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Os 100 primeiros dias de Dilma, em que aconteceu quase de tudo no Brasil

Completam-se três meses conturbados do segundo mandato da presidenta Queda de popularidade, economia rumo à UTI, desafios no Congresso e oposição nas ruas

Antonio Jiménez Barca
Dilma em inauguração de moradias no Rio.
Dilma em inauguração de moradias no Rio.VANDERLEI ALMEIDA (AFP)

Não há dia sem sobressalto no segundo mandato de Dilma Rousseff, que nesta sexta-feira completa 100 dias. Últimos exemplos: no dia 98, o recentemente destituído ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas, do Partido dos Trabalhadores (PT), anunciava satisfeito para a imprensa – com as câmeras de televisão presentes – que tinha sido nomeado, em troca, responsável pela Secretaria de Direitos Humanos. Então, recebeu uma chamada urgente no celular. Interrompeu a coletiva de imprensa para atender ao telefone (“Era um telefonema que eu tinha que atender"). Ao voltar a falar com os jornalistas, com o rosto muito mais sério que antes, já não tinha tão claro que iria ser ministro. A chamada – procedente do entorno de Dilma, talvez da própria Dilma – o fez recuar: “A única coisa de que tenho garantia é o meu mandato de deputado”, disse, apressadamente. E no dia 99, quando o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, imputado no caso da Petrobras, ia depor na comissão parlamentar que analisa esse assunto, um funcionário do Congresso que se encontrava na sala, sem que ainda se saiba o motivo ou a intenção, soltou cinco ratos (na realidade, hamsters e camundongos) que correram entre as mesas dos deputados e os sapatos dos jornalistas até que fossem presos e colocados de volta na caixa. O servidor foi demitido, um deputado foi acusado de haver urdido a manobra e os ratos, adotados por dois congressistas defensores dos animais. Outro parlamentar disse, quando tudo havia terminado: “Isso mostra nosso nível”.

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Ninguém sabe o que vai acontecer a partir de agora, mas os 100 primeiros dias do segundo mandato de Dilma, que tomou posse do cargo como presidente da República do Brasil em 1º de janeiro, estão sendo particularmente conturbados e particularmente nefastos para ela e seu capital político. Nessas 14 semanas aconteceu de tudo, e tudo ruim: sucederam-se os números econômicos ruins (inflação subindo até 7,7%, crescimento de 0,01% do PIB), as ameaças das agências de classificação de risco de rebaixar a nota do país, as derrotas (quando não, humilhações políticas) de Dilma no Congresso, os protestos de centenas de milhares de pessoas nas ruas, os panelaços multitudinários quando a presidenta falava na televisão, entre outras coisas.

Tudo isso repercutiu em sua popularidade, que se precipita para o abismo. A última pesquisa Datafolha mostra que só 13% dos entrevistados considera boa a gestão de Dilma. É o índice mais baixo já registrado pela atual presidenta e o segundo mais baixo da história democrática do Brasil, só superado, em setembro de 1992, pelo presidente Fernando Collor de Mello, que renunciou pouco depois. Não há nada que indique que Dilma vá renunciar. Mas há dois grandes problemas que a deixam de mãos atadas e que se enredam e se retroalimentam. O primeiro é a crise econômica que atravessa um país que por vários anos se acostumou a navegar a favor da corrente. O segundo é a fraqueza política de Dilma frente a um Congresso forte e hostil.

A presidenta brasileira vem buscando soluções para esses dois problemas desde que começou o segundo mandato. Para os dois, a partir desta semana, conta com dois pesos pesados de seu Governo que atuam, de fato, como primeiros-ministros: Joaquim Levy, o ministro da Fazenda, e Michel Temer, vice-presidente. Nenhum deles pertence ao partido de Dilma. Nenhum dos dois é inteiramente confiável aos olhos da presidenta, segundo muitos analistas. Entretanto, qualquer passo em falso de qualquer deles repercutirá no já delicado rumo da legislatura. Ainda existe sintonia entre Dilma, que no mandato anterior praticou uma política econômica mais expansiva e intervencionista e Levy, partidário, pelo contrário, de uma política mais liberal, disposto a realizar neste ano uma economia de 100 bilhões de reais nas contas do Estado por meio, principalmente, de cortes de gastos e aumentos de impostos. Quem segura as rédeas é Levy, abençoado pelos mercados e pelas agências de classificação de risco, continua sendo o ministro da Economia.

Temer, do PMDB, um especialista em manobras de bastidores, a partir desta semana é o encarregado da mediação entre o Executivo e seus aliados no Congresso, onde o PT está em clara minoria. Isso é vital, já que as medidas de ajuste passam por aqui e precisam ser aprovadas. Dilma, em princípio, tentou passar essa tarefa para o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Eliseu Padilha, do PMDB, mas a reticência dos parlamentares, encarnada sobretudo no presidente da Câmara, Eduardo Cunha, também do PMDB, fizeram-na voltar atrás. Uma prova do poder desse partido aliado sem ideologia clara.

Temer conseguiu arrancar nesta semana dos parlamentares aliados uma promessa por escrito: comprometem-se a não impulsionar (nem aprovar) medidas que acarretem mais gastos, mas o acordo não vai além disso.

De modo que este sábado, o 101º dia, será igualmente difícil e tempestuoso para Dilma, que além da crise econômica e política enfrenta dois fatores imprevisíveis: o protesto nas ruas de uma classe média oposta a sua gestão que no domingo voltará às avenidas de São Paulo e as revelações de corrupção que de quando em quando sacodem a Petrobras, a empresa pública mais poderosa (e cada vez mais desvalorizada, apesar das oscilações na Bolsa de Valores) do país.

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