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ESPECIAL | 1965
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

‘Mr. Tambourine Man’: a revolução luminosa

A banda de Califórnia uniu com esplendor o folk e o rock em 1965

Fernando Navarro
The Byrds na Trafalgar Square, em Londres, em 1965.
The Byrds na Trafalgar Square, em Londres, em 1965.Victor Blackman (Getty Images)

Tudo acontecia muito rápido naquela época, especialmente em 1965, que concentrou um cosmos artístico mágico, mas os The Byrds foram responsáveis por uma revolução: a do folk rock, um gênero que acabou abrindo uma esplendorosa estrada musical até os dias atuais. Pode-se dizer até que, da ensolarada Califórnia, naquele ano eles já teriam deixado uma marca, embora mentes criativas torrenciais como as de Bob Dylan, dos Beatles ou dos Rolling Stones desfrutassem de independência.

Em janeiro de 1965, essa banda —formada sob a onda que a Invasão Britânica deixou nos Estados Unidos com sua legião de grupos— entrou nos estúdios da Columbia, a gravadora de Dylan. Nas primeiras sessões, ouviram uma demo de Mr. Tambourine Man, cujo autor, o próprio Dylan, havia gravado para Bringing It All Back Home, o álbum que seria lançado em março daquele ano. E tudo mudou. Aqueles rapazes com alma folk, mas que olhavam para o Reino Unido inclusive para escolher nomes semelhantes aos dos Beatles, Animals, Kinks, Zombies ou Rolling Stones, tiveram a coragem de ser eles mesmos, mesmo com uma canção do mesmíssimo autor de Blowin’ in The Wind. O experimento só fez sucesso porque a espinha dorsal do The Byrds era composta por Jim McGuinn —que ficou conhecido depois como Roger McGuinn—, Gene Clark, David Crosby e Chris Hillman. Uma reunião de talentos que não deixava nada a desejar aos Beatles ou aos Stones, embora Clark e Crosby não tenham participado da gravação original da canção, e McGuinn contasse com músicos da sessão de Los Angeles, notáveis de qualquer forma porque deram origem ao The Wrecking Crew.

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Com essa ressonância marcante da Rickenbancker de 12 cordas de McGuinn, o vocalista, e essa complexa harmonia instrumental e vocal apoiada por Clark e Crosby, os The Byrds imprimiriam um novo ritmo com Mr. Tambourine Man, o álbum com o qual se tornaram famosos mundialmente em 1965 e que abria com a canção de mesmo nome. Combinavam as linhas melódicas mais brilhantes dos Beatles com a candura de composições originais de Dylan, de quem também gravaram versões de Chimes of Freedom, All I Really Want to Do e Spanish Harlem Incident.

Conscientemente, uniam o rock e o folk, assim como as margens do Atlântico, mas a maior virtude da banda era outra: faziam com que as canções brilhassem, como se fossem ondas do mar banhadas pelo sol. Essa luz inexplicável, mas surpreendentemente sedutora, flutuava em todo o disco. Era apreciada igualmente em canções mais pop como Don't Doubt Yourself, Babe, de Jackie Shannon, ou mais folk como The Bells of Rhymney, de Pete Seeger. As próprias criações do grupo —que tinha um grande compositor como Gene Clark, mas que saiu logo depois— mostravam um poderoso beat, típico da British Invasion, com esse ar angelical da marca Byrds. Here Without You, You Won't Have to Cry e, especialmente, a obra-prima I'll Feel a Whole Lot Better confirmavam que a banda tinha uma fabulosa linguagem própria.

Mr. Tambourine Man foi um dos lançamentos mais importantes na história do pop e do rock. Seu impacto foi instantâneo. Quando Dylan ouviu a versão de Mr. Tambourine Man na voz daqueles garotos californianos, exclamou: "Uau, cara, dá até para dançar!". Quando o álbum foi lançado em junho, Dylan gravava Like a Rolling Stone e lapidava Highway 61 Revisited. Meses depois, ainda em 1965, os The Byrds aumentariam seu impacto com a gravação de Turn! Turn! Turn! Os recém-chegados também chamariam a atenção dos Beatles e dos Beach Boys. Tudo acontecia muito rápido naquela época. Chamavam-se The Byrds, haviam começado sua revolução dentro da revolução, se tornariam gigantescos e soavam radiantes.

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