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O enorme custo da obesidade

Problema de sobrepeso afeta 2,1 bilhões de pessoas

Fernando Gualdoni
Duas pessoas obesas em rua da Cidade de México.
Duas pessoas obesas em rua da Cidade de México.JUSTIN WILSON (EFE)

A recente decisão do Tribunal Europeu de Justiça que reconhece que a obesidade “pode representar uma deficiência” no trabalho voltou a colocar em primeiro plano um dos maiores problemas de saúde dos países desenvolvidos e emergentes, com graves implicações sobre o futuro da atividade econômica. O reconhecimento do excesso de peso como “deficiência” obrigaria as empresas, por exemplo, a fornecer espaços de trabalho maiores para estes empregados, designar-lhes tarefas mais leves, ou habilitar zonas de estacionamento apropriadas. E, levando-se em conta que cerca de 20% dos homens e 23% das mulheres da Europa são obesos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a questão do sobrepeso representa um fator de tensão nas relações trabalhistas a médio prazo.

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Pela primeira vez na história da humanidade há mais pessoas com excesso de peso do que desnutridas. Cerca de 2,1 bilhões de pessoas no mundo sofrem de sobrepeso, das quais 670 milhões padecem de obesidade. O número total já representa em torno de 30% da população mundial, e um estudo da consultoria McKinsey estima que o percentual subirá para a metade dos habitantes do planeta em 2030. “A obesidade está em crescimento nos países desenvolvidos e, agora, também está presente nas economias emergentes”, afirmam os especialistas da consultoria, que apontam que o problema não só se agrava rapidamente, como também será cada vez mais difícil de ser revertido. “Só um plano que ataque em várias frentes, desde o tamanho das porções dos alimentos, passando pelo controle sobre o fast-food até o estímulo ao exercício físico e à educação alimentar, entre outras questões, poderá começar a frear a crise”, dizem na McKinsey.

Pela primeira vez há mais obesos do que pessoas desnutridas

O impacto da obesidade na economia mundial é calculado em cerca de 2 trilhões de dólares (5,3 bilhões de reais), o equivalente a 2,8% do produto interno bruto (PIB) global, segundo a McKinsey. A gravidade do problema está à altura do tabagismo, da violência armada e do terrorismo, e suas consequências se expandem para muitas áreas da economia, desde os custos de saúde –públicos e particulares— passando pela queda da produtividade e o aumento do absentismo trabalhista, até um maior consumo de alimentos e de energia.

Nos Estados Unidos, por exemplo, o custo anual da obesidade em função da produtividade para as empresas chega a 153 milhões de dólares, segundo a consultoria Gallup. Na Europa, o valor ronda os 160 bilhões, segundo estudo do Bank of America-Merrill Lynch. Um levantamento realizado há quatro anos por especialistas da Clínica Mayo, dos EUA, calculou que, enquanto o tabagismo aumenta o custo dos cuidados médicos em 20% a cada ano, a obesidade eleva esse percentual a 50%.

O mesmo centro médico, assim como as universidades norte-americanas de Duke e Cornell, dedicaram recursos para estudar o impacto do excesso de peso das empresas do país. Os diferentes estudos calcularam que as faltas ao trabalho derivadas da obesidade elevam os custos das empresas em 6 bilhões de dólares anuais, enquanto a menor produtividade destes mesmos empregados aumenta essa perda em outros 30 bilhões. O problema não afeta apenas a empresa, mas também o trabalhador, uma vez que as pessoas obesas têm menor probabilidade de serem contratadas e inclusive ganham menos, especialmente no caso das mulheres.

Ainda que em países industrializados, como EUA e Reino Unido, que estão entre os mais afetados pela crise, tenham surgido campanhas governamentais e privadas para estimular hábitos que ajudem a combater o problema, a maioria das empresas ainda não tem consciência da importância de incentivar programas internos para estimular pelo menos o cuidado com a alimentação e o exercício físico. A maioria dos especialistas concorda que as empresas devem subvencionar os programas de emagrecimento, os medicamentos contra a obesidade que os empregados podem necessitar e investir no replanejamento do local de trabalho (sala de exercícios, refeitório, máquinas com produtos saudáveis, entre outros). Planos amplos contra a obesidade teriam um custo de entre 20 e 30 dólares anuais por pessoa em países como Japão, Itália, Canadá ou Reino Unido.

Problema custa 160 bilhões de dólares em produtividade na Europa

A obesidade ainda tem outras implicações. A empresa aérea australiana Qantas calculou que o peso dos passageiros adultos aumentou dois quilos desde 2000, o que representa um custo extra de 1 milhão de dólares por ano em combustível. A Samoa Air, por exemplo, é a primeira a cobrar dos passageiros de acordo com seu peso. A fabricante de aeronaves Airbus já oferece assentos mais largos para seu modelo A320, e várias companhias fabricantes de ônibus e trens estudam fazer o mesmo. No setor de automóveis, calcula-se que os passageiros obesos aumentam o consumo de gasolina em milhões de litros por ano só nos EUA. A Universidade de Buffalo (Nova York) constatou que as pessoas sem excesso de peso são 70% mais propensas a usar o cinto de segurança do que os obesos, o que reduz a gravidade e o custo dos acidentes.

Um estudo recente dos professores Núria Mas (IESE) e Joan Costa (London School of Economics), intitulado Globesity? The Effects of Globalization on Obesity and Caloric Intake, (Globesidade? Os Efeitos da Globalização na Obesidade e Ingestão Calórica) faz a correlação entre a globalização e a obesidade. “A obesidade é um fenômeno complexo que implica tanto aspectos econômicos como sociais”, diz Mas. “Nós observamos que as normas sociais e culturais têm um impacto fundamental sobre a obesidade. Os elementos da globalização social que têm mais efeito sobre a obesidade são os fluxos de informação e os contatos pessoais. Há evidências que indicam que o grupo de pessoas com quem comemos ou com quem nos relacionamos tem um impacto sobre como e quanto ingerimos. De fato, já se fala de um ‘entorno obesogênico’, que propicia a obesidade se forem seguidas suas normais sociais: por exemplo, o tempo que se leva para comer e o tamanho das porções, entre outros”, acrescenta.

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