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Ciência em 2015 já tem fortes candidatos a marcos históricos

O superacelerador de partículas LHC e o fim do ebola são alguns dos postulantes ao título

Especialistas trabalham no acelerador de partículas LHC.
Especialistas trabalham no acelerador de partículas LHC.Michael Hoch / CERN

Ninguém na ciência tem a ousadia de antecipar uma descoberta, mas os especialistas têm olfato para saber onde e quais áreas de pesquisa são mais férteis para uma novidade de destaque. Uma nova unidade será aberta com boas perspectivas de vislumbrar o que nunca antes foi visto, uma linha de trabalho pode estar se aproximando do auge de conquistas acumuladas, uma nave especial que chega a seu destino pode falhar, ou não, mas tem possibilidade de obter nova informação.

A equipe da revista científica Nature faz nesta semana sua previsão para o próximo ano. Em seu texto O que esperar na ciência em 2015, coordenado por Elisabeth Gibney, a publicação aposta no superacelerador de partículas LHC como primeiro candidato a aprofundar o conhecimento do universo, entre uma dezena de temas científicos que valem muito a pena ser acompanhados, como a mudança climática, o fim da epidemia de ebola, os novos medicamentos contra o colesterol, a chegada de uma nave especial a Plutão ou o genoma dos humanos de Atapuerca.

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Superacelerador LHC. Está previso para o mês de março que o acelerador de partículas LHC, perto de Genebra, volte a funcionar após dois anos parado, período em que foi preparado para aguentar quase o dobro de energia nas colisões de prótons que gera, em comparação com a fase anterior. Essa já era a unidade deste tipo mais potente do mundo, e agora irá muito mais longe. O Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN), perto de Genebra, espera para maio as primeiras colisões úteis para os experimentos. Enquanto, em 2012, os cientistas descobriram no LHC o histórico bóson de Higgs, agora esperam “revelar fenômenos que fechem as brechas do Modelo Padrão de física de partículas”, destaca a Nature. Além disso, “a popular [entre os físicos] teoria de supersimetrias, já em dúvida, poderia perder partidários se o LHC atualizado não encontrar indícios das muitas partículas pesadas que tal teoria prevê”.

O acordo do clima. Está prevista para dezembro de 2015 uma data importante na luta contra a mudança climática: a conferência anual que, nesta ocasião, será realizada em Paris. O objetivo da cúpula, após o acordo fechado este ano entre os dois países que são os maiores emissores de gases do efeito estufa no mundo (EUA e China) para reduzir a poluição climática, é alcançar acordos vinculantes sobre o controle das emissões para depois de 2020, afirma a Nature. Enquanto isso, aponta, o número médio mundial de dióxido de carbono na atmosfera terrestre pode superar as 400 partes por milhão pela primeira vez em milhões de anos.

Alguns números e muitos biscoitos

- O investimento mundial em Pesquisa e Desenvolvimento (P+D) alcançará, em 2015, a casa de 1,55 trilhão de euros (ante 577 bilhões em 2000; 780 bilhões em 2005 e um trilhão em 2010), segundo um gráfico da revista Nature,que reúne os grandes valores investidos em ciência e tecnologia.

- Cerca de 10 milhões de pesquisadores em todo planeta, com uma média de 50 horas semanais de trabalho, somam 2,9 milhões de anos de trabalho científico.

- Em 2015 haverá no mundo 260.000 novos médicos, serão publicados 920.000 artigos científicos (um crescimento anual de 2,8%) e os bancos genéticos terão acumulado 1,5 bilhão de bases (as letras químicas do DNA), o que equivale a cerca de 500 genomas humanos.

- No capítulo das curiosidades, a Nature calcula que serão consumidas 234.000 biscoitos na estação científica norte-americana de McMurdo, na Antártida, e que os pesquisadores vão tomar no planeta todo 1 bilhão de xícaras de café, "seu estimulante favorito".

Fim da epidemia de ebola. Os especialistas em saúde esperam acabar com o atual surto de ebola que atinge três países da África Ocidental: Serra Leoa, Libéria e Guiné. Essa vitória “vai exigir medidas em andamento como a detecção rápida [dos casos] e o isolamento de pessoas contaminadas”. Mas também, destacam os especialistas da revista, será preciso ficar atento aos testes das vacinas contra o vírus (resultados são esperado para junho), assim como aos medicamentos que estão sendo testados. A publicação também destaca os tratamentos em estudo que utilizam sangue rico em anticorpos de pacientes que superaram o vírus para ajudar o sistema imunológico de doentes.

Viagens especiais a planetas anões. Primeiro será Ceres a receber a visita de uma nave especial. Será a Dawn, da NASA, que chegará em março a esse objeto do Sistema Solar, o mais massivo que se conhece do cinturão de asteroides que existe entre Marte e Júpiter. Depois, a nave New Horizons, também da agência espacial norte-americana, chegará a Plutão. Sobrevoará esse planeta anão e terá aproximação máxima em 14 de julho. Espera-se que obtenha uma avalanche de novos dados sobre esse corpo rochoso, suas luas e sua atmosfera.

