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Indústria faz alerta sobre impacto econômico da crise hídrica em SP

A Federação das Indústrias do Estado já registra casos de fábricas onde a produção foi suspensa pela falta de pressão nas torneiras Alguns comércios fecham por cortes no abastecimento

María Martín
Represa de Jaguari, do Sistema Canteira.
Represa de Jaguari, do Sistema Canteira.p. fridman (bloomberg)

A indústria de São Paulo, apesar de não representar nem 15% do consumo, é um dos setores que vê com cada vez mais preocupação a falta de água no Estado. Enquanto as ligações dos empresários à Federação de Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) se multiplicam, pedindo informações ou confirmações do que a imprensa publica, as pequenas empresas que trabalhavam durante o período noturno pararam pela falta de pressão nas torneiras, chegando a exigir a demissão de dezenas de funcionários, segundo a própria Federação. O EL PAÍS tentou checar a informação junto a sindicatos da região mas não obteve confirmação.

Seja como for, conforme passam os dias a inquietude cresce no setor privado. Uma pesquisa feita em maio sobre uma possível interrupção do fornecimento, e apresentada há duas semanas pela Fiesp, já ficou velha. Nela, 67,7% das 413 indústrias ouvidas se diziam preocupadas com um possível racionamento de água e 65% considerava que uma interrupção teria um impacto sobre seu faturamento. “Se perguntássemos hoje, esse dado seria outro, muito mais alto”, afirma Nelson Pereira, diretor de Meio Ambiente da instituição.

Há dias que as jornadas de Pereira são monotemáticas e focadas na questão da água. O nível crítico da capacidade do Sistema Cantareira, que abastece 14 milhões de pessoas na Grande São Paulo e 63 municípios do Estado, e a possibilidade de que as próximas chuvas não sejam tão generosas como se espera, coloca as indústrias como a petroquímica, a siderúrgica ou a indústria da celulose à beira de um precipício. “Tratam-se de indústrias que não podem ficar sem água nem um só dia. A falta teria um impacto muito importante nelas. A metade de nossas indústrias não tem uma fonte alternativa de fornecimento”, alerta Pereira.

A palavra “racionamento” ecoa hoje em cada canto da cidade, também na Fiesp. Enquanto o Ministério Público Federal recomenda ao Governo de Geraldo Alckmin que tome medidas urgentes para o racionar a água, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) pede que seja declarado o racionamento, pois afirma ter recebido desde junho 14 reclamações diárias por falta de abastecimento. A Fiesp tem cuidado ao levantar essa questão. “Nosso presidente [Paulo Skaf] é candidato [pelo PMDB] e não queremos fazer política com isso. Mas os Governos estão tentando evitar o racionamento porque traz consequências negativas. Minha opinião é que o Governo já deveria ter trabalhado, há pelo menos um ano, na racionalização da água, não no racionamento, mas sim na redução do consumo. Depois das eleições, os governos vão ter que tomar atitudes mais profundas, e talvez chegar a um sistema de racionamento para mostrar à população que é sério. O cidadão não entendeu o problema e o Governo não está explicando, só está dizendo que não tem problema”.

Para a Fiesp o momento crítico chegará no ano que vem, se as chuvas, que deveriam começar em outubro, não forem suficientes. “Nesse cenário já vamos ter que falar de grandes empresas, onde os efeitos não só vão afetar as pessoas [demissões], como também terá um impacto na economia. Que um setor de uma petroquímica deixe de produzir é algo grave”.

Pereira é prudente e há alguns assuntos que trata com cautela. Um deles é a responsabilidade do Governo estadual na gestão da crise hídrica.

“É difícil responsabilizar diretamente o Governo atual. O sistema Cantareira começou a ser construído na década dos anos 70, e desse período para cá deveriam ter sido desenvolvidas novas alternativas”, avalia. Para ele, o que acontece é muito grave, “as precipitações (chuvas) estão em um nível muito abaixo dos mínimos históricos. Foi uma combinação de fatores perversa, mas também uma falta de planejamento de longo prazo”, afirma. “A população tem crescido, sem nenhum tipo de planejamento. Qualquer uma das obras, que poderiam ser consideradas uma alternativa ao sistema atual, levam anos. E hoje não há projetos, apenas estudos”, afirma Pereira.

– Entre tantos estudos há algum que contemple um possível cenário sem chuvas abundantes?

“Não queremos dramatizar, mas é fácil perceber que se você, na época de chuvas, tem um reservatório zerado, e que seriam necessários dois anos de chuva normal para preenchê-lo, se não vier chuva suficiente, no ano que vem vamos ter um cenário de racionamento sério”.

A falta de água fecha comércios na Vila Madalena

Gabriela Colicigno, São Paulo

Apesar de que a Sabesp, empresa estadual saneamento público, continue negando ações de racionamento de água e justifique a queda de pressão nas torneiras por "trabalhos de manutenção", os cortes já acontecem nas zonas nobres da capital – e em outras regiões da cidade, como a zona norte, é uma realidade há meses. Desde terça-feira, alguns estabelecimentos da Vila Madalena, bairro conhecido pelos bares e gastronomia de São Paulo, estão sofrendo a falta de abastecimento de água durante várias horas por dia.

O restaurante Les Delices de Maya postou uma foto nas redes sociais mostrando diversos galões d’água com a legenda “Caos na Vila Madalena”. Eles informaram que estão sem água desde a tarde de terça-feira, de forma que foi necessário encontrar outros meios para cozinhar e servir os clientes.

O Coffee Lab, uma franquia de cafeterias, também na Vila Madalena, nem chegou a abrir as portas na quarta-feira. Sem água desde as 14h do dia anterior, os proprietários decidiram fechar o estabelecimento. A responsável pelo local postou na sua página do Facebook um cartaz que afirma que o fechamento é culpa do racionamento e critica que a Sabesp não avisou com antecedência.

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