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Juncker: “Falta Europa nesta União, e falta união nesta Europa”

Presidente da Comissão Europeia pede que a UE não diferencie os refugiados por religião

Foto: reuters_live | Vídeo: el país vídeo

A Europa, em sua melhor versão, é uma ideia. O presidente da Comissão Europeia, o social-cristão luxemburguês Jean-Claude Juncker, acaba de resumi-la numa só frase em meio ao seu discurso sobre o Estado da União, na sede do Parlamento Europeu, em Estrasburgo: “Aproxima-se o inverno. Queremos que os quase 500.000 refugiados que entraram pela Grécia, Hungria e Itália durmam em estações, em caminhões?”. Bruxelas insiste aos Estados membros para que acolham 120.000 refugiados além dos 40.000 propostos em maio, conforme antecipou o EL PAÍS no último dia 3. Juncker exigiu aos países que não discriminem os asilados por sua religião. “Estabelecemos distinções entre judeus e muçulmanos? Este continente já cometeu este erro antes”, advertiu o presidente da Comissão Europeia.

Frente às queixas despertadas pelas quotas propostas em maio para países como a Espanha e o bloco do Leste Europeu, que conseguiram reduzir significativamente esses números, Juncker pede que “desta vez não haja desculpas nem discursos grandiloquentes, que ninguém se esconda atrás das palavras”. À Espanha, que na época não aceitou 4.000 refugiados e deixou essa cifra em 1.300, caberão agora quase 15.000 solicitantes de asilo. Alemanha, França e Espanha acolherão 60% dos 120.000 adicionais, segundo documentos que este jornal revelou no domingo passado.

“Falta Europa nesta União, e falta união nesta Europa”, queixou-se Juncker em discurso marcado pela crise dos refugiados, deixando em segundo plano a crise na zona do euro. O chefe do Poder Executivo da UE apresentou nesta quarta-feira um pacote que inclui um mecanismo permanente de realocação de refugiados, para administrar com mais rapidez as situações de crise; uma mudança nas legislações nacionais para permitir aos imigrantes e refugiados que trabalhem desde o primeiro dia no país; fronteiras mais seguras, com um reforço da Frontex (sistema de proteção de fronteiras); e um pacote de imigração legal, no começo de 2016, junto com “uma ofensiva diplomática para a Líbia e a Síria”.

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Juncker apelou à história: “Centenas de milhares de pessoas procedentes da antiga Iugoslávia tiveram os mesmos problemas no final do século XX. Tchecos e eslovacos fugiram de Praga depois da primavera de 1968. Os republicanos espanhóis nos anos trinta. O horror dos nazistas. Esquecemos? Esquecemos tudo isso?”.

A atenção aos refugiados é hoje prioritária para o projeto comunitário. Desde o começo do ano, quase meio milhão de pessoas chegou à UE, principalmente fugindo da guerra na Síria, das tensões no Iraque e da feroz ditadura na Eritreia. São cifras modestas em comparação aos 60 milhões de refugiados que a Segunda Guerra Mundial deixou na Europa, salientou Juncker. E, enquanto esses refugiados que hoje batem às portas do bloco comunitário mal representam 0,11% da população da UE, no Líbano os sírios já compõem 25% da população.

Além de oferecer dados que justificam o envolvimento europeu, Juncker quis apelar à consciência dos dirigentes políticos para chamá-los à ação. “Enquanto continuar havendo crise na Síria isto não vai acabar. Se fosse você com seu filho nos braços e visse como o mundo se afunda ao seu redor, não haveria muro que você não saltaria nem mar que não atravessaria para fugir da barbárie do Estado Islâmico”, disse ele aos eurodeputados. Tanto esta como outras referências à obrigação moral de ajudar provocaram numerosos aplausos no plenário.

Nesse contexto, Juncker anunciou medidas concretas para aliviar a crise dos refugiados. Além da quota total de 160.000 para distribuir entre os Estados membros –uma decisão que, espera Juncker, os ministros de Interior da UE devem tomar já na próxima segunda-feira–, o presidente da Comissão anunciou um mecanismo permanente de realocação. Assim, quando houver uma crise deste tipo, a partilha dos refugiados entre os países seria automática. “Nosso esforço foi insuficiente. Hungria, Itália e Grécia não podem ficar sozinhos para lutar com este enorme desafio”, argumentou.

Para facilitar a integração dos solicitantes de asilo, Juncker propôs alterações nas regras para permitir que “essas pessoas possam trabalhar desde o seu primeiro dia, enquanto são analisadas as solicitações de asilo”. Desde o final do ano passado, os países são obrigados a oferecer um emprego após três meses de estadia no país de acolhida, mas há dificuldades no cumprimento da regra.

Além dessas medidas, o Executivo comunitário oferece elaborar uma lista de países seguros –integrada por todos os países candidatos à adesão à UE, considerados isentos de conflitos, o que justifica uma rápida repatriação de seus cidadãos que solicitarem asilo. Essa regra liberaria mais recursos para resolver as solicitações dos cidadãos que mais necessitam de ajuda atualmente: sírios, iraquianos e eritreus, principalmente.

A proposta mais ousada consistiu em defender, crise de refugiados à parte, um marco que estimule a imigração legal para a UE. “As migrações devem ser legalizadas. Vamos precisar delas no futuro. Apresentaremos um pacote de imigração legal no começo do ano que vem”, antecipou.

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