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Ofensiva na Câmara para complicar atendimento a vítima de abuso sexual

PL 5069/13, de autoria de Eduardo Cunha, foi aprovado em comissão e precisa ir a plenário

Marina Rossi
Instalação em Pristina em homenagem a mulheres vítimas de abuso sexual da Guerra do Kosovo.
Instalação em Pristina em homenagem a mulheres vítimas de abuso sexual da Guerra do Kosovo.Embaixada da Noruega

Enquanto parte da sociedade se organiza para trazer à tona a questão do abuso sexual nas redes sociais, o Congresso brasileiro, mais uma vez, anda para trás. A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira um projeto de lei que complica e limita o atendimento às vítimas de violência sexual, sob patrocínio da bancada religiosa que deseja dificultar ainda mais casos em que o aborto é legal no Brasil

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O PL 5069/13, de autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e outros 12 deputados prevê que uma vítima de abuso sexual ou estupro terá que realizar um boletim de ocorrência e fazer um exame de corpo de delito para, só então, ser atendida em uma unidade de saúde. Pesquisas mundiais apontam, porém, que a maioria das mulheres que sofreram abuso não dão queixa na delegacia, por, dentre outras razões, medo do agressor.

O texto também modifica o tipo de atendimento que essa vítima receberá no hospital, vetando, por exemplo, que ela receba orientações sobre aborto legal —no país, somente em casos de estupro, de risco para a mãe ou e para fetos anencéfalos (com má-formação cerebral). "Além disso, ela só poderá receber medicamentos que não forem abortivos", explica a deputada Maria do Rosário (PT-RS), contrária ao projeto. Mas o texto não define o que é abortivo. "Ficará a critério do médico julgar se a pílula do dia seguinte, por exemplo, é abortiva ou não. Se ele achar que é, a mulher não poderá receber".

Para a deputada, o projeto de lei, que ainda deve ser votado pelo plenário, servirá para uma posterior proibição da pílula do dia seguinte, vendida hoje legalmente em qualquer farmácia. "Isso é a antessala da proibição da pílula do dia seguinte para as mulheres."

O texto aprovado na CCJ nesta semana não é o único que conta com o apoio do conservador Cunha. Acossado pelas acusações contundentes de corrupção feitas no âmbito da Lava Jato, o integrante da bancada evangélica tem no lobby religioso um poderoso aliado. O temor é que, sob pressão, Cunha acelere pautas conservadoras como manobra diversionista e como forma de galvanizar o apoio desse grupo parlamentar. Ainda esperam para entrar em votação: o projeto de Lei (PL) 7443/2006, que determina a inclusão do procedimento dentre os crimes considerados hediondos; o PL 1545/2011, que impõe ao médico que praticar o aborto, fora das hipóteses previstas em lei, uma pena de prisão que vai de seis a 20 anos; a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 164/2012, que diz que a inviolabilidade do direito à vida é garantia de todos “desde a concepção”, incluindo, portanto, o feto. Por fim, está o PL 5069/2013, que passa a considerar crime contra a vida o anúncio de substância ou objeto destinado à interrupção da gravidez e a orientação de gestantes para o procedimento, com pena de até dez anos de reclusão.

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