_
_
_
_
_

O Brasil não para de seduzir os chineses

Junto com os demais países vizinhos, o gigante sul-americano tem terras férteis para o agronegócio e o minério de ferro

Carla Jiménez

Sete grandes investimentos chineses foram anunciados entre julho e dezembro de 2013 no Brasil. Um deles, da BBCA Group, prevê 320 milhões de dólares na implantação de uma unidade de processamento de milho, para 600.000 toneladas de grãos, na cidade de Maracaju, no Estado de Mato Grosso do Sul. Trata-se de uma das regiões mais ricas do mundo para o agronegócio. Dessa produção, 60% serão destinados ao mercado chinês e 40% ao consumo doméstico.

As dimensões continentais do Brasil seduzem há pelo menos uma década o gigante chinês. Com uma natureza que favorece a produção de toda sorte de grãos e minérios, os chineses não escondem a ânsia para fechar negócios no país. Em todas as áreas. De indústria, a comércio, até bancos, e claro, no setor de agronegócio. Um levantamento da Sociedade Brasileira de Estudos Empresas Transnacionais (Sobeet) mostra que de 2004 até 2013 os chineses investiram em mais de 130 projetos produtivos no país, que somavam, juntos, algo na casa dos 30 bilhões de dólares.

Marcas de veículos como JAC Motors e Cherry circulam pelas avenidas das grandes cidades, e suas fábricas movimentam as cidades onde estão se instalando, a primeira em Camaçari, na Bahia, e a segunda, em Jacaréi, no Estado de São Paulo. Mas, mais do que os produtos manufaturados, o território brasileiro é alvo de cobiça pelas suas terras férteis para a produção agrícola. Até 2011, os chineses adquiriram fazendas brasileiras numa velocidade que assustou o Brasil.

Naquele ano, o Governo restringiu os investimentos estrangeiros em compra de grandes propriedades brasileiras, sob o argumento de proteção da segurança nacional. Os chineses tinham 4 bilhões de reais para gastar naquele momento, e tiveram de se conformar com a decisão, embora tentem convencer o Governo a rever a decisão.

A natureza no Brasil favorece a produção de toda sorte de grãos e minérios. Por isso, os chineses não escondem a ânsia para fechar negócios no país. Em todas as áreas.

Esse apetite voraz por recursos naturais acompanhou a conversão da China socialista para o capitalismo nas últimas décadas. O gigante asiático tem fome de matérias-primas, algo que não só o Brasil, mas a América Latina tem de sobra. Minério de ferro, soja e alimentos encabeçam a lista de matérias-primas que têm pautado os negócios chineses na América Latina, assim como o petróleo. A terra de Mao Tsé Tung passou a ser o maior importador de petróleo do mundo no ano passado, segundo a Administração de Informações de Energia (AIE) dos Estados Unidos.

Prevendo esse quadro, o Governo chinês já mirava, nos anos 90, um movimento de conquista das Américas. Por meio de suas estatais petroleiras, começou a fincar bandeiras ao longo do continente. A Petrochina, por exemplo, chegou ao Peru em 1994, para entrar em negócios de exploração e produção de petróleo, assim como na Venezuela, em 1997. Em 2003, foi a vez do Equador. Outra estatal, a CNOOC, já é a segunda maior exploradora na Argentina.

No ano passado, a China entrou de vez no Brasil por meio do leilão do Campo de Libra, no Estado do Rio de Janeiro, que tem reservas comprovadas de 12 bilhões de barris de petróleo na camada do pré-sal. Em parceria com a Shell, a francesa Total e a brasileira Petrobras, a CNOOC e a Petrochina somam 20% de um consórcio, que planeja investir 500 milhões de dólares em exploração somente neste ano.

Mas, diante da necessidade de alimentar mais de um bilhão de bocas, a saída tem sido importar alimentos... da América Latina. Argentina e Uruguai, ao lado do Brasil, procuram atender a essa expectativa.

Uma década atrás, o Brasil enviava o primeiro navio de soja para a China, com 100.000 toneladas de grãos, observa Paul Liu, presidente honorário da Câmara Brasil China de Desenvolvimento Econômico. “No ano passado, já seguiram 33 milhões de toneladas de soja, número que pode se repetir neste ano”, afirma. Nos últimos tempos, cresceu também a demanda por alimentos processados do Brasil. A BRFoods, por exemplo, uma das maiores indústrias do setor, acaba de ter sete unidades habilitadas pela China para exportar carne de frango.

O gigante asiático tem fome de matérias-primas, algo que não só o Brasil, mas a América Latina inteira tem de sobra.

A evolução chinesa beneficia os países latino-americanos, mas preocupa alguns observadores. Um relatório da Global Development And Environment Institute mostra que nos últimos cinco anos mais de 70% das exportações da América Latina e América Central para os chineses se concentrou em seis comodities, incluindo as agrícolas, e o minério de ferro, matéria-prima que acompanha a expansão da infraestrutura do gigante asiático.

O diplomata Sérgio Amaral, porém, diz que isso não é motivo de preocupação. “Reclamamos que a União Europeia compra pouco nossos produtos agrícolas, e não podemos reclamar que os chineses comprem demais”, brinca. Para ele, o problema não está na concentração em produtos primários, mas na falta de uma política para agregar valor à cadeia de produção brasileira. “Algumas empresas já estão fazendo isso, como é o caso da BRFoods, com seus alimentos processados”, explica.

A China, na verdade, poderia investir muito mais no Brasil. “Mas, pela dificuldade cultural, e a complexidade da economia brasileira, há muitos entraves”, acredita Liu, da Câmara Brasil China. Liu cita, por exemplo, as dificuldades para obter as licenças ambientais nas obras de infraestrutura. Mesmo com aparentes dificuldades, os chineses não param de anunciar novos negócios no país, até aproveitando o crescimento de renda da população nos últimos meses. E driblando as barreiras locais.

As indústrias automobilísticas chinesas começaram a se instalar no país depois que o Governo brasileiro aumentou em 30 pontos porcentuais os impostos para a importação de carros em 2011. O aumento repentino da compra de veículos estrangeiros começou a pesar na balança comercial. E entre as marcas que mais preocupavam estavam exatamente as chinesas, que começaram a fazer sucesso no país. Duas delas decidiram, então, anunciar planos locais. E a promessa é que outras marcas sigam o mesmo caminho.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_