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Bancada da bala propõe liberar porte de armas nas ruas de todo o país

Relatório torna a concessão do porte mais simples do que tirar carteira de motorista

Gil Alessi
O deputado Laudivio apresenta seu relatório.
O deputado Laudivio apresenta seu relatório.L. Bernardo Junior (Ag. Câmara)

A bancada da bala da Câmara está um passo mais perto de conseguir liberar o porte de armas para a população brasileira. Na quinta-feira o deputado Laudivio Carvalho (PMDB-MG), relator da comissão especial da Câmara que analisa um projeto de lei que acaba com o Estatuto do Desarmamento - que de acordo com estudos salvou mais de 160.000 vidas - apresentou seu parecer. Na prática, caso o documento do parlamentar seja aprovado, as pessoas poderão andar armadas pelas ruas, dentro de seus carros, em bares, restaurantes, escolas e supermercados. E o processo para conseguir os documentos que autorizam o porte será mais simples do que para tirar carteira de motorista.

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O texto elaborado prevê que qualquer pessoa possa solicitar o porte de armas de fogo permitidas, desde que atenda a algumas condições. É preciso ter mais de 21 anos, não ter nenhuma condenação por crime doloso, ser aprovado em um exame psicotécnico e fazer um curso com carga horária de 10 horas para se familiarizar com o manejo da arma. Para efeito de comparação, a obtenção da carteira nacional de habilitação depende da realização de um curso teórico com carga horária de 45 horas/aula, e mais 25 horas de aulas práticas. Segundo o texto, o porte de arma em locais públicos só será proibido onde "houver aglomeração de pessoas em virtude de eventos tais como espetáculos artísticos, comícios e reuniões em logradouros públicos, estádios desportivos e clubes".

Desde que o Estatuto do Desarmamento foi sancionado, o porte de armas é proibido para civis, e apenas categorias profissionais que trabalham com segurança pública ou defesa nacional (polícias, forças armadas e guardas) têm autorização para andarem armadas nas ruas. Atualmente, a posse de armas em residências é permitida apenas em situações excepcionais, ponto que o novo texto da comissão também altera, retirando entraves para a compra e manutenção dos artefatos de fogo - basta atender aos requisitos necessários para o porte, citados acima. Se aprovado o texto do relator, cada pessoa poderá ter até seis armas em casa.

Além de facilitar o porte para a população em geral, o texto de Laudivio garante que algumas categorias profissionais, como taxistas e caminhoneiros, poderão ter armas em seus veículos sem precisar solicitar o porte, apenas com os documentos de registro da arma – mais fáceis de se obter. O porte funcional, concedido a algumas categorias profissionais, também foi ampliado. Guardas de trânsito – os amarelinhos -, deputados, senadores, vereadores, oficiais de Justiça, fiscais do Ibama e fiscais do trabalho terão autorização para andar com arma à vista em qualquer local.

Bruno Langeani, coordenador do Instituto Sou da Paz, afirma que “o projeto vende a ilusão da legítima defesa”, mas que em uma sociedade que já é violenta, “as pessoas ao invés de sair no tapa, sairão no tiro”. Segundo ele, o texto de Laudivio é “um passo atrás, é voltar para o cada um por si, é desistir das instituições e apostar em soluções que não funcionam”. Ele traça um cenário sombrio caso o relatório seja aprovado. “A perspectiva, com base nas pesquisas, é de que aumente o número de homicídios e de latrocínios”, diz, citando estudos que apontam que em apenas 18% dos casos onde a pessoa armada reage a assaltos existe sucesso na reação. “É uma falsa esperança de que as pessoas vão colocar em pratica a auto defesa”, afirma.

“Relatório é um passo atrás, é voltar para o cada um por si, é desistir das instituições e apostar em soluções que não funcionam”

O texto de Laudivio deve ser votado na comissão especial na semana que vem, e depois segue para o plenário. A expectativa de grupos que atuam com controle de armas é de que o relatório do deputado seja aprovado sem dificuldades na comissão, integrada por vários parlamentares que receberam doações de companhias do setor de armas e membros da bancada da bala. O presidente da comissão, Marcos Montes (PSD-MG), que teve campanhas eleitorais financiadas por empresas de armamentos, declarou em junho que “95% dos integrantes da comissão querem reestudar a lei, compartilho a opinião de que é preciso adequá-la”.

No plenário da Câmara o relatório deve encontrar uma oposição mais ferrenha. Deputados contrários às alterações no Estatuto já se mobilizaram e criaram a Frente Parlamentar pelo Controle de Armas, pela Vida e Paz. Cerca de 230 parlamentares assinaram o documento, de um total de 513 deputados. Resta saber se a bancada da bala conseguirá arregimentar um número maior de deputados como foi feito na votação que reduziu a maioridade penal para crimes hediondos.

A reportagem tentou sem sucesso entrar em contato com o deputado Laudivio desde quinta-feira.

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