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Coluna
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Um pacto entre Lula e FHC, provocação ou realismo?

A candidata a vice-presidenta Marina Silva propõe unir os dois rivais em torno das reformas necessárias para o país

Juan Arias

Poderia parecer uma provocação não fosse a ideia proposta por alguém que, como a ex-senadora Marina Silva, pré-candidata a vice-presidenta na candidatura do socialista Eduardo Campos (PSB), leva 30 anos na política e há apenas quatro obteve 20 milhões de votos nas eleições presidenciais em que saiu vitoriosa Dilma Rousseff.

A ideia, de alguma forma revolucionária, consistiria em que os ex-presidentes Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) se unissem para tornar possíveis algumas reformas consideradas imprescindíveis para a governabilidade do país num momento de crise como o atual, independente de quem possa ganhar as eleições.

Uma provocação, dadas as biografias dos dois ex-presidentes e as complexas relações desses dois gênios da política, ou seria realismo?

Costuma-se acusar a política, em nível mundial, de carecer de ideias novas, de continuar ancorada nos esquemas do século XIX e o Brasil, de estar preso na política da Velha República, incapaz de conseguir aprovar uma reforma política que modernize de vez o Estado.

A ideia de Marina, à qual a imprensa brasileira deu menos destaque do que merecia, está carregada de realismo e novidade. Seu silogismo é legítimo. De acordo com a ambientalista, nenhum dos dois ex-presidentes, ambos com grande intuição política – que com seus 16 anos de mandato mudaram de alguma forma o Brasil, colocando-o em primeiro plano na geopolítica mundial – foi capaz de fazer, por exemplo, a reforma política que o país reclama a gritos para poder crescer como lhe corresponderia por suas riquezas naturais.

Uma reforma indispensável para libertar o Estado dos vínculos aos quais se vê submetido por uma política partidária antiquada, exposta a todo tipo de corrupção com miríades de partidos conhecidos como partidos de aluguel, sem ideologia nem programas próprios.

Ambos, Lula e Cardoso, apesar de não terem sido capazes de realizar a chamada “mãe de todas as reformas”, como é a política, foram fundamentais para colocar nos trilhos da democracia e do crescimento este país que hoje se sente incômodo e inconformado porque cresceu e quer ser governado de forma diferente, como manifestou 73% de seus cidadãos.

Ao mesmo tempo, ambos deixaram nas intenções as duas ou três grandes reformas que o Brasil precisaria para responder às exigências de um eleitorado cada vez mais exigente e de uma sociedade que já não se conforma com o mantra que a embalou nesses últimos anos de ser um “país do futuro” e quer ser já um país “do presente”.

Provocação ou realismo, a ideia de que os dois ex-presidentes, num gesto inédito na política deste país, se unissem nesse grave momento que o país vive, colocando de lado antigas e atuais arestas pessoais, para tentar conseguir juntos o que não conseguiram separados, é algo que não deve ser desprezado e que mereceria a atenção e a análise das forças democráticas deste país.

Dessa vez se trataria de esquecer as brigas partidárias pontuais e as diferenças pessoais entre os dois ex-presidentes para dar uma resposta inédita a essa insatisfação que está instigando a sociedade, as classes baixas e as altas, na busca de soluções de Estado e não apenas daquelas que atendem a interesses particulares dos partidos.

Lula e FHC, cada um com sua genialidade, no primeiro caso instintiva e, no segundo, forjada no saber acadêmico, teriam juntos, num gesto de grandeza, algo novo a oferecer a um Brasil no qual o mundo tem os olhos postos neste momento, entre admirado e perplexo ao não compreender totalmente em que barco está embarcando.

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