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A marca Brasil dá um salto para o exterior

Produtos brasileiros inovadores ganham o mundo e visibilidade no ano da Copa do Mundo

Sandálias havaianas em uma praia.
Sandálias havaianas em uma praia.Divulgação

Pão de queijo, brigadeiro, cachaça, sandálias Havaianas, açaí... Produtos brasileiros que estão conquistando o mercado externo com estratégias criativas e, indiretamente, divulgam a marca Brasil pelo mundo. Um dos casos de sucesso é a Forno de Minas, uma empresa que nasceu em 1990 em Belo Horizonte. As exportações de 2013 cresceram 40% comparando com os resultados de 2012. "E para 2014, a meta é crescer 70% nessa área”, explica Gabriela Cioba, gerente de exportação da empresa. Por se tratarem de produtos muitas vezes desconhecidos em muitos países, uma das principais dificuldades enfrentadas pelas empresas nesta reportagem é conhecer bem o novo mercado e realizar um estudo para apresentar o produto, incluindo a embalagem. Para driblar esses empecilhos, a Forno de Minas resolveu dar o pão de queijo quentinho para o consumidor provar, o que acabou sendo uma estratégia efetiva. "No Uruguai nossas vendas aumentaram 40% depois que fizemos ações em supermercados e pontos de venda", explica Cioba.

A empresa mineira chegou a ficar sob o comando de uma holding estrangeira durante dez anos, que mudou a receita e provocou perda de mercado nacional. A família fundadora, então, comprou de volta e retomou o controle em 2009. Mesmo no período que esteve sob outra direção, as exportações continuaram crescendo. Uma das razões, explica Cioba, "foi que os antigos controladores mantiveram a receita original para os pães de queijo de exportação", o que garantiu o prestígio da marca nos Estados Unidos e Canadá, os principais mercados, além de Portugal, Inglaterra, Chile e Uruguai, onde o salgado mineiro também está ganhando espaço. A renovação da embalagem também faz parte da estratégia. “Fizemos saquinhos em inglês, espanhol e francês, com a bandeirinha do Brasil no canto e mantivemos o nome Pão de queijo em português, mesmo com as traduções mais explicativas sobre o conteúdo”, diz Cioba, enfatizando a importância de manter a identidade do produto, ainda que o consumidor final não entenda o significado.

Para o professor Sherban Leonardo Cretoiu, coordenador do Núcleo de Negócios Internacionais da Fundação Dom Cabral, “internacionalizar uma marca pode ser a causa e também a consequência da inovação. Os benefícios de criar novos produtos e novas apresentações no exterior podem ser refletidos no mercado doméstico, como aconteceu com a Sadia”. Quando a Sadia entrou na Argentina, criou uma linha light para o mercado vizinho, que colocada no mercado nacional posteriormente.

Mas, para um país que tem um dos maiores mercados consumidores, o número de multinacionais brasileiras que estão no exterior ainda é tímido: são 150 companhias, "entre grandes corporações, como bancos, transportadoras, empresas de mineração, serviços de TI e também menores, como as de chocolate e cursos de idiomas", completa Cretoiu.

A Fundação Dom Cabral faz um estudo sobre os avanços dessas empresas brasileiras lá fora, e o avanço também é tímido. O índice de internacionalização das empresas multinacionais consultadas pela Fundação, que indica o nível de expansão delas no exterior, cresce paulatinamente, de 16% em 2010 a 18% em 2012. "O cálculo desse índice é feito considerando os ganhos das empresas no mercado internacional dividido pelo que elas ganham com o nacional, o que nos leva a concluir que o mercado doméstico aumentou em relação às vendas no exterior", explica.

Os benefícios de criar novos produtos e novas apresentações no exterior podem ser refletidos no mercado doméstico"

Sherban Leonardo Cretoiu

Quem ainda não foi para fora, mas está com um pé lá, é a Brigaderia, empresa de Ticiana Kalili, que foi adquirida recentemente pela Cacau Show, que comprou 50,1% da marca. A loja, que agora é uma franquia, tem dez pontos de venda em São Paulo, incluindo um no Aeroporto de Guarulhos. Kalili inovou desde o momento de sua criação, aumentando a família dos tradicionais doces de festas infantis com bolos, sorvetes e experimentos com outros ingredientes, como café, frutas e frutos secos. Mas admite que faria novas mudanças, caso o paladar gringo o exigisse: "Não podemos ser ingênuos de acreditar que o paladar é igual em todo o mundo. Nós temos um conceito, mas o produto tem que ser adequado às diferentes culturas gastronômicas".

