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CORRIDA ELEITORAL

As eleições estaduais abrem a temporada de esquizofrenia política

Os partidos adversários na esfera nacional se unem e acabam dando palanque para mais de um presidenciável

Eduardo Campos e Marina Silva, em fevereiro.
Eduardo Campos e Marina Silva, em fevereiro.EFE

A pouco mais de três meses para as eleições brasileiras, os partidos decidiram mais uma vez dar um nó na cabeça dos eleitores. Na maioria dos Estados as legendas locais não seguirão as composições feitas na disputa presidencial e terão de dar palanque para mais de um candidato. Assim, o mesmo concorrente ao governo que pede votos para a petista Dilma Rousseff acabará apoiando o socialista Eduardo Campos. Não se espante se houver casos em que um candidato se apresente como tucano-petista, ao apoiar a presidenta e, ao mesmo tempo, se juntar a Aécio Neves, do PSDB.

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Levantamento feito pelo EL PAÍS mostra o seguinte quadro nas 27 unidades da Federação: o PT já decidiu lançar candidatos ao governo em 18, o PSB lançará em 12 e o PSDB, em 15. Nas demais localidades ainda não sabem que rumo tomar ou vão apoiar outros nomes, boa parte deles do PMDB, o partido que quase nunca é oposição no Brasil. Esse cenário ainda pode mudar até 5 de julho, quando acaba o prazo para as legendas registrarem suas coligações no Tribunal Superior Eleitoral.

São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Maranhão são alguns dos Estados em que ocorrerá essa esquizofrenia política. No mais populoso Estado do país, o governador Geraldo Alckmin, do PSDB, anunciou que se coligará com o PSB, de Campos. A aliança paulista gerou uma crise interna no reduto socialista porque a vice de Campos, Marina Silva, defendia uma candidatura própria. Assim, Alckmin dará suporte para os dois principais opositores de Rousseff.

Crise semelhante ocorre no Paraná, onde os socialistas apoiarão a candidatura à reeleição de Beto Richa (PSDB) e a descontente Marina Silva vai pedir votos para um candidato do Partido Verde.

No Rio de Janeiro, foi o PT que iniciou uma ruptura com a base que apoiou Rousseff nas últimas eleições, ao lançar Lindbergh Farias para o governo confrontando o antigo aliado Luiz Fernando Pezão, do partido do atual vice-presidente Michel Temer. Coube a Pezão se juntar ao PSDB e ao PSB ao mesmo tempo. Essa possivelmente será uma das composições menos compreensíveis para o eleitor, já que Pezão se diz amigo de Rousseff, mas pedirá votos para dois opositores dela.

O mesmo ocorre no Rio Grande do Norte. O candidato do PMDB, Henrique Eduardo Alves, é o presidente da Câmara dos Deputados e sempre esteve ao lado de Rousseff. Mas, ao invés de dar suporte a ela, se aliou aos dois oposicionistas. No Maranhão, reduto da família Sarney, o comunista Flávio Dino, que apoia Rousseff nacionalmente, também pedirá votos para o tucano Aécio, com quem formalizou um acordo.

A confusão para o eleitorado também chega ao Rio Grande do Sul, onde os socialistas, contrários ao governo Rousseff, pedirão votos para um aliado dela, José Ivo Sartori, do PMDB. Na região central, em Mato Grosso do Sul, os socialistas tomaram o mesmo rumo e subirão no palanque peemedebista, que pedirá votos para Rousseff e Campos.

A falta de coerência nas alianças regionais predomina há anos no Brasil. Ela tentou ser quebrada com a regra da verticalização, que vigorou apenas nos pleitos de 2002 e 2006 e previa que as coligações nacionais deveriam ser repetidas nos Estados. Porém, desde o pleito de 2010, o Judiciário liberou as alianças. “Se há algum idealismo na política no Brasil ela ocorre na esfera federal. Nos Estados há a política do canibalismo, em que as conveniências locais prevalecem”, afirmou a cientista política Aline Machado.

