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O FMI reduz a previsão de crescimento do Brasil para este ano e 2015

O Fundo diminui em 0,30% a previsão de crescimento mundial As tensões geopolíticas castigam a lenta reativação econômica global

Jan Martínez Ahrens

A economia mundial, que embarcou no caminho da recuperação, ainda não pode respirar tranquila. A instabilidade do tabuleiro geopolítico, cuja deterioração foi se agudizando nas últimas semanas, espreita da porta. Tanto a espiral de violência no Oriente Médio, quanto o buraco negro em que se converteu a Ucrânia ameaçam esfriar ainda mais umas perspectivas de crescimento global que, diminuídas em 0,30% desde abril, chegam a um fraco 3,4% em 2014. É o que considera o Fundo Monetário Internacional (FMI) no relatório apresentado hoje na Cidade do México e que desenha um cenário caracterizado pelo cansaço das principais potências econômicas, especialmente a zona do euro. Essa falta de vigor generalizada, que nem sequer taxas de juros baixíssimas conseguem animar, corre, além de tudo, o risco de se prolongar no tempo, na medida em que “não se observa nenhum forte impulso nas economias avançadas” e que os grandes mercados emergentes continuam com restrições financeiras como obstáculos.

Fuente: Fondo Monetario Internacional (FMI).
Fuente: Fondo Monetario Internacional (FMI).

“A recuperação não é forte e ainda precisa de apoio. Essa é a mensagem principal”, aponta o diretor de Investigação do FMI, Olivier Blanchard.

Um ano ruim para o bloco latino-americano

O bloco latino-americano terá um ano ruim. Com um crescimento de apenas 2%, sua anemia deriva da fadiga de seus dois grandes motores: México e Brasil. O primeiro viu recortadas suas esperanças ficando em apenas 2,4% (0,6% menos que o previsto em abril). O golpe responde a sua extrema dependência dos Estados Unidos, receptor de 80% de suas exportações. A fraca recuperação de seu vizinho do norte, com que divide 3.185 quilômetros de fronteira, a debilidade da indústria da construção e a contração da demanda interna voltam a semear o desalento em um país que embarcou no mais ambicioso processo de reformas da América Latina. E embora seu aumento do PIB signifique o dobro do ano anterior, termina muito distante dos 5% estabelecidos pelo Pacto por México como a base na luta contra a desigualdade. Mas pior ainda é o resultado do Brasil, onde, segundo o FMI, as restrições financeiras às empresas e, sobretudo, a falta de confiança dos consumidores e das empresas “estão freando o investimento e moderando o consumo”. A consequência é um aumento do PIB de 1,3% para 2014, quase a metade que no ano anterior.

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“A má notícia com a América Latina é que precisa de reformas estruturais, a boa é que elas estão sendo feitas, sobretudo no México, que empreendeu um ambicioso programa de reformas que o ajudará a alcançar suas metas”, detalhou Olivier Blanchard.

A conclusão desta revisão regional é pouco alentadora. Para o organismo dirigido por Lagarde não há, nestes momentos, nem nos grandes países avançados nem na área latino-americana um catalisador econômico claro. “O crescimento mundial é mais fraco do que o previsto […] Apesar de que é preciso reconhecer a incidência de fatores temporários na desaceleração nas principais economias avançadas, ainda não é possível observar um forte impulso da demanda, mesmo com taxas de juros que continuam em um nível muito baixo e que os fatores que estão freando a recuperação diminuíram, como a consolidação fiscal e as condições financeiras restritivas”, afirma o FMI.

Neste quadro de mediocridade planetária, o FMI, no entanto, destaca a atividade “inesperadamente favorável” de Japão, Alemanha, Reino Unido e Espanha. Este último país, cujos prognósticos avançam em constante progressão, chega a uma meta simbólica. Com um crescimento de 1,2% em 2014 e de 1,6% em 2015, a Espanha supera a média da zona do euro (1,1% e 1,5% respectivamente) depois de anos de recessão e destruição de riqueza.

Ambiente de debilidade

Mas a evolução positiva deste quarteto representa relativamente pouco em um ambiente de debilidade e, portanto, ainda sujeita a riscos. O primeiro deles é o longo e nunca acabado conflito no Iraque. Agravado nos últimos meses pelo avanço jihadista, esta implosão territorial ameaça, segundo o FMI, com uma “forte escalada” nos preços do petróleo. Um aumento que já está sendo sentido neste ano e que lembrou aos importadores de petróleo, como a Europa, os perigos de sua dependência energética.