Já outros itens não sofrem tanto, como é o caso do produto mais típico do país da caipirinha: a cachaça. A marca Ypióca, adquirida pela holding Diageo em 2012, pretende ampliar sua estratégia no exterior porque acredita que o reconhecimento da cachaça como produto brasileiro amplia as oportunidades de valorização da categoria pelos consumidores internacionais. A bebida, cuja garrafa tem uma identidade singular, revestida de palha, já está presente em 40 países. A 51, sua concorrente da companhia brasileira Müller, também viajou o mundo. E para 2014 decidiu mudar sua etiqueta. Segundo Darleize Barbosa, gerente de exportações, “além da qualidade do produto, temos que pensar nas tendências. Decidimos criar uma garrafa mais atraente para atender os já consumidores e conquistar novos". A cachaça 51 estreou no mercado externo nos anos 90 quando chegou ao Japão. Hoje ela está em 50 países.

Diferentemente da cachaça, que tem uma matéria prima abundante nos canaviais, o açaí enfrenta outras dificuldades. A fruta, cultivada nos estados da região norte, às vezes escasseia e recuperar o estoque é um transtorno. "No começo de 2012 tivemos que correr para comprar e congelar, para suprir a necessidade do mercado", explica Albert Cesana, fundador e responsável de comércio exterior da Frooty, que está presente em 10 países além do Brasil.

Explicando o produto

Brigadeiros da empresa Brigaderia.
Brigadeiros da empresa Brigaderia.Divulgação

Assim como o pão de queijo e o brigadeiro, o açaí também enfrenta a barreira da descrição do produto. "Fazer degustação é um trabalho de formiguinha, mas funciona. Em 2013 dobramos as exportações e a tendência é aumentar, porque este mês iremos ao Japão e à China apresentar o produto em feiras alimentícias", anuncia Cesana. A empresa, que existe desde 1989, tenta encontrar nichos de potenciais consumidores, levando o produto “a academias de jiu jitsu em Cingapura”, por exemplo, enaltecendo os valores antioxidantes e naturais do açaí em polpa. Cretoiu crê que a capacidade de internacionalizar independe do tamanho da empresa. Para ele, sair do Brasil está relacionado com a capacidade de gestão e de tecnologia. "A situação ideal é quando temos um mercado atrativo e uma empresa com grande capacidade competitiva", conclui. No caso do açaí, o vento sopra a favor: a concorrência lá fora é quase inexistente.

Já as Havaianas, marca que existe desde 1962, que somente em 1994 trabalhou uma ação de marketing mais arrojada para vender mais chinelos, é um dos produtos brasileiros que mais sucesso tem no exterior. Com as Havaianas TOP, a oferta já ficou mais colorida. Em 2006 surgiram as Slim, mais finas e delicadas. Em 2010 abriu sua primeira loja em Barcelona, na Espanha, e agora tem 92 pontos de vendas lá fora. Nos nove primeiros meses de 2013, o grupo Alpargatas, do qual faz parte a marca, faturou 331,1 milhões de reais, 25,1% a mais que em 2012. A receita em moeda estrangeira representa 32% do faturamento global da empresa, que agora também diversificou a marca agregando tênis, toalhas e capas para iPhone à família dos chinelos.

Para Ricardo Santana, diretor da Apex, a Agência Brasileira e Promoção de Exportações e Investimentos, o grande foco é esse, tanto que a instituição tem um programa exclusivo para a modernização do design de produtos e embalagens. No entanto, Santana acredita que o que realmente agrega valor lá fora é um modelo de negócio que pouco a pouco vai ganhando espaço no país: a sustentabilidade. "Se uma empresa é sustentável e preocupada com questões ambientais ela ganham mais mercado, se torna mais competitiva". E, apesar da marca Brasil ser um ponto relevante na hora de promover um produto lá fora, ele opina que muitos empresários pecam pela falta de planejamento. "E não é porque você tem sucesso no Brasil que seu produto vai dar certo lá fora, a preparação é o alicerce que vai determinar o sucesso", conclui Santana.

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