_
_
_
_
_
Coluna
Artigos de opinião escritos ao estilo de seu autor. Estes textos se devem basear em fatos verificados e devem ser respeitosos para com as pessoas, embora suas ações se possam criticar. Todos os artigos de opinião escritos por indivíduos exteriores à equipe do EL PAÍS devem apresentar, junto com o nome do autor (independentemente do seu maior ou menor reconhecimento), um rodapé indicando o seu cargo, título académico, filiação política (caso exista) e ocupação principal, ou a ocupação relacionada com o tópico em questão

Fim do amor: como lidar

O intento do Facebook de aliviar o sofrimento e outros métodos simples da vida real para lidar com a vida depois da morte do relacionamento amoroso: não siga os passos do(a) ex

“Ah, insensatez , que você fez/ Coração mais sem cuidado/ Fez chorar de dor o seu amor/ Um amor tão delicado...” (Tom Jobim/Vinicius de Moraes)

Vida depois da morte pode até ser uma incógnita, dependendo da fé de cada um. O inferno depois do relacionamento amoroso, todavia, é quase uma certeza absoluta aqui no plano da perdição terrena. Se a criatura ainda toma conhecimento do dia-a-dia do(a) ex, a divina comédia da treta é mais pesada ainda. Por mais fofa e compreensiva que seja a triste figura abandonada.

Mais informações
#AgoraÉQueSãoElas
Saiba quando o amor começa
Desconectados do mundo, uni-vos
Pornocracia: faça você mesmo a capa da revista
A mulher busca um homem que não existe
Como se vingar de um marido traidor

“Podes crer, amizade”, canta Tony Tornado, aqui na trilha sonora desta crônica profilática. Seguimos, curáveis ou incuráveis. Havia recomendado ainda no tempo do Orkut, baseado na dor que eu mesmo deveras sentia, algo assim: evite seguir os passos da tal pessoa amada, por mais que se julgue bem-resolvido ao final do casamento, na rede social etc.

Uma década depois, vejo agorinha que o Facebook resolveu facilitar essa tarefa para os corações descuidados ou masoquistas. Ah, insensatez... Quando você, ainda em lágrimas, marcar o fim de um relacionamento, epa, o Face  – que fofolândia universal –, lhe dará opções para que os sinais daquele(a) desalmado(a) desapareçam da sua frente. Poderá, inclusive, impedir que a rede de amizade siga bisbilhotando fotos e posts da época em que os pombinhos pareciam um casal dos sonhos. O esquema começou a funcionar nos EUA. Em breve, eis a tendência, chegará ao seu smartphone em qualquer rincão do Brasil.

Óbvio que você já tinha os seus recursos, precauções e bloqueios. O piloto automático, no entanto, reforçará a parada. O leitor ampliará o poder do filtro, reduzindo a chance do ex, repare bem, farejar as suas pegadas e eventuais sacanagens.

É, seu moço, o amor nos tempos da extrema virtualidade carece de zelo duplo.

Só por hoje

Sei que a tentação é das maiores. Mesmo em casos de finais menos dramáticos. Se puder evitar, Lola, evite. Só por hoje, como no mantra diário do A.A. (Alcóolicos Anônimos). Recordo inclusive de crimes no noticiário, caro amigo ciumento: homens que não aguentaram a onda e assassinaram exs. Não custa fazer ecoar, como repetido alerta, as trágicas histórias e estatísticas do feminicídio no país, vide o mais recente mapa da violência.

Triste. Os marmanjos são frágeis e desequilibrados diante de um pé na bunda e apelam para a selvageria. A macheza ferida não permite, em incontáveis novelas reais, o epílogo. Mesmo quando o cara apronta mais que um incorrigível Barba Azul. Mesmo assim.

Ora, menino, se a malvada lhe deixou a mascar o jiló do desprezo, toma um porre, escuta um brega, um Chico ou um fino da bossa, chora no ombro do garçom amigo na madruga, afunda os cotovelos na fórmica do balcão de todas as esperas... Vale o botão de curtir humanamente a cornitude, vale a terapia, a psicanálise, vale o lirismo do vira-lata lambendo o reflexo da lua na sarjeta, só não vale a violência por palavras ou atos. Esquece. Sem essa, malaco, basta!

Ah, vale comer feito uma sucuri que engole um boi e rumina a plenitude gástrica e amazônica, vale barras de chocolate e brigadeiros na ansiedade, vale o fim de todos os regimes  – embora a tendência seja o(a) desalmado(a) nem ligar para a comida... Jamais o verbo sofrer harmonizará com o mundo gourmet.

Esquece. Sim, sabe o que vale mesmo, na contramão da engorda? Repito a autoajuda pelo método do cineasta oriental Wong Kar-Wai: corra, vá suar no parque, na rua, na praia, na ciclovia... Tirei essa lição de um personagem do filme Amores Expressos (1994). Um sensível policial de Hong Kong, cujo coração havia sido destroçado na chapa quente de uma garçonete, descobre, depois de experimentar todo fast-food da sofrência, a receita mais simples do universo:

“Amor é água!”, refletiu, depois de correr, correr, correr, suar, suar, suar, e sentir que o desespero amoroso estava indo embora com o perfeito funcionamento das glândulas. Óbvio que, diante da melancolia amorosa, é difícil até sair da cama, mas não custa tentar a receita. A Operação Lázaro está de volta: levanta-te e anda, condenado (a).

Xico Sá, jornalista e escritor, é comentarista dos programas “Extra-Ordinários” (Sportv) e “Papo de Segunda” (GNT).

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_