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Britânicos vão às urnas eleger novo Parlamento em disputa acirrada

Última pesquisa coloca os trabalhistas um ponto à frente dos 'tories' Segundo o 'The Guardian', Miliband ganhará as eleições pela vantagem mínima

Miliband com sua esposa, após votar em um centro eleitoral em Sutton.Foto: reuters_live | Vídeo: REUTERS
Pablo Guimón

Os britânicos comparecem às urnas nesta quinta-feira para eleger um Parlamento que, nas próximas semanas, deverá proporcionar um Governo estável à sexta maior economia do mundo. Um trabalho que, se as pesquisas não estiverem erradas e não ocorrerem reviravoltas de última hora, mostra-se complicado. As 7h da manhã (3h da manhã de Brasília) foram abertos sem incidentes cerca de 40.000 colégios eleitorais, que podem receber mais de 40 milhões de eleitores britânicos. O líder do UKIP (siglas em inglês do Partido da Independência do Reino Unido), Nigel Farage, foi o primeiro dos candidatos a depositar seu voto. Pouco depois Ed Miliband, a escocesa Nicola Sturgeon e o conservador David Cameron também o fizeram.

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Tanto Miliband como Cameron aproveitaram suas contas no Twitter para mandar uma última mensagem aos seus eleitores. “Chegou o dia de votar nas eleições mais importantes de uma geração. Como você irá fazê-lo afetará não só seu futuro, mas o de sua família e de nosso país”, disse o primeiro-ministro britânico. Pouco antes, Miliband escreveu no Twitter: “Hoje é o dia em que vocês podem votar por um Governo trabalhista que lutará e defenderá os trabalhadores, podem votar para priorizar o sistema de saúde (NHS) e sua família”.

Sete semanas de intensa campanha não serviram para acabar com o empate técnico no qual encontram-se os dois partidos que há quase um século fornecem ininterruptamente os primeiros-ministros ao país. Conservadores e trabalhistas chegam ao dia da verdade com uma estimativa de votos em torno de 34% para cada um. A tradução em cadeiras no Parlamento, em um sistema eleitoral no qual somente um deputado vence por cada região eleitoral, daria uma ligeira vantagem ao Partido Conservador do primeiro-ministro David Cameron. Mas os dois ficariam longe das 326 cadeiras – 323, levando em consideração que o Sinn Fein costuma não tomar posse das suas – necessárias para ter o controle do governo.

O desastre que as pesquisas preveem ao centrista Partido Liberal Democrata, que perderia metade de seu apoio após sua experiência de cinco anos como aliado minoritário no Governo de coalizão, o transformaria em um aliado insuficiente para formar um Governo de maioria. Somente o Partido Nacionalista Escocês (SNP, na sigla em inglês), que entraria em Westminster com mais de meia centena de cadeiras e a possibilidade de expulsar David Cameron de Downing Street, poderia contribuir para um Governo estável com os mesmos trabalhistas que provavelmente apagarão do mapa político ao norte da fronteira. Mas o candidato trabalhista, Ed Miliband, descartou essa opção. “Não existirá um Governo trabalhista se isso significar tratados ou coalizões com o SNP”, repetiu na primeira semana de maio em uma sessão de perguntas aos líderes dos partidos na televisão.

Sete semanas de intensa campanha não serviram para acabar com o empate técnico

Tudo indica que o que sairá das urnas na quinta-feira será o que na tradicional constituinte britânica é conhecido como um hung Parliament, ou Parlamento em desacordo. Os líderes conservador e trabalhista encontravam-se na quarta-feira finalizando a campanha no norte da Inglaterra, mas suas cabeças já estavam nas negociações que serão formalmente abertas na sexta-feira para tentar constituir um Governo estável com um Parlamento fragmentado.

Se os trabalhistas conseguirem um resultado melhor do que as pesquisas preveem e obtiveram mais cadeiras do que os tories (como são chamados os membros do Partido Conservador britânico), o cenário é relativamente fácil. David Cameron pedirá à rainha que converse com Ed Miliband e este anunciará que está disposto a fazer parte do Governo. Faria em minoria, com ou sem ajuda dos liberais-democratas, Governo que iria adiante com o apoio do SNP.

Mas se, tal como as pesquisas indicam, os tories obtiverem mais cadeiras, sem conseguir as necessárias para tomar o controle do governo, o panorama se complica. A legislação constitucional britânica concede ao primeiro-ministro a primeira tentativa de formar o Governo.

David Cameron poderia tentar, declarando-se ganhador das eleições no Reino Unido, anunciando a intenção de formar um gabinete e preparando o discurso da rainha – ou seja, o documento que Elizabeth II deverá ler no trono à Câmara dos Lordes na abertura oficial do Parlamento, em 27 de maio.

O discurso da rainha esboça as prioridades legislativas do Governo e é submetido a debate e votação na Câmara dos Comuns. No começo de junho, os deputados deverão se pronunciar sobre o documento, que é um projeto de Governo. Se Cameron não obtiver o apoio da mais de metade dos deputados, sofreria uma moção de censura que forçaria sua demissão.

Se os trabalhistas conseguirem mais cadeiras do que os tories, Cameron pedirá à rainha que converse com Ed Miliband e este anunciará que está disposto fazer parte do Governo

Os trabalhistas e os nacionalistas escoceses anunciaram que votarão contra o discurso da rainha dos conservadores. O mesmo fariam os Verdes e os galeses do Plaid Cymru. Se ao todo conseguirem 323 votos, seria o final de Cameron. Estaria aberto então um prazo de 14 dias para que um novo Governo tente obter a confiança da Câmara.

Como se encarregaram de recordar vários constitucionalistas na quarta-feira, em nenhuma das 107 páginas do Manual do Governo está escrito que o partido com mais assentos parlamentares tem prioridade para formar o Governo. Ela caberá a “quem for mais capaz de se fazer credor da confiança da Câmara dos Comuns”. Mas, se após o prazo de 14 dias não se consolidar o apoio a um Governo alternativo, novas eleições seriam convocadas.

Cameron tentará a partir da sexta-feira um acordo de coalizão com os liberais-democratas para compor um Governo, se não majoritário, pelo menos um pouco mais sólido. Nick Clegg, líder dos sociais-democratas, já afirmou que conversará inicialmente com o partido que formar a maior bancada, mas ressalvou que não participará de um gabinete que pactue com os nacionalistas escoceses ou com o UKIP. As discussões entre os ainda sócios de Governo se centrarão, muito provavelmente, em um limite definido pelos tories, mas do qual os liberais-democratas não compartilham: a obrigatoriedade de convocar um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.

David Cameron utilizaria sua condição de ainda primeiro-ministro para transmitir uma imagem de responsabilidade e continuidade em paralelo às negociações. Enquanto isso, se as urnas lhe confiarem a possibilidade de formar um Governo alternativo, Ed Miliband permaneceria à espera. Buscará assegurar que seus deputados e os seus potenciais aliados derrubarão o discurso da rainha preparado por seu adversário, abrindo assim caminho para entrar no número 10 da Downing Street.

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