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O Tea Party causa a derrota mais dura à estrutura dos republicanos nos EUA

O líder republicano, moderado em relação à imigração, perde para um professor desconhecido

Marc Bassets
O parlamentar Eric Cantor, acompanhado da sua mulher, Diana, aceita a derrota em um discurso em Richmond, a capital da Virgínia.
O parlamentar Eric Cantor, acompanhado da sua mulher, Diana, aceita a derrota em um discurso em Richmond, a capital da Virgínia.Steve Helber (AP)

A estrutura do Partido Republicano sofreu na terça-feira uma das piores derrotas nas últimas décadas. David Brat, um desconhecido professor de economia ligado ao movimento populista Tea Party derrotou nas primárias republicanas no sétimo distrito da Virgínia Eric Cantor, líder da maioria republicana na Câmara dos Deputados e um dos destaques da direita nos Estados Unidos.

O resultado da primária para as eleições legislativas de novembro surpreendeu a quase todos os políticos e analistas por ter sido inesperada e pela categoria do derrotado – Cantor, de 51 anos, é o número dois do partido, depois do presidente da Câmara, John Boehner – o que implica um dos maiores choques na ordem política em Washington nos últimos tempos.

Intrigado, o Partido Republicano vê aumentar o abismo entre a ala moderada e a ala populista, e como o processo de uma virada mais à direita permite ao Partido Democrata se apresentar como o partido do centro e da nova América: mais diversificada, menos branca, mais tolerante.

Com Brat, de 49 anos, venceu a mensagem oposta à regularização dos imigrantes ilegais diante das posições mais brandas de Cantor e outros líderes republicanos. O Tea Party, dado diversas vezes como morto, continua reafirmando a marca da direita. Não só transformou a agenda do Partido Republicano, como ainda tem poder para destronar os seus homens mais poderosos.

Brat obteve 56,5% dos votos. Cantor, que passou 12 anos na Câmara dos Deputados e foi considerado um forte candidato à sucessão de Boehner no cargo de presidente da Casa, recebeu 44,4%. Desde que o cargo de líder da maioria foi criado, em 1899, nenhum dos ocupantes havia perdido a nomeação para a reeleição, segundo dados do site Smart Politics (Política Inteligente) da Universidade de Minnesota.

O resultado desestabiliza o establishment do Partido Republicano e dá asas ao populismo conservador

A vitória de Brat é a primeira de peso do Tea Party depois que os seus candidatos perderam em uma série de primárias neste ano. Talvez seja a maior vitória da sua história, desde que em 2009, após a chegada do democrata Barack Obama à Casa Branca, vários grupos de ativistas contrários ao resgate financeiro dos bancos, aos investimentos públicos e à reforma da saúde deram força a um movimento que acabou definindo o programa do Partido Republicano. Antes da derrota de Cantor, o veterano senador republicano Richard Lugar, de Indiana, já havia perdido para um candidato do Tea Party, Richard Murdock, em 2012.

As circunstâncias eram diferentes. O Tea Party estava no seu auge. Contava com aliados como o próprio Cantor, um dos arquitetos da reconquista republicana do controle da Câmara dos Deputados nas eleições legislativas de 2010, uma promessa da direita sempre disposta a tirar o poder de Boehner, um homem que sempre teve um pé no establishment e o outro no movimento Tea Party.

Aconteceu que ele nem tinha se distanciado suficientemente do establishment, nem havia apoiado com o fervor adequado o Tea Party. Cantor, sem defender a reforma da imigração que Obama promove e alguns republicanos apoiam, aceitava a regularização de jovens ilegais, uma medida que para o seu rival, Brat, equivalia a uma anistia. A identificação de Cantor com Washington – e muito do que este nome evoca para muitos eleitores: corrupção, politicagem, falta de ligação com o povo – também serviu para Brat na campanha.

A derrota de Cantor – o único republicano judeu no Congresso, tira de Boehner o seu rival próximo, mas pode ser uma fonte de problemas para o Partido Republicano. O caso é interpretado como um sinal de que qualquer concessão sobre a imigração será punido, forçará uma virada mais à direita em um partido que nos últimos anos não deixou de se distanciar do centro. E, se isso acontecer, os democratas terão mais espaço para ganhar as eleições nos próximos anos, com uma mensagem que apele para o centro e as minorias. Mas, sem o apoio da oposição, os planos de Obama para uma reforma imigratória – já muito enfraquecida após as sucessivas negativas da Câmara dos Deputados – ficarão definitivamente congelados.

No mesmo dia em que Cantor perdia, supostamente pela sua posição morna sobre a imigração, o senador republicano pela Carolina do Sul, Lindsey Graham, – favorável a uma reforma imigratória em termos muito semelhantes aos de Obama – derrotava seis candidatos do Tea Party naquele Estado. A política, e muito menos a política norte-americana, não é uma equação.

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