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Coluna
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O que impede o Brasil de se modernizar de vez?

Não é fácil a explicação para esta paralisia brasileira que impede que sua sociedade tome o caminho rumo à modernidade

Juan Arias

Com certeza o Brasil está retrocedendo em conquistas sociais e na defesa de alguns direitos humanos, o que indica que lhe pesa entrar no fluxo da modernidade das democracias mais avançadas. E isso apesar de o país estar em seu quarto governo progressista, presidido por um partido de esquerda, o PT, fundado pelo sindicalista Luís Inácio da Silva.

É grave para o Brasil que países irmãos deste continente o estejam ultrapassando no avanço para a modernidade, em questões de costumes e da defesa das liberdades civis.

Não é fácil a explicação para esta paralisia brasileira que impede que sua sociedade tome o caminho rumo à modernidade. Não é que faltem ao país movimentos, até de vanguarda, fortemente críticos aos poderes políticos retrógrados.

Há quem acuse os brasileiros, como sociedade, de ser mais conservadores que o Congresso, por exemplo, que hoje é um centro de resistência contra a modernidade. Os legisladores seriam apenas o espelho opaco e reacionário da sociedade.

Isso é verdade? Sem dúvida, o Legislativo e o próprio Governo não são um espigão que cutuque a sociedade e a sacuda de seu conservadorismo em termos de abertura nos costumes e nas liberdades, que hoje exigem, em especial, os jovens que vão à universidade, que leem e viajam.

E no país todo, a força da Igreja Católica, à qual pertence quase 65% da sociedade, e das igrejas evangélicas, mais alérgicas do que ela à mudança dos costumes, não contribui para apoiar a abertura da parte mais aberta e laica da sociedade, que deveria ser o fermento da conquista da modernidade.

Claro que há um elemento que talvez esteja por trás não só dessa dificuldade do país em avançar na defesa das conquistas sociais, mas também nesse retrocesso. Como sempre, o grande obstáculo é a maldita política das alianças para governar, baseadas numa espécie de compra e venda de apoios dos partidos para poder governar em paz.

Desde que, por exemplo, o PT de Lula, primeiro, e o de Dilma, depois, conquistaram o poder, já antes de chegar à Presidência da República tiveram que fazer acordos, e até firmar documentos de compromisso, para poder se eleger, com as forças mais reacionárias das igrejas – por exemplo, em relação à legislação sobre o aborto.

O ex-presidente Lula, que é agnóstico, confidenciou em entrevista a este jornal que não teria sido eleito “sem os votos dos católicos”, e Dilma teve que se comprometer, formalmente, durante reunião com várias confissões religiosas, a não legislar na questão de aborto, caso eleita.

Em outros países democráticos costuma acontecer o contrário: os Governos e os Parlamentos são, muitas vezes, mais abertos e progressistas que a massa conservadora da sociedade. Tornam-se, assim, um motor da mudança, e ao legislar se colocam ao lado da parte mais aberta e moderna da sociedade, e não o oposto.

Exemplo clássico é o da pena de morte. Sabe-se que, se depender, por exemplo, de um plebiscito nacional, em muitos países democráticos o voto seria a favor de sua adoção. Se tal lei não passa é porque, nesses casos, Governos e Congressos são mais abertos que sua sociedade.

O Brasil tem, hoje, a má sorte de contar com um Legislativo que é mais realista que o rei em matéria de conquistas sociais e de defesa dos direitos humanos. E seus presidentes da República, apesar da filiação a um partido progressista como o PT, estão algemados, ou se algemam, por interesse eleitoral, ao que exige um Legislativo dominado por forças retrógradas.

É um Congresso dominado por grupos de pressão que têm interesse na venda de armas, na defesa dos latifundiários, na rejeição, às vezes visceral, aos diferentes, assim como pouco adeptos à causa ambientalista, condicionado, simultaneamente, pelo conservadorismo medieval das forças religiosas.

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