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Milhares de pessoas protestam contra a austeridade em Atenas

Os manifestantes pedem ao Governo que não ceda às exigências de Bruxelas

Cartaz de "Não ao Euro" no protesto de Atenas.Foto: AGENCIA_DESCONOCIDA | Vídeo: Reuters-LIVE! / Getty
María Antonia Sánchez-Vallejo

Cerca de 7.000 pessoas se manifestaram no domingo, dia 21 de junho, em Atenas, contra a austeridade e as exigências dos credores da União Europeia. Não era uma concentração strictu sensu em favor do Governo ou do Syriza, apesar de dois de seus membros mais notórios terem participado, o superministro econômico Panayotis Lafazanis, líder da ala dura do partido —contrário a fazer concessões aos membros da UE—, e a presidenta do Parlamento, Zoi Konstandopoulou.

A manifestação tinha sido convocada pelo poderoso sindicato dos funcionários públicos (Adedy, em sua sigla em grego), agremiações e colegiados profissionais e uma miríade de pequenos grupos da esquerda não parlamentares que deixavam em aparente minoria as bandeiras do Syriza. Os cartazes e as frases ditas em coro por essa maioria eram inequívocos, um clamor unânime pela saída voluntária da Grécia da UE, o que se apelidou de Grexit: “A zona do euro é o problema; a saída, a solução”, “A Grécia não está à venda”, “Nossas almas não pertencem aos emprestadores” e “Não ao euro, revogação do memorando [do resgate] e perdão da dívida”. Ou seja, nada que Tsipras possa colocar amanhã na mesa para os demais países da UE.

Entre os participantes, destacavam-se dois grupos, o dos funcionários e o dos aposentados, que encarnam as mesmas linhas vermelhas teoricamente irrenunciáveis do Governo: as aposentadorias e os direitos trabalhistas. O Governo de Tsipras vem se opondo com ênfase a um corte das aposentadorias e a uma nova reforma do mercado de trabalho, que já se desmantelou por exigências da antiga troika (por exemplo, com a supressão de convenções coletivas, que o Governo Syriza quer restabelecer). Pelos alto-falantes também se relembrava ao Executivo a promessa de aumentar o salário mínimo para 751 euros, uma medida congelada durante esses cinco meses de negociações. No meio da multidão, que incluía alguns sacerdotes da igreja ortodoxa grega, tremulavam bandeiras gregas e até algumas bandeiras arco-íris (a homologação do casamento homossexual é outra promessa eleitoral pendente).

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“Temos confiança neste Governo, com euro ou sem euro”, diz Vangelis Pasjulis —aposentado, com 400 euros a menos em sua aposentadoria desde 2011— e sua esposa, Sofia Manusaridu, autônoma. “Votamos no Syriza, mas não somos membros do partido, apenas cidadãos comprometidos. Vivemos cinco anos de penúria, desde a aprovação do primeiro resgate [2010], por isso dá no mesmo continuar no euro ou voltar ao dracma ou à moeda que seja. Talvez assim o país possa voltar a levantar a cabeça aos poucos... Mas, seja o que for, continuaremos confiando no Syriza, porque é um governo de salvação nacional”. Sua filha, com dois diplomas universitários, está desempregada há três anos.

Mais diplomático, Stathis Grivás, dirigente de nível intermediário do Syriza, mostra-se convencido de que seu Governo e os sócios encontrarão “uma solução que não ultrapasse as linhas vermelhas [imposto sobre o consumo, aposentadoria, mercado de trabalho]. Sou partidário do euro, mas com limitações; se estas não se cumprirem, prefiro a ruptura das negociações. Estou seguro de que Tsipras não vai assinar nada prejudicial à Grécia, eu o conheço e também a outros ministros... Sem uma perspectiva de crescimento e de futuro, meu Governo não vai aceitar [nenhum acordo com os sócios]”. Perguntado quanto à iminência de um congelamento se a fuga de capitais continuar, ou quanto ao cenário do Grexit, Grivás dá de ombros: “Está tudo muito aberto [na negociação], e também há o cenário de eleições ou de um referendo”.

Juntos, mas mantendo a independência, os partidários do Syriza se misturavam com os de outros grupos de esquerda menos contemporizadores, como o Antarsya (0,6% dos votos nas últimas eleições, em janeiro), cujas hostes criticavam durante a negociação com a UE. “Todas as propostas e contrapropostas que o Syriza está fazendo esses meses é mais do mesmo, são só escalas de um novo sofrimento para o povo grego. O que queremos é uma solução que beneficie a sociedade, para que ela não volte a sangrar”, explica Arjondula Tsinorá, farmacêutica e mãe de dois universitários formados que imigraram por falta de expectativas. “Em minha farmácia, só cobro dos aposentados na primeira semana. Com pensões de 400 e 500 euros, eles não conseguem se medicar e comer ao mesmo tempo, e o dinheiro só dá para uma semana ou 10 dias. Então todas essas negociações entre a troika e o Governo me parecem mais do mesmo, mais sofrimento”.

E que alternativas o Antarsya oferece para superar esse impasse? “É muito claro”, diz Tsironá, “sair do euro e da UE, nacionalizar os bancos e parar todas as privatizações. Se for preciso voltar ao dracma, que seja, vamos passar mal um tempo, mas pior seria com novas medidas de austeridade.”

Ainda que as pesquisas ainda não reflitam isso, o desencanto com o euro é um sentimento prevalente em grande parte da população grega, como ficou demonstrado na concentração de domingo à tarde. Contra essa frente do não (não a concessões, não ao euro, e até não à Europa), na segunda-feira foi convocada para a mesma hora e para o mesmo lugar uma nova manifestação da frente europeia, estimulada por vários partidos de oposição ao Syriza: conservadores, socialistas e o liberal To Potami. A fenda entre partidários de uma e outra Grécia está aberta.

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