_
_
_
_
_

EUA ratifica a sentença contra Argentina pela dívida não paga aos fundos

A Suprema Corte não admite a trâmite o recurso, pelo que o país se enfrenta à disyuntiva de pagar aos fundos buitre que a demandaram ou a possibilidade de cair em falência O Govierno de Cristina Fernández também pode pedir uma revisão da decisão judicial

Alejandro Rebossio
Cristina Fernández de Kirchner, presidenta de Argentina.
Cristina Fernández de Kirchner, presidenta de Argentina.EFE

Os nove integrantes da Corte Suprema dos EUA comunicaram nesta segunda-feira, em Washington, que mantêm a sentença que proíbe a Argentina de seguir pagando à maioria de credores que aceitaram a reestruturação da dívida em 2005 e 2010, após a moratória de 2001, se o país não saldar antes as suas obrigações com a minoria que recusou os acordos, os chamados fundos abutres e outros investidores mais.

A decisão da Suprema Corte norte-americano é um duro golpe para os interesses da Argentina. Agora, o Governo de Cristina Fernández de Kirchner deverá optar entre pagar os abutres, algo a que se negou sistematicamente, ou suspender o pagamento da dívida reestruturada seguindo a legislação de Nova York, equivalente a 25 bilhões de dólares (cerca de 56 bilhões de reais). Outra opção é que Buenos Aires tente continuar pagando à maioria de credores em Buenos Aires, mas é difícil que os investidores aceitem.

Argentina tem 25 dias para pedir ao tribunal que volte a revisar o caso

A terceira opção seria pedir ao tribunal que reveja o caso. O governo tem 25 dias para solicitar. Mas o país sul-americano deve enfrentar, no próximo dia 30, um pagamento da dívida reestruturada e não se sabe se a sentença ainda valerá ou não, segundo Richard Samp, um conselheiro da Fundação Legal Washington. Este advogado, cuja organização se apresentou no julgamento a favor dos abutres, diz que a Suprema Corte dos EUA aceita revisar só 1% de suas decisões.

A sentença contra Buenos Aires também pode repercutir de forma negativa em futuras reestruturações de dívida de outros países, ao desencorajar a aceitação de acordos e incentivar a via judicial. Assim se manifestaram os Governos dos EUA e da França e o Fundo Monetário Internacional (FMI), embora de todos eles só o Governo de François Hollande tenha se apresentado na Justiça para defender a posição argentina. O Brasil e o México também recorrem aos tribunais para apoiar Buenos Aires.

A demanda foi iniciada por dois dos chamados fundos abutres, NML e Aurelius, que compraram bônus argentinos em 2001 e 2002 a um preço baixo e que, desde 2003, pedem na Justiça que Buenos Aires pague 100% do valor desses títulos. Ambos os fundos e outros credores, incluindo investidores argentinos, recusaram as propostas oferecida, em 2005 e 2010, pelos Governos dos Kirchner que reduziam a dívida pela metade. Eles argumentavam que o super endividamento havia afundado o país e tornado impossível o pagamento das obrigações anteriores. A maioria dos donos dos bônus aceitaram o acordo proposto e 93% da dívida foi renegociada. Mas o restante, 7%, está em litígio judicial. Dois terços desse passivo não refinanciado foi emitido nos EUA, motivo pelo qual  o caso é decidido no país.

Uma decisão judicial que vem de 2012

O juiz de Nova York Thomas Griesa decidiu em 2012 que a Argentina não poderia continuar pagando o rendimento de seus bônus reestruturados até que saldasse sua dívida de 1,3 bilhão de dólares (cerca de 3 bilhões de reais) com NML, Aurelius e outros credores litigantes. Baseou-se em uma cláusula de tratamento igualitário entre credores que existia em antigos títulos que deixaram de ser pagos em 2001. Ou seja, ou Buenos Aires paga os abutres ou suspende os pagamentos outra vez. Mas Buenos Aires negava-se a pagar, porque considerava que isso levaria a outras demandas de mais de 16 bilhões de dólares (35,7 bilhões de reais) e porque acha que o justo é que a minoria dos credores aceite o acordo firmado com a maioria. Além disso, alegava que não podia pagar mais. Veremos o que diz agora, com uma decisão definitivamente contrária.

Buenos Aires se negou a pagar a dívida porque acha que se aceitar chegarão mais demandas judiciais

A Argentina recorreu a um tribunal de apelações de Nova York, que ratificou em 2013 a sentença do juiz Griesa a favor dos abutres, mas a deixou em suspense, à espera da decisão do Supremo de EUA. Por isso, o Governo de Cristina Fernández de Kirchner pediu à Suprema Corte dos Estados Unidos que analisasse o caso.

Os magistrados do tribunal máximo norte-americano costumam descartar a maioria das causas e só abordam aquelas que consideram relevantes para os interesses de seu país. Precisamente, na quinta-feira passada, o Supremo se recusou a se envolver no caso e essa decisão foi conhecida nesta segunda-feira. Foi deste modo que se firmou a decisão a favor dos abutres.

Acatará a sentença?

A Argentina havia prometido perante a Suprema Corte dos EUA que acataria a sentença definitiva. Não obstante, existe a possibilidade de que se negue a pagar e caia então na falência de sua dívida reestruturada. Também pode oferecer aos detentores dos bônus emitidos em 2005 e 2010 o pagamento em Buenos Aires, de modo de evitar embargos, mas é certeza que vários deles proporão reparos. É uma opção já proposta pela presidenta no ano passado.

Outro caminho é acatar a sentença e pagar os demandantes. Inclusive o juiz Griesa deixou recentemente aberta a possibilidade de uma negociação: “Se Argentina está em uma situação financeira em que não pode pagar, o que é que qualquer um de boa fé faz? Vem à Corte e algum tipo de negociação acontece”. O país sul-americano não se encontra em uma crise como a de 2001/2002, mas em janeiro passado o peso desvalorizou, a economia estancou e a inflação chegou a 33% ao ano.

No final de 2014 vence uma cláusula dos bônus emitidos na reestruturação que estabelece que se Buenos Aires melhorar a oferta de 2005 e 2010 para os que recusaram a renegociação, os que a aceitaram têm direito a receber também essa vantagem. Por essa cláusula, o Governo argentino negava-se a negociar com os abutres, porque suporia não só pagar mais os 7% que recusaram a troca, mas também os 93% que a aceitaram. Não se pode esquecer que a falência da Argentina em 2001 foi a maior da história mundial, de cerca de 183 bilhões de reais. A dúvida é o que ocorre se a Argentina não negociar, mas acatar uma decisão a favor dos abutres: isso a obrigaria a pagar mais os detentores dos bônus reestruturados? É uma discussão jurídica.

Agora se espera que Argentina apresente seu último recurso. Enquanto, os abutres pedirão ao tribunal de apelações de Nova York que se execute a sentença contra o país sul-americano, de modo a receber o pagamento do que reclamam.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_