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A Índia começa a votar nas eleições que ameaçam o domínio dos Gandhi

O nacionalista indiano BJP é o favorito nas eleições que começam nesta segunda-feira 814 milhões de eleitores foram convocados

Capa de celulares com os candidatos e os símbolos dos partidos.
Capa de celulares com os candidatos e os símbolos dos partidos.INDRANIL MUKHERJEE (AFP)

"Estou farto dos cortes de eletricidade, da péssima situação das estradas, de ver os jovens sem trabalho. A Índia não avançou nos últimos anos com o Partido do Congresso. De modo que vou votar por Narendra Modi, pelo BJP  [Partido Bharatiya Janata]. Toda minha família e todo meu bairro votará nele”, expressava em voz alta e enojada Brajash Singh, aposentado como funcionário administrativo em uma universidade, enquanto comprava fumo em um posto de rua na cidade de Benares, ao norte da Índia.

“Estamos fartos da corrupção que há no Governo, de modo que vamos tirá-lo daí”, acrescentou o comerciante, também em tom forte. Mas o cliente seguinte fez o contraponto. “A Índia não pode se dar o luxo de eleger um líder que não é laico. Vivemos em uma sociedade diversa. Que passará com nossos vizinhos muçulmanos quando não se sentem representados?”, perguntou se este vizinho desta cidade sagrada do hinduísmo.

Em menos de dois minutos esta conversa tinha se transformado em uma acalorada discussão entre oito pessoas.

Este é o ambiente eleitoral em Benares, que se transformou em um dos locais base para as maiores eleições do mundo, com 814 milhões de eleitores. As votações começarão neste 7 de abril e se farão em nove fases que terminarão em 12 de maio. A contagem e os resultados serão no dia 16 de maio. Os votantes elegerão 543 membros da Câmara baixa do Parlamento. São necessárias 272 cadeiras para eleger ao primeiro-ministro e o mais provável é que se requeira uma coalizão de vários partidos para conseguir a maioria, como aconteceu nos últimos 15 anos.

“Se na política de modo geral nada está escrito, na Índia as coisas são ainda mais voláteis. Ninguém sabe o que vai acontecer: é um país onde contam muitos fatores, como a casta, a classe social, a religião e a diferença entre cidades e áreas rurais. Além disso, estão os 100 milhões de novos votantes”, assegura R. P. Pathak, diretor do departamento de Ciências Políticas da Universidade Hinduísta de Benares.

No entanto as pesquisas apontam uma provável derrota do Partido do Congresso, liderado pela família Gandhi, que governou a Índia na maior parte de seus 67 anos de independência.

Os motivos dessa derrota seriam principalmente a desaceleração da economia, que passou de um crescimento anual de mais de 8% para 5%, bem como uma série de escândalos de corrupção que atingiram o Governo.

Os levantamentos e os analistas preveem uma possível vitória para uma coalizão liderada pelo BJP, o partido nacionalista indiano, com Narendra Modi, que governou o Estado de Gujarat desde 2001 com bons resultados econômicos à cabeça. A Modi se vê como um homem feito a si mesmo, um líder com mão de ferro, característica que muitos consideram necessária agora na Índia após se ver  uns anos sem direção, com um Partido do Congresso debilitado na tomada de decisões pela pressão de seus aliados.

Modi, não obstante, é o líder político mais polêmico dos últimos anos: o acusam de fazer pouco para evitar batalhas comunais que desencadearam uma matança de muçulmanos na cidade de Ahmedabad em 2002 embora nunca fora condenado.

“O Governo se viu debilitado pela crise econômica mundial, mas também pelos escândalos de corrupção que o afetam”, assegura Pathak. Nos últimos anos as pessoas das grandes cidades saiu a manifestar-se em massa contra esta marca. Preocupa tanto que nas últimas eleições locais de Nova Déli o grande ganhador foi o AAP, Partido Aam Admi   que significa o partido do homem comum, uma formação nova que surgiu como resultado do movimento civil anticorrupção.

Alguns analistas acham que poderia dar uma surpresa nas eleições nacionais, embora perdeu um pouco a credibilidade porque seu líder, Arvind Kejriwal, demitiu depois de só dois meses como governador porque não se aceitou uma proposta de lei para criar um ombudsman forte contra a corrupção.

Tanto o fortalecido candidato do BJP, Modi, como a anticorrupção Kejriwal brigam por uma cadeira em Benares. Uma manobra que a maioria considera suicida para Kejriwal, como de “David contra Golias” e alguns poucos de brilhante: enfrentar-se a Modi pode lhe dar não um triunfo ao AAP mas sim uma plataforma para se transformar em um partido nacional, segundo outros analistas.

Benares, a cidade do deus Shiva, é o local perfeito para apelar ao voto hinduísta e além disso é a capital cultural do Estado de Uttar Pradesh, que com 200 milhões de habitantes e 80 cadeiras é o mais povoado e decisivo em qualquer eleição. O BJP ganhou esta cadeira em Benards desde 1991 com uma única exceção em que triunfou o Partido do Congresso. Desta vez poderia ser muito decisivo o voto muçulmano, quase 20% da população, porque se acha que votarão em sua imensa maioria por qualquer candidatura menos a de Modi. Embora fica por ver se seu voto não se dispersará entre um candidato muçulmano, o AAP, ou pelo Congresso.

Os 100 milhões de novos eleitores também são um mistério. As castas ou as classes foram fatores importantes para escolher um partido, mas agora existe um setor da juventude mais informada e politizada que está descontente com os partidos de sempre.

Rahul Gandhi, filho da líder do Congresso, Sonia, e da primeira ministra assassinada Rajiv, não foi nomeado oficialmente candidato, mas se dá por certo que seria primeiro-ministro a ganhar a coalizão que lidera seu partido. O dirigente Congresso abriu mão de sua fortaleza em iniciativas sociais a favor dos pobres para apelar aos votantes. Desta vez prometeu previdência universal e casa para todas as famílias por baixo da linha de pobreza, bem como pensões para os idosos e os deficientes físicos. Em anos anteriores começou um programa de trabalho nas zonas rurais e de dar comidas às crianças para que assistam aulas. Falta ver se estas credenciais servirão para desafiar as previsões e conservar o Governo.

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