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Economia em marcha lenta é o calcanhar de Aquiles de Dilma

A presidenta negligenciou o controle da inflação e perdeu confiança dos empresários

Carla Jiménez
Ato de campanha no Rio nesta quarta-feira.
Ato de campanha no Rio nesta quarta-feira.Mario Tama (Getty Images)

A poucos dias da eleição ainda é incerto dizer quem estará no comando de Brasília, no ano que vem. Mas a única certeza que se tem até o momento é que 2015 tende a ser um ano amargo para o próximo presidente, diante da tarefa de estimular a economia e ao mesmo tempo, ajustar as contas públicas. Isso porque a atividade em marcha lenta não é ruim somente para o empresário do setor privado que vende menos, ou para o trabalhador que fica inseguro diante de um futuro nebuloso. A economia na corda bamba é ruim para o próprio Governo que arrecada menos impostos, e portanto tem menos receita para bancar seus gastos. Diante da perspectiva de crescer entre 0,3% e 0,7% este ano, não é difícil concluir que a equipe de Dilma Rousseff está com o mesmo problema que a dona de casa brasileira para fechar as suas contas no final do mês.

Rousseff manteve a mesma política econômica de Lula, que privilegiou o ganho de renda dos trabalhadores com a valorização do salário mínimo, a blindagem do emprego e o reajuste acima da inflação. Mas, a fórmula mostrou-se insuficiente para incentivar o ‘espírito animal’ dos empresários, ou seja, os investimentos das empresas, que hoje estão na casa de 16,5% do PIB. No México, por exemplo, essa taxa é de 24,1%, no Chile, 25,6%, e no Peru, 27,8%. A meta de Dilma quando assumiu o governo em 2010 era chegar a este ano com uma taxa de investimento de 24%, uma prova irrefutável que sua aposta não cumpriu o esperado.

Não por acaso a economia virou o eixo da campanha eleitoral deste ano. “Eu voto no Aécio para que ele dê um jeito na economia”, diz uma eleitora do candidato tucano, em São Paulo. Como ela, grande parte do eleitorado do PSDB se identifica com a mensagem que o presidenciável tem transmitido nesta campanha: o Brasil precisa de mudanças para encarar uma retomada. Em todos os debates, Aécio Neves acusou a presidenta de ter levado o país à recessão e se apresenta como a alternativa para mudar esse quadro. Uma de sua frases preferidas é “O Brasil precisa voltar a crescer”. Dilma se defende argumentando que a conjuntura internacional puxa o país para baixo, lembrando que são poucos os países que conseguiram manter uma taxa de desemprego tão baixa, apesar do descalabro financeiro mundial.

Ao longo da campanha, a presidenta assegurou que o país “criou as bases para um novo ciclo de crescimento”. O problema é quebrar a resistência dos empresários e do mercado brasileiro que perderam a confiança na política econômica da presidenta. A boca pequena, alguns afirmam que vão adiar investimentos caso Dilma seja eleita. Isso por conta das armadilhas que ficaram pelo caminho e que precisarão ser desarmadas. Uma delas é a inflação resiliente. Para combatê-la, os juros da economia foram elevados, algo que vai contra o crescimento. Dilma até tentou se diferenciar e reduzir as taxas para apoiar o setor privado. Mas o timing, entre março de 2012 e março de 2013, mostrou-se errado, pois os preços continuaram subindo. Para combater esse dragão, outras armadilhas. O aumento de gasolina, por exemplo, foi congelado para não pesar mais na inflação. A medida, porém, prejudicou a principal companhia estatal brasileira, a Petrobras.

Dilma até procurou incentivar o setor privado com a concessão de subsídios a diversos setores, além de manter uma taxa de juro mais baixa nos empréstimos do BNDES, por exemplo. Mas as medidas tiveram efeito limitado. Tanto que hoje é a mesma indústria quem começou a cortar postos de trabalho, resgatando as demissões, ainda que em pequena escala, que pareciam estar aposentadas no governo que se orgulha em mostrar o quadro de pleno emprego em algumas regiões do país. “Nem sempre incentivo se transforma em crescimento”, afirma o economista do Itaú Unibanco, Luka Barbosa. “Se não houver confiança, não tem como”, completa. E o que drenou a confiança em Dilma foi alterar alguns compromissos com as contas públicas, observa Barbosa, algo que colocou o setor privado contra a reeleição de Dilma.

Com despesas crescentes, o Governo alterou compromissos construídos na última década. Um deles foi alterar o chamado superávit primário (receitas menos despesas públicas, descontando o que se deve de juros da dívida pública), um indicador que serve de termômetro da capacidade de o governo honrar seus compromissos, que vem caindo gradualmente. No começo do primeiro mandato do Governo Lula era de 4,25%, e foi caindo gradativamente. A meta do Governo Dilma era que o primário estivesse em 2,5%. Mas, não será possível chegar nem aos 1,9% esperado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. O Itaú calcula que ele ficará abaixo de 1%.

O presidente eleito terá de então reorganizar as finanças, fazendo cortes de gastos públicos, ao mesmo tempo em que precisará estimular o crescimento econômico. Uma tarefa árdua que precisa ser feita para colocar o país na rota correta. Toni Volpon, diretor de pesquisa para a América Latina do banco Nomura Securities, acredita que o ajuste pode passar por remédios impopulares, como o aumento de impostos, desemprego e revisão dos incentivos fiscais. Para ele, com Aécio seria um ajuste mais curto e certeiro, por ele representar a mudança solicitada pelos brasileiros. “Se Dilma for reeleita, acredito que o desemprego será maior”, acredita Volpon.

Armínio Fraga, que pode ser o futuro ministro da Fazenda se Aécio for eleito, tem procurado dissipar os receios de que haverá desemprego ou redução dos ganhos de renda, um mantra que a campanha do PT tem repetido na campanha eleitoral para atacar o rival. Fraga entende que a retomada dos compromissos, como o superávit primário mais robusto, e a inflação no centro da meta de 4,5% deve ser feita gradualmente, num período médio de três anos. Hoje, a inflação está no teto da meta estabelecida pelo Banco Central (de 6,5%).

Reeleita ou não, Rousseff deixa de herança do seu primeiro mandato o desafio de resgatar a confiança por ‘manobras’ como as do preço da gasolina congelado, além de outros artifícios contábeis para fechar as contas públicas, como a transferência de dinheiro do Tesouro para os bancos públicos, em operações que geraram perdas. Essa tática, que foi batizada de “contabilidade criativa”, colaborou para que o Brasil tivesse sua nota de crédito rebaixada pela Standard & Poors em março deste ano.

Um governo do PT, em todo caso, não poderia mexer no seu maior patrimônio, que é a melhora de renda dos consumidores, acredita o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, economista de confiança do ex-presidente Lula. “Será necessário reprogramar a estratégia de investimento e a relação com o setor privado para depois fazer um ajuste fiscal”, avalia Belluzzo, que teme fórmulas no estilo dos planos de austeridade europeu caso o candidato do PSDB vença. “Vai ser um ano difícil para quem quer que seja. Mas quem quiser fazer ajuste antes de firmar o crescimento vai correr atrás do próprio rabo”, conclui.

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