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A música que irrita o Brasil

A torcida argentina canta o tempo todo e sua letra diz assim: “Brasiiiiil deciiiíme que se sienteeeee”.

Antonio Jiménez Barca
Torcedores argentinos com a máscara do Papa Francisco e de Messi.
Torcedores argentinos com a máscara do Papa Francisco e de Messi.Silvia Izquierdo (AP)

Metrô de São Paulo, a caminho do Itaquerão, onde dali a meia hora Holanda e Argentina disputariam a segunda semifinal da Copa do Mundo de 2014. Um grupo de torcedores argentinos, todos com a camiseta de Messi, começam, em voz alta, a cantar a irritante música do momento, aquela feita para provocar os brasileiros em sua própria casa: “Brasiiiiiil, deciiiiíme qué se siente, al tener en casa a tu papá...”

Ainda não se passou nem um dia desde o funesto 7 a 1 que deixou o país arrasado. Alguns brasileiros, sentados no vagão, olham educadamente pela janela e a paisagem cinza de São Paulo durante a tarde, ou apenas olham para seu reflexo no vidro molhado; outros olham para os argentinos e sorriem com o canto da boca, numa expressão que pode significar muitas coisas. Mas ninguém contesta, ninguém responde. Depois de várias estações, é um torcedor holandês de seus 60 anos que, em um português arrastado mas compreensível, canta a música de resposta criada recentemente para os argentinos, que faz alusão ao numero de Copas do Mundo do Brasil (5) diante das da Argentina (2). Pelo fato de a música ser menos pegajosa que a argentina, de o holandês não ter muita graça e da torcida local ter pouca vontade de festejar, a tentativa fracassa, o holandês volta para um canto do vagão e os argentinos, sorridentes, voltam ao trabalho e gritam: “Brasiiiil, decíiiiime qué se siente”.

A torcida argentina canta o tempo todo: “Brasiiiiiil, deciiiiíme qué se siente, al tener en casa a tu papá..."

Um jornalista de São Paulo explicava havia alguns dias que nada poderia ser pior para o orgulho do país, agora ferido, que o fato de seus vizinhos do sul ganhassem a Copa do Mundo no domingo, no Maracanã. Se isso acontecer, a presidente Dilma Rousseff entregará a Copa do Mundo a Messi. “Vão falar disso pra sempre, imagina...”, acrescentou o jornalista.

Estádio Itaquerão, qualquer minuto do jogo entre Argentina e Holanda. A torcida argentina não se cansa, não para, não murcha. Eles cantam a música provocativa, mas também muitas outras. Aplaudem, gritam, se levantam, giram as camisetas no ar como se suas vidas estivessem ali, e talvez suas vidas estejam mesmo ali . São marcantes, alegres, incansáveis. Acreditam. Em várias partes do estádio, os torcedores holandeses, em minoria e menos barulhentos, tentam chamar a atenção. Mas fracassam.

Na saída do estádio, com o passaporte para a final na alma, os argentinos caminham em direção em metro. Alguns falam com os torcedores brasileiros, amigavelmente, outros sorriem para os holandeses, encolhem os ombros como se falassem “o futebol é assim”. Um homem de seus 40 anos com a camisa de Messi afirma, preocupado: “Alemanha será mais difícil”.

Na saída do metrô, a caminho de sua casa, um torcedor, sozinho, contagiado pela euforia argentina, percebe que está cantando em voz baixa. “Brasiiiiil, deciiiime qué se siente...”.

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