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Com vitória na Câmara, PMDB turbina poder para acossar Dilma

Após erro da estratégia para derrotar Eduardo Cunha, Planalto se move para se reaproximar Novo presidente da Casa cita projeto que pode aumentar gasto público em meio a ajustes

Cunha, ao centro, no abertura do ano no Judiciário.
Cunha, ao centro, no abertura do ano no Judiciário. Antonio Cruz (Agência Brasil )

A eleição do deputado Eduardo Cunha (PMDB) para a presidência da Câmara neste domingo, após vitória em primeiro turno, turbina o poder de barganha do grupo do deputado evangélico com o Planalto. A mensagem de independência do peemedebista, integrante da maior sigla aliada do PT,  impõe um enorme desafio à articulação política do Governo Dilma Rousseff (PT), que terá que se mostrar mais hábil do que foi até agora.

Nesta segunda, o Governo federal começou a se mover para tentar costurar uma reaproximação com Cunha. O ministro da Justiça, o petista Eduardo Cardozo, minimizou a derrota do Planalto e previu uma relação “excelente e harmoniosa” do novo presidente com o governo.

À frente da Câmara, Eduardo Cunha, de 56 anos, terá o poder não apenas de acelerar a abertura de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) e de pedidos de impeachment contra a presidenta, como também poderá colocar em votação temas que não interessam em nada ao Governo, ao mesmo tempo em que barra ou dificulta a apreciação de questões importantes para Rousseff.

No discurso de posse, o peemedebista já afirmou que sua prioridade será concluir a votação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 358/13) que obriga o Governo federal a colocar no Orçamento da União o pagamento das emendas individuais propostas por deputados e senadores, o que trará um custo alto num momento em que Rousseff tem procurado diminuir os gastos para reequilibrar a economia.

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Cunha também já se colocou contrário à aprovação da reforma política, um dos projetos defendidos por Rousseff, nos moldes preferidos pelo PT (por meio de um plebiscito popular). “No máximo, a gente pode submetê-la a referendo (...) A Casa não quer transferir o seu poder de legislar dado pela população para um mecanismo de consulta popular prévia”, afirmou ele em entrevista ao EL PAÍS em novembro. A medida dificultaria, por exemplo, aprovação do fim do financiamento privado de campanhas políticas, algo polêmico defendido pelo Governo federal.

A vitória de Cunha também pode trazer para o Governo derrotas em áreas sociais delicadas, que estavam sendo mantidas em banho-maria pelo ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB). Entre elas, a PEC 215, que traz mudanças significativas na demarcação de terras indígenas e é rejeitada pelo Governo federal. A medida é uma das prioridades da bancada ruralista, que se reuniu com Cunha quando ele ainda fazia campanha no final do ano passado e o informou disso. O evangélico também defende uma legislação mais rígida para o aborto, como um projeto de sua autoria que pune mais os médicos.

Poder de barganha

Apesar de ter declarado que sua prioridade será a independência diante do Governo federal, Cunha não terá interesse em comprar grandes brigas e passar para a oposição, avalia o professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV, Carlos Pereira. O PMDB, que compõe a base aliada do Governo, vai aproveitar o poder de barganha dado pela vitória para aumentar suas exigências.

“O PMDB não tem um candidato crível à Presidência da República, então não tem interesse em ser oposição. O partido sabe que o jogo parlamentar traz benefícios e o preço do apoio vai aumentar”, explica. “Se antes o Governo ofertou 40 cargos, por exemplo, agora eles vão querer 80. E, neste momento, é melhor que Dilma aceite o preço porque, se não aceitar, ele vai aumentar mais”, avalia o professor.

A consultoria de risco político Eurasia Group tem avaliação semelhante. "No curto prazo, Rousseff vai provavelmente mitigar a derrota política oferecendo mais cargos para aliados na administração", diz o relatório enviado a clientes nesta segunda.

“O resultado da votação demonstra o descontentamento da base aliada em relação ao trato com o Parlamento”, afirma Antônio Augusto Queiroz, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). O candidato petista à presidência da Câmara, Arlindo Chinaglia, acabou tendo 44 votos a menos do que o esperado (foram 180, no total) na votação, que é secreta. As traições de última hora vieram de ao menos três partidos, mas o PRB, do ministro do Esporte George Hilton, também já havia declarado apoio a Cunha.

“O Governo puxou a corda demais, privilegiou demais o PT nos últimos anos e desprezou os outros parceiros”, explica Pereira. A situação, no entanto, parecia ter melhorado. Os ministérios neste ano foram montados privilegiando os aliados, já de olho na presidência da Câmara, numa estratégia de tudo ou nada.

Ganhou o nada. O PT acabou não apenas perdendo o comando da Casa, como também seu lugar na mesa diretora, negociado em troca de apoio. A deficiência em formar o bloco necessário também custou a presidência das duas principais comissões da Câmara: a de Constituição e Justiça e a de Finanças e Tributação –as únicas que têm o poder de arquivar diretamente projetos. E, além disso, irritou Cunha, que se viu tratado como “inimigo” pelos petistas. Agora, o desafio de Rousseff será transformá-lo, novamente, em amigo.

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