Grafeno e Biomedicina. Os centros de pesquisa inaugurados, quando são devidamente planejados, representam uma fonte potencial de descobertas importantes. Em novembro de 2015, o Instituto Francis Crick abrirá as portas em Londres, com 1.250 pesquisadores e um financiamento de 817 milhões de euros (2,6 bilhões de reais). Será um centro interdisciplinar voltado para a biomedicina. Também no Reino Unido, especificamente em Manchester, será inaugurado o Instituto Nacional do Grafeno. Financiado em parte pelo Governo britânico, é um elemento-chave do plano de Manchester chamado Cidade do Grafeno. Na universidade dessa cidade trabalham os cientistas russos Andre Geim e Konstantin Novoselov que, em 2010, receberam o prêmio Nobel de Física pela descoberta do grafeno.

Medicamentos contra o colesterol. Várias empresas farmacêuticas competem para levar ao mercado novos remédios contra o colesterol, que podem ser aprovados em 2015. As terapias que reduzem a lipoproteína LDL atuando sobre a proteína PCSK9 se mostraram promissoras nos ensaios clínicos. A Nature cita especificamente dois remédios, um do laboratório californiano Amgen e outro do francês Sanofi, que dependem de autorizações que podem ser concedidas até meados do ano.

Ilustração da nave espacial `New Horizons´ passando por Plutão.
Ilustração da nave espacial `New Horizons´ passando por Plutão.Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute (JHUAPL/SwRI)

Ondulações do espaço-tempo. Até o fim de 2015 estarão prontos para trabalhar com maior sensibilidade do que até agora dois grandes detectores norte-americanos de ondas gravitacionais do programa LIGO: um em Richland (Washington) e outro em Livingstone (Louisiana). O objetivo é captar ondulações no espaço-tempo previstas por Albert Einstein. Além disso, está previsto para o próximo ano o lançamento ao espaço do LISA Pathfinder, da Agência Espacial Europeia (ESA). É uma missão de testes tecnológicos imprescindíveis para se realizar o lançamento ao espaço, até 2034, de um detector de ondas gravitacionais.

O genoma de Atapuerca. Após um primeiro genoma (mitocondrial), anunciado em 2013, dos fósseis da Sima de los Huesos, em Atapuerca (Burgos, Espanha), de 400.000 anos atrás, os cientistas esperam conseguir agora o genoma do núcleo da célula. Pode ser neste ano, apesar de o desafio ser enorme, devido à antiguidade dos ossos e ao pouco DNA recuperável neles. “Mas os resultados podem ajudar a esclarecer a relação evolutiva entre os humanos, os neandertais e outro grupo remoto, os denisovanos, e a identificar episódios de cruzamento entre hominídeos relacionados entre si”, destaca a Nature.

Política científica. O Governo russo propôs avaliar 450 institutos de pesquisa da Academia Russa de Ciência. No Reino Unido, as eleições gerais de maio vão formar um Parlamento que decidirá sobre a permissão, ou não, pela primeira vez no mundo, da fertilização in vitro de três progenitores, uma técnica que combina o material genético de três adultos e que pode ser útil para tratar determinadas doenças hereditárias.

Observação oceânica. Dois novos navios de pesquisa norte-americanos começarão suas operações: o Sikuliaq ártico, da Fundação Nacional Para Ciência (NSF), e o Neil Armstrong, da Instituição Oceanográfica Woods Hole. A Alemanha também vai estrear um navio científico, o Sonne, que repete o nome de seu antecessor. O sistema da Iniciativa de Observação do Oceano estará completo em 2015 para o estudo marinho em tempo real. O Japão, por sua vez, lembra a Nature, reiniciará, provavelmente, a captura “científica” de baleias em águas antárticas, depois da interrupção imposta pela Corte Internacional de Justiça.

Experimento com gêmeos na estação espacial

Além da lista feita por seus próprios especialistas, a Nature convidou especialistas e pesquisadores de diversas áreas a apresentar seus desafios para 2015. Elenor Stofan, cientista da NASA, além de citar as aspirações da agência de enviar astronautas a Marte até a década de 2030, destaca um experimento curioso que começará em março do próximo ano na Estação Espacial Internacional (ISS): o astronauta norte-americano Scott Kelly e o cosmonauta russo Mijail Kornienko iniciarão um período de permanência com previsão de durar um ano na base orbital (um recorde para profissionais da NASA, ainda que fique abaixo da duração de períodos contínuos de humanos no espaço cumpridos na estação espacial soviética Mir há algumas décadas). O objetivo da permanência de Kelly e Kornienko é investigar os efeitos da microgravidade no organismo humano para conseguir combatê-los em viagens espaciais futuras de longa duração. A novidade, conta Stofan, é que Kelly tem um irmão gêmeo idêntico, Mark, que também foi astronauta, e que, permanecendo em terra, permitirá agregar valor à pesquisa acrescentando um controle genético dos processos realizados em Scott.

Athene Donald, diretora do Churchill Collegge, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, destacou a participação das mulheres na universidade. Seu objetivo (“para o próximo ano e os seguintes”, diz) é aproximar o equilíbrio de gênero entre os estudantes. Apenas 35% dos estudantes que ingressam a cada ano na instituição são mulheres, “e, menos ainda, em matemática e engenharia”, acrescenta. “Atrair as melhores mulheres jovens é fundamental, é importante educacionalmente e moralmente”.

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