O segundo fator de desestabilização vem da Ucrânia, um corredor profundamente marcado, de novo, pelo jogo energético. A crise que dividiu o país traz consequências para a Rússia, implicada totalmente no conflito e cuja aventura exterior deprimiu a demanda interna. Assim, de um crescimento do PIB de 3,4% em 2012, o gigante russo passa a apenas 0,2% este ano. Esta queda chega, além do mais, depois de uma revisão da baixa para 1,1 pontos em apenas três meses. Trata-se de um dos maiores recortes entre os grandes países e um indicador das tensões enfrentadas pelo governo de Putin.

O outro corte nas previsões corresponde aos Estados Unidos, embora aqui o problema seja de outro teor. Tirando uma correção devida ao excedente de inventários, o FMI aponta que a dureza do último inverno contraiu a demanda ao mesmo tempo em que houve uma queda nas exportações. O resultado é um aumento de apenas 1,7% no PIB para este ano (0,20% menor que em 2013). O organismo monetário, no entanto, aponta uma melhoria gradual, à medida em que as nuvens de chuva comecem a se dissipar, até chegar a 3% em 2015.

A Alemanha e a Espanha, protagonistas da zona euro

Uma porcentagem que significa o dobro da que a zona do euro poderia alcançar na mesma época. Neste seleto grupo europeu, as boas notícias vêm da infatigável Alemanha (1,9%) e, pela primeira vez, da Espanha, que estão em ascensão para o FMI. A previsão para 2014 melhora 0,3% desde o relatório de abril e situa-se em 1,2%. A grande surpresa está em que, tanto este ano quanto no seguinte, a Espanha se coloca acima da média da zona do euro. Embora a diferença seja apenas de 0,1%, poderia ser, se os prognósticos se confirmarem, um dado carregado de simbolismo para um país que sofreu duas duríssimas recessões (2013 terminou em -1,2%) e cujas amargas cifras de desemprego eliminam qualquer euforia.

Mas a boa projeção espanhola tem sua contraposição na debilidade da zona do euro, com um aumento do PIB três vezes menor que o mundial, e com duas de suas principais forças, França e Itália, ainda sem capacidade de realizar seu potencial. “O crescimento na zona do euro é desigual por causa da fragmentação financeira, da deterioração dos balanços públicos e privados, e do elevado desemprego em algumas economias”, indica o relatório.

Fora do euro, por outro lado, o Reino Unido evolui com força, conseguindo a maior subida das grandes nações avançadas (3,2%). “O ritmo de recuperação não é igual para todos. Tanto os Estados Unidos quanto o Reino Unido avançam com força para a normalização. A zona do euro e o Japão estão mais fracos”, indica Blanchard.

O dia em que a China ganhou dos EUA

J. M. A.

A corrida empreendida pela China para se converter na primeira economia do mundo vai tendo resultados. O último foi uma revisão efetuada pelo FMI do PIB calculado em função da paridade do poder de compra. Com este denominador, que persegue ponderações homogêneas entre nações distintas, são indicadas quantas unidades da moeda nacional de um país são necessárias para comprar uma cesta comparável de bens e serviços avaliada em uma moeda comum, normalmente o dólar.

A atualização feita pelo FMI do PIB avaliado em termos de paridade do poder de compra mostra que o peso mundial das economias emergentes (56,4%) já é superior às avançadas (43,6%). Neste contexto, a China absorve 15,9% e os Estados Unidos, 16,5%. Mas se aplicarmos a previsão de crescimento do FMI para este mesmo ano, a potência asiática superaria pela primeira vez na história os EUA (16,5% contra 16,2%, levando em conta que economia mundial crescerá ao redor de 3,4%).

O próprio Fundo Monetário adverte, no entanto, que a ponderação baseada na paridade do poder aquisitivo é apenas outro indicador sistêmico. E que se o PIB for calculado em função do tipo de câmbio de mercado (o normal), o tamanho das economias emergentes diminuiria para apenas 40% e a China perderia a hegemonia.

No multifacético pacote formado pelos países emergentes e em desenvolvimento, a falta de vigor geral se reproduz. O prognóstico para este ano fica nos 4,6%, praticamente igual ao ano anterior. No caso do titã chinês, cujos espirros podem fazer tremer o planeta, há uma ligeira queda, fruto da contração da demanda interna e do esforço governamental para conter a bolha de crédito e corrigir a atividade imobiliária. A consequência é uma previsão de 7,4% que diminuirá para 7,1% no ano seguinte. “É uma desaceleração positiva, porque busca o equilíbrio saudável”, detalha Gian Maria Milesi Ferretti, subdiretor de Investigação do FMI.

A Índia, por outro lado, depois das eleições, diminuiu muito e previsivelmente se encaminha a uma melhora.

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