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Cunha manobra, obstrui sessão do Congresso e ameaça reforma de Dilma

Deputado impediu análise de veto mais temido pelo Governo, que sobe salário do Judiciário

Cunha no último dia 23.
Cunha no último dia 23.UESLEI MARCELINO (REUTERS)

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), impediu que o Congresso Nacional analisasse os seis vetos da presidenta Dilma à pauta-bomba – como foram batizados os projetos que aumentam gastos do Governo – por meio de uma manobra regimental da Casa. A análise, que definiria pela manutenção ou derrubada dos vetos, estava agendada para esta quarta-feira. Deputados e senadores deveriam participar dessa sessão. Mas Cunha obstruiu a votação ocupando o plenário da Câmara ao convocar seguidas sessões extraordinárias. Desta maneira, não haveria um local para realizar as sessões conjuntas dos representantes das duas Casas.

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Segundo parlamentares, esta foi a primeira vez nos últimos 20 anos que um presidente da Câmara tomou essa atitude. Cunha afirmou que a obstrução não era uma decisão sua, mas dos líderes partidários da Câmara, que queriam votar os projetos de lei que estavam na fila, para só depois analisarem os vetos. Um dos mais importantes é o veto ao reajuste salarial de até 78% para servidores do Judiciário. Se derrubado, aumenta ainda mais as dificuldades do Governo de cumprir com o ajuste fiscal das suas contas, necessário para retomar as rédeas da economia.

A investida de Cunha jogou uma nova casca de banana para a presidenta, e ainda colocou em risco o anúncio da reforma ministerial do Governo, que cortará 10 ministérios e deve garantir mais espaço ao PMDB na divisão de poder. O desenho final seria anunciado nesta quinta-feira (dia 1). Só dependia  da análise dos vetos presidenciais para que ela pudesse aferir a lealdade de sua bancada de apoio e destinar os cargos de ministros para os partidos mais fiéis.

Na última semana, Rousseff distribuiu cinco cargos ao PMDB para garantir a manutenção de 26 dos 32 vetos assinados por ela. Nesta semana, prometeu mais dois, mas como Cunha faz um jogo de opositor, não se interessou pela proposta.

O alvo do presidente da Câmara, no entanto, não era só a presidenta. Ao impedir a realização da sessão, Cunha confrontou o presidente do Senado e do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL),  alvo da Lava Jato como ele. O senador decidiu não botar em votação nesta semana, no Senado, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que previa legalizar as doações privadas, tema de interesse de Cunha. Calheiros também não atendeu ao pedido de Cunha de colocar na pauta do Congresso o veto de Rousseff ao projeto de minirreforma eleitoral.

A pressa do deputado tem relação direta com as eleições municipais de 2016, porque qualquer alteração nas regras eleitorais deve ocorrer até um ano antes do pleito, ou seja, até a próxima sexta-feira (2 de outubro). Desta maneira, no entendimento de alguns congressistas, apenas pessoas físicas poderiam doar no ano que vem, e as empresas estariam impedidas, conforme uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Não há acordo. Não há como vincular a realização de uma sessão do Congresso à apreciação de um veto que até ontem não tinha sido posto. Vamos convocar a próxima sessão para priorizar o todo e não a parte, não o capricho. Não realizamos [a votação], porque a Câmara convocou sessões seguidas para o mesmo horário. Isso é inédito, mas aconteceu”, afirmou um irritado Renan Calheiros após uma reunião de duas horas com lideranças do Senado.

As reclamações vieram de todos os lados. “Cansado de chantagear a Dilma, o PMDB decidiu chantagear o próprio PMDB. Por isso, não votamos questões importantes para o país”, criticou o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ). Na mesma linha, seguiu o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP): “É a sexta vez que o Senado cede as chantagens do senhor Eduardo Cunha. Se isso continuar, corre-se o risco do refém se apaixonar pelo sequestrador”.

Acuado pela operação Lava Jato, onde é acusado de receber propinas, Cunha costuma se usar do regimento da Casa para manobrar conforme seu interesse sempre que é contrariado. Isso ocorreu, por exemplo, durante a votação da reforma política, quando em uma primeira votação as doações empresariais para campanhas eleitorais foram vetadas, e na votação da redução da maioridade penal, quando inverteu a pauta de votações da Câmara. Questionado se estava fazendo birra, ao obstruir a votação dos vetos, Cunha negou. “São pessoas bastante experientes e têm Casas que tem comportamentos diversos. Aqui ninguém está birrando, fazendo birra com nada” afirmou.

Uma nova sessão conjunta do Congresso foi marcada para o próximo dia 6 de outubro. Antes disso, senadores e deputados devem se reunir com ministros do STF para solicitar que sejam esclarecidas as regras sobre doações eleitorais no ano que vem. A ideia é que a Corte faça um período de transição antes de impedir completamente as contribuições de pessoas jurídicas.

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