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Violência no Brasil

Brasil tem seis assassinatos por hora, a maioria de homens negros

O Brasil também é um dos países onde a polícia mais mata e mais morre do mundo

María Martín
Foto cedida pelo sindicato dos servidores penitenciários do Maranhão.
Foto cedida pelo sindicato dos servidores penitenciários do Maranhão.

A cada dez minutos, uma pessoa é assassinada no Brasil. O ano passado foi sangrento e foram contabilizadas 53.646 vítimas de crimes violentos. Os dados da última edição do Anuário de Segurança Pública são pouco esperançosos e traçam “um cenário de crise endêmica”. Embora os homicídios venham se estabilizado e a taxa de 26,6 vítimas por cada 100.000 habitantes seja muito menor que em outros países, como Honduras (90,4) ou a Venezuela (53,7), o número segue sendo muito alto para os especialistas.

O informe, que nos últimos oito anos tornou-se referência para conhecer os números da violência no Brasil, traz também outros dados que preocupam, como a letalidade policial: em 2013, ao menos seis pessoas foram mortas por dia nas mãos de policiais. Os agentes brasileiros mataram, em cinco anos, 11.197 pessoas, enterrando mais vítimas que as polícias norte-americanas em três décadas. “As polícias brasileiras mantêm um padrão absolutamente abusivo do uso da força letal como respostas públicas ao crime e à violência”, sustenta Samira Bueno, secretária-executiva da ONG Fórum de Segurança, responsável pelo levantamento.

Os números da violência

  • Em 2013, houve 53.646 mortes violentas, incluindo vítimas de homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. O número é 1,1% superior ao de 2012
  • A taxa de crimes por cada 100.000 habitantes é de 26,6
  • As polícias brasileiras mataram 11.197 pessoas nos últimos cinco anos
  • Nos últimos cinco anos, foram mortos 1.770 policiais, 75,3% deles enquanto estavam fora de serviço
  • O número de estupros cresceu ligeiramente e atingiu 50.320 vítimas
  • Na população carcerária, 61,7% são negros ou pardos. O porcentual sobe para 68% quando se trata de vítimas de homicídios
  • O número de pessoas encarceradas no Brasil atingiu 574.207 internos
  • O déficit de vagas nos presídios brasileiros cresceu 9,8% entre 2012 e 2013 e atingiu um total de 220.057 vagas faltantes
  • O número de presos provisórios, aguardando julgamento, atingiu 215.639 pessoas ou 40,1% do total dos detidos

Os números provavelmente são maiores, pois os pesquisadores ainda enfrentam a falta de transparência de muitos Estados que mantêm lacunas na contabilização das ações letais das suas Forças de Segurança, entre eles Sergipe, Ceará, e Mato Grosso do Sul.

Os policiais são também presa fácil do crime, sobretudo fora de serviço. Assim, o Brasil é “um dos países em que os policiais mais morrem e mais matam”, diz o relatório. Só no ano passado, 490 oficiais morreram violentamente, um número que dispara até 1.770 se considerarmos os últimos cinco anos. “A morte dos policiais em serviço é tão ou mais grave do que a vitimização fora dela. Embora o número tenha decrescido do ano passado para este, parece haver na sociedade uma aceitação natural da perda da vida do policial. Um Estado onde é natural que um policial perca a vida em razão da sua profissão é um Estado que está sob a lógica da barbárie”, reflete no relatório Rafael Alcadipani, professor de estudos organizacionais da EAESP/FGV. O fato de 75,3% dos policiais morrerem fora de serviço, a maioria durante seus bicos, ilustra, segundo os especialistas, a precariedade da polícia brasileira.

A maior taxa de policias mortos em 2013 foi registrada no Pará, onde, precisamente, ainda se apura o número de mortes –poderiam superar as 20– de uma chacina executada supostamente por policias em revanche ao assassinato de um cabo nesta semana.

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O Brasil que, com mais de 574.000, é o quarto país que mais encarcera do mundo, tem nos presídios um calcanhar de Aquiles, segundo os especialistas. Os dados do relatório revelam um sistema penitenciário congestionado por crimes relacionados com o tráfico de drogas e onde 40% dos presos ainda esperam julgamento. Mostra do colapso das prisões é a falta de mais de 220.000 novas vagas. Uma cifra que vem aumentando 10% nos últimos anos. “A cada ano, aumenta a superlotação e o orçamento é insuficiente. Apesar de a percepção de que a impunidade é alta, a punição acontece de forma preventiva e para delitos onde é questionável o emprego da prisão, como a comercialização de pequenas quantidades de drogas", lamenta Renato Sergio de Lima, vice-presidente do Fórum, que insiste no domínio das facções criminais nos presídios. “O sistema acaba reforçando os laços criminais”.

Os números também colocam sobre o papel um sistema racista, que pune majoritariamente a população jovem e negra. “Há um padrão que se repete de seletividade penal”, afirma Renato Sergio. O levantamento indica que 61,7% da população carcerária são negros ou pardos. Na população brasileira, no entanto, os negros e pardos são 50,7% do total, segundo o censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa “seletividade” nos presídios é ainda mais patente ao enxergar as vítimas de homicídio: 68% delas são negras e pardas.

Falta de confiança

O estudo sobre a violência está acompanhado de uma pesquisa sobre a confiança dos brasileiros nas instituições e nas leis, elaborada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito-SP. As conclusões revelam que apenas 32% confiam no Poder Judiciário e que a polícia conta com o voto de confiança de apenas 33% dos entrevistados. “São dados muito negativos, porque o Poder Judiciário em outros países está melhor colocado que a polícia, mas, no Brasil, demonstra que a aplicação da lei, em geral, não merece a confiança da população, afirma Oscar Vilhena, diretor da Direito SP da FGV. “Há indicadores que explicam estes dados. A Justiça é lenta, como em todos os países, mas é aplicada de maneira desigual. A respeito da polícia, é apontada sua ineficiência. Se pensa que não serve acudir a ela, porque [a polícia] não vai abrir uma investigação e, por outro lado, são temidas sua arbitrariedade, a violência e a corrupção", completa Vilhena. Assim, não é de estranhar que 81% acreditem que é fácil desobedecer as leis do país.

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