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“Protestar é um direito básico”

ONGs denunciam à CIDH a criminalização do protesto social nas Américas

Silvia Ayuso
O secretário executivo da CIDH, Emilio Álvarez Icaza.
O secretário executivo da CIDH, Emilio Álvarez Icaza.EFE

“O protesto é um direito básico e o que se espera é que, em um ambiente democrático, a preocupação da polícia seja como garanti-lo, não como contê-lo ou reprimi-lo” diz o secretário-executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Emilio Álvarez Icaza.

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Mas as imagens de repressão de manifestações repetidas nas ruas de Caracas, São Paulo ou Ferguson não refletem esse princípio. Como também não o fazem as numerosas iniciativas no âmbito das leis que multiplicaram-se nos últimos anos em países como o Equador, México, Brasil, Chile ou Colômbia para regulamentar, reprimir pela força os protestos públicos ou criminalizar as pessoas que saem às ruas para cobrar seus governos. Mais de vinte organizações civis de todo o continente fizeram essa denúncia na segunda-feira durante uma audiência da CIDH focada em analisar o “protesto social e direitos humanos na América”.

“Existe a tendência ao aumento do poder punitivo do Estado em matéria de segurança e ordem pública mediante a utilização de normas que vão no sentido de proibir ou aumentar as sanções contra condutas relacionadas ao exercício do direito à manifestação”, denunciou Rafael Uzcategui, do Programa Venezuelano de Educação-Ação em Direitos Humanos (PROVEA). Ele lembrou que chegou-se ao extremo de colocar como delitos “ações que fazem parte da cultura histórica do movimento popular de protestos na América Latina, como o bloqueio de vias ou fechamento de ruas”.

Uzcategui lembrou na CIDH o recente suicido do preso político venezuelano Rodolfo González, que se matou na cela em que há mais de um ano estava preso acusado de coordenar a logística dos protestos iniciados em fevereiro de 2014. Um caso, diz, que é um exemplo do “uso irregular da justiça para inibir os protestos”.

É um fenômeno que se estende, frisaram os ativistas. O presidente Juan Manuel Santos ordenou a militarização de Bogotá em agosto de 2014, após protestos em apoio a uma greve camponesa que deixaram dois mortos e mais de uma centena de feridos. Um ano depois dos protestos venezuelanos que deixaram 43 mortos, o adolescente Kluiver Roa morreu baleado em outra manifestação no Estado de Táchira. O presidente norte-americano, Barack Obama, foi obrigado a ordenar uma reforma das práticas policiais após as denúncias de discriminação racial e militarização excessiva dos agentes da lei revelados pelos protestos de Ferguson, Missouri.

“Existe uma prática estendida por todo o continente do uso desproporcional da força no protesto social”, resumiu Gastón Chillier, do Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS) da Argentina. Sua organização também assina a petição feita na segunda-feira para que a CIDH elabore “padrões” sobre a participação da força pública nos protestos sociais e acompanhe para ver se estão sendo cumpridos.

Álvarez Icaza reconheceu em declarações ao EL PAÍS que esse tema é de “enorme preocupação” no órgão que dirige. A audiência temática realizada sobre esse assunto constitui, diz, uma “acusação de recebimento” dessa preocupação “não somente do ponto de vista do uso da força, mas como uma parte das garantias democráticas em matéria de liberdade de expressão e direito de associação”.

“Estão sendo detectados padrões de abusos da força, de abuso de armas letais e não letais, de agressões”, lamentou. E no âmago desse assunto existe, advertiu, uma discussão sobre a maneira de “entender as instituições de segurança como parte das instituições da democracia”. É aí, acrescentou, onde são detectadas hoje em dia “heranças e ações de regimes autoritários”. O “desafio” da resposta do Estado aos protestos sociais não é, entretanto, exclusivo da América. Também ocorreu na Europa – como a “lei da mordaça” do Governo espanhol – ou durante a Primavera Árabe, lembrou.

“As democracias precisam dialogar melhor com a forma com a qual as pessoas expressam seu mal-estar”, frisou o chefe da CIDH. Os protestos sociais “não podem ser entendidos como uma ameaça aos governos ou a governabilidade, devem ser entendidos como uma condição sine qua non de um regime democrático”.

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