_
_
_
_
_

Os bancos escoceses anunciam que se mudarão para a Inglaterra se ganhar o sim

Os independentistas acusam o Tesouro britânico de intimidar os votantes

Partidários do sim à independência irrompem em um ato da campanha do não à secessão, na quinta-feira em Glasgow.
Partidários do sim à independência irrompem em um ato da campanha do não à secessão, na quinta-feira em Glasgow.Jeff J Mitchell (Getty)

A campanha do referendum de independência da Escócia chegou à fase de guerra corpo a corpo. A uma semana da votação, o líder independentista Alex Salmond acusou na quinta-feira o Tesouro britânico de montar uma campanha “de intimidação e alarmismo” para impedir uma vitória do sim nas urnas em 18 de setembro. Salmond acusou diretamente Londres de ter vazado para a BBC a notícia de que o Royal Bank of Scotland (RBS) mudará sua sede social para a Inglaterra se ganhar a independência e de pressionar o mundo empresarial para que firme um manifesto contra a secessão da Escócia.

A polêmica sobre a mudança do RBS para a Inglaterra dominou por completo a coletiva de imprensa que Salmond concedeu na quinta-feira em Edimburgo, teoricamente convocada para que a imprensa estrangeira fizesse perguntas ao líder do Partido Nacional Escocês (SNP, da sigla em inglês), mas acabou monopolizada pelas reiteradas perguntas dos meios de comunicação britânicos sobre o anúncio do principal banco escocês. E pelos seguidores que tomavam as últimas filas do salão de atos do centro de convenções de Edimburgo, apoiando o líder da campanha do sim.

Mais informações
A Escócia diz à Catalunha que sua separação do Reino Unido foi “consenso”
Londres oferece mais poder à Escócia para deter o separatismo
A Escócia pondera o preço de seu divórcio

Que o RBS tinha intenção de partir para o sul caso a Escócia conseguisse a independência não era segredo para ninguém, mas até agora não tinha havido uma declaração formal. O anúncio chegou às 7 da manhã da quinta-feira em Londres, na forma de um comunicado às autoridades da bolsa, mas a BBC havia dado a notícia horas antes citando fontes do Tesouro britânico.

Segundo Salmond, trata-se de um vazamento “de enorme gravidade”, não apenas interessada, mas ilegal, porque é uma noticia sensível, com potencial de afetar os mercados, o que exigiu a abertura de uma investigação oficial, e pediu à BBC que revele suas fontes. Apesar de não o haver mencionado, Salmond parecia pensar diretamente em George Osborne, ministro da Fazenda e ministro do Tesouro britânico. E, como tal, representante do principal acionista do RBS desde que o Governo britânico, em tempos de Gordon Brown, teve de resgatar o banco e nacionalizá-lo durante a crise financeira.

O Tesouro negou ter vazado a notícia e garantiu que se limitou a responder às perguntas jornalísticas que lhe haviam sido formuladas. A BBC, por seu lado, defendeu-se dizendo que a notícia era verdadeira e que seguiu os procedimentos editoriais habituais.

O Royal Bank of Scotland já tem seu quartel general em Londres

Acossado por jornalistas londrinos enviados a Edimburgo, o líder independentista insistiu várias vezes que a iniciativa do principal banco escocês não terá impacto nem em forma de diminuição de postos de trabalho nem em redução de renda para a Escócia porque o banco, apesar de ser formalmente escocês, já tem seu quartel general operativo em Londres e o Imposto sobre as Sociedades é dividido de acordo com a distribuição geográfica da atividade da empresa.

Mas os especialistas acreditam que, mesmo que isso seja verdade no curto prazo, o movimento do RBS leva a pensar que sim, que teria impacto no longo prazo na Escócia. E o mercado pareceu dar razão aos especialistas, premiando o banco com uma alta no preço de suas ações em um dia de baixa na Bolsa de Londres.

O RBS não é o único banco que pensa em emigrar para a Inglaterra. Na mesma linha se pronunciaram nas últimas horas outros bancos escoceses como Lloyds, Clydesdale e TSB.

Na reta final do referendum escocês, os pronunciamentos desses bancos, como os de outras grandes empresas como Tesco e John Lewis, provocaram suscetibilidades no campo do sim porque coincidem com a reação dos unionistas desde que no domingo passado uma pesquisa colocou pela primeira vez os independentistas à frente.

Na quarta-feira, os três grandes partidos britânicos enviaram seus líderes à Escócia para fazer campanha em defesa da união. Na quinta-feira, uma centena de grandes empresários também se pronunciou a favor de que a Escócia continue formando parte do Reino Unido, uma iniciativa apadrinhada pelo Governo britânico. Paralelamente, os grandes bancos escoceses lançaram a advertência de sua partida para o sul se a independência ganhar.

O Lloyds e outras entidades também ameaçaram emigrar para o sul

Salmond parecia –na quinta-feira– um tanto ultrapassado por esses acontecimentos, como um escolar que se queixa de que os garotos maiores o estão acossando. Os maiores são, nesta ocasião, o que o líder independentista denomina Westminster, um amálgama que inclui os partidos políticos britânicos, os bancos, as grandes empresas, a BBC e o que Salmond definiu como “os meios metropolitanos”. Ou seja, os meios de comunicação londrinos.

Ao ter se posicionado como objeto dos abusos de Westminster, Salmond está chamando uma vez mais os escoceses para que tomem a ideia da independência não como um risco econômico, mas como uma oportunidade para se livrar da classe dominante britânica. No fim da coletiva de imprensa, quis esclarecer uma coisa: “Isso não está relacionado com a identidade, está relacionado com a democracia”.

“É uma oportunidade que acontece uma vez na vida”, tinha dito antes. “A Escócia está a ponto de fazer historia. Os olhos do mundo estão na Escócia. E o que está vendo o mundo é um debate articulado, pacífico e vigoroso”, proclamou.

Antes, Kenyon Wright, o sacerdote que no fim dos anos a noventa presidiu a Convenção Constitucional Escocesa que daria lugar à criação do Parlamento escocês em 1999, lembrou que precisamente na quinta-feira fazia 17 anos do referendum que aprovou a implantação do atual sistema autonômico.

Mas, longe de festejá-lo, Wright afirmou que o sistema mostrou suas limitações e que é a hora da independência. Em sua opinião, a grande diferença é que “a autonomia é um presente que te podem tomar quando quiserem e a independência é um direito que não te podem tomar”.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_