Autora do livro “Alianças eleitorais: casamento com prazo de validade”, Machado diz que a briga por cargos costuma prevalecer na hora de se fazer conchavos políticos. Além disso, analisa ela, a maioria do eleitorado brasileiro não está tão atenta às diferenças entre as coligações. “Só quem sabe sobre as alianças é o eleitor do PSDB, que é o leitor de jornal, a classe média alta. Quem vota no PT, que recebe Bolsa Família, não se preocupa com isso e por isso a Dilma ainda é forte”, afirma.

Em cima do muro

Pelo cenário que se desenha no país, outra característica eleitoral que fica bastante clara é que o fiel da balança nos Estados será mais uma vez o PMDB. Há anos, os peemedebistas não desgrudam do poder nacional. Deram apoio a todos os presidentes eleitos desde o fim da ditadura militar (1964-1985). Atualmente, está com Rousseff, ao indicar o vice-presidente Michel Temer. Na convenção que reafirmou esse apoio, contudo, os peemedebistas deixaram bem exposta essa rachadura do partido: 41% dos votantes optaram por romper com os petistas.

Para não desagradar tanto as bases locais, os caciques peemedebistas decidiram por liberar as alianças regionais. É aí que a confusão se amplia. Os peemedebistas do Ceará se juntarão a Aécio Neves, enquanto que os do Rio Grande do Sul, estarão com Eduardo Campos.

A bagunça é grande também com partidos pequenos e recém criados, como o Solidariedade e o PROS. Aquele seguirá com os tucanos em alguns Estados enquanto esse apoia o PT, mas quer mudanças nos ministérios em um eventual segundo mandato de Rousseff.

Muita coisa ainda pode mudar, já que falta pouco mais de uma semana para a oficialização das alianças. E esse é apenas o início da união, ainda que efêmera, de várias sopas de letrinhas.

Em troca de apoio, os partidos forçam mudanças no Governo

A coligação que elegeu Dilma Rousseff em 2010 não deverá se repetir na candidatura dela à reeleição neste ano. Para piorar sua situação, parte dos partidos que entraram no seu governo no início do mandato já começam a abandonar a nau petista.

O PSB entregou os cargos no ano passado, quando Eduardo Campos decidiu concorrer à presidência. O PDT viveu crises, mas decidiu ficar. O PTB, que sempre foi da base governista, apesar de ter apoiado José Serra na eleição passada, repetirá a coligação com o PSDB, agora dando suporte a Aécio Neves.

A saída dos petebistas, aliás, ligou o sinal amarelo na gestão Rousseff que, para não perder o PR, decidiu trocar o ministro dos Transportes, uma antiga demanda da legenda. O novo trabalho da presidenta agora é conter uma iminente saída do PP e do PSD, ambos com ministérios.

Em São Paulo, por exemplo, o PSD já decidiu que não estará ao lado do candidato Alexandre Padilha, do PT. O presidente da sigla, o ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab, disse que há três opções: lançar candidatura própria ao governo (tendo Kassab ou o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles), apoiar o tucano Geraldo Alckmin ou seguir com o peemedebista Paulo Skaff. Apesar de já ter dado sua palavra para Rousseff, o PSD quase mudou de lado nacionalmente também. A convenção nacional realizada nesta quarta-feira, porém, contou com a presença de Rousseff para fazer um agrado e garantir o apoio do partido que lhe dará 3 minutos na propaganda eleitoral de rádio e TV.

Já o PP, ficou mais animado para deixar os petistas de lado quando viu que a senadora pelo Rio Grande do Sul Ana Amélia, foi sondada para ser candidata a vice na chapa de Aécio.

Até legendas nanicas têm saído do governo ou ameaçado sair. O PSC vai lançar candidato próprio, o pastor Everaldo Pereira. Enquanto o PTC decidiu apoiar os tucanos. Já o PROS, um dos caçulas da política nacional, decidiu apoiar a reeleição da petista, mas pediu a saída do ministro da Fazenda, Guido Mantega, em caso de vitória.

As mudanças nas alianças políticas não afetam só Rousseff. O PSDB também teve uma perda considerável, se comparada as eleições de 2010. O PPS, que nos últimos anos caminhou com os tucanos, estará ao lado de Eduardo Campos, do PSB.

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