tom crítico e preocupação pelos rumos da política venezuelana, algo inédito. A primeira mudança foi notada com o episódio do assassinato do opositor Luis Manuel Díaz, na semana passada, durante um comício no estado de Guarico. O Ministério de Relações Exteriores divulgou uma declaração na qual dizia se unir à Unasul, rejeitando “firmemente o uso de qualquer tipo de violência que possa afetar o bom desenvolvimento do processo eleitoral”, e instando as autoridades venezuelanas “a investigar os fatos e punir os responsáveis”.

Para Macri a questão da Venezuela é simbólica, mas não prioritária. Com sua batalha contra Maduro vai se tornar rapidamente uma referência regional, especialmente para países como os EUA, eufóricos com a chegada do novo presidente argentino, como demonstra a ligação do norte-americano Barack Obama na semana passada.

Referente de direita

Macri também pretende ser um ponto de referência para os países europeus governados pela centro-direita como Alemanha, Espanha e Reino Unido. Mas também Itália e França, nas mãos da social-democracia, saudaram sua chegada. A Espanha se adiantou a todos com a visita do ministro de Relações Exteriores, José Manuel García Margallo, a Buenos Aires. Macri, que tomou muitas ideias do conservador Partido Popular para fundar seu partido, o PRO, é amigo de Mariano Rajoy (atual presidente de Governo espanhol) e de José María Aznar. O ex-mandatário espanhol vai chegar a Buenos Aires no domingo e na segunda-feira se encontrará com presidente eleito, segundo foi confirmado pela sua Fundação, a FAES.

Dilma rejeita a proposta de Macri de aplicar a cláusula democrática contra a Venezuela

O que realmente interessa ao argentino, de acordo com fontes próximas, é conseguir acordos com a União Europeia. As negociações UE-Mercosul já se prolongam por 16 anos sem progresso. E o Brasil também está muito interessado nesse acordo. Macri e Dilma, ambos com crises econômicas de diferente intensidade sobre a mesa, procuram investidores e acordos internacionais e também concordam com a necessidade de se abrir para a Aliança do Pacífico, o acordo assinado por Chile, Colômbia, México e Peru, que continua avançando.

Macri deixou claro no dia seguinte à sua vitória seu interesse em avançar nos acordos. José Augusto Castro, presidente da associação de empresas exportadoras do Brasil, classifica a Venezuela como “um fardo para o Brasil.” “No momento em que o Mercosul está negociando com a União Europeia e se aproxima da Aliança do Pacífico, a Venezuela do presidente Maduro se transforma em um atraso”, explica ele.

Acontece o paradoxo de que dois Governos tão diferentes como o do Brasil e o que tomará posse na Argentina no dia 10 de dezembro podem marcar juntos a mudança do continente depois de uma década na qual Lula, o venezuelano Chávez e os Kirchner lideraram a ruptura com os EUA que começou em 2005 na Cúpula de Mar del Plata, onde foi enterrado o projeto de livre comércio da ALCA. Brasil e Argentina apostaram em medidas protecionistas, mas parecem a caminho de uma mudança clara de política, embora com cautela para não destruir a indústria nacional.

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