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Uma cidade tão rica quanto violenta

Uma das regiões mais dinâmicas e modernas do Brasil, o município de Campinas é dominado por uma política coronelista que decide as questões a balas

Marina Rossi
Ônibus incendiado em Campinas.
Ônibus incendiado em Campinas.Pedro Amatuzzi/Sigmapress (Folhapress)

A Região Metropolitana de Campinas, composta por 19 cidades, é responsável por 5,9% do PIB nacional, o equivalente a cerca de 260 bilhões de reais, por ser um importante centro industrial. Acolhe uma das mais importantes universidades do país, a Unicamp, e é um importante polo de engenharia e tecnologia. Apenas 96 quilômetros separam essa cidade da capital do Estado, São Paulo. Moderna e rica, Campinas, administrada atualmente pelo prefeito Jonas Donizette (PSB), amarga péssimos índices de violência. A taxa de homicídios, atualmente, é de 17,1 por 100.000 habitantes, enquanto em São Paulo, por exemplo, esse índice é de 11,9 por 100.000 habitantes, segundo o centro Brasileiro de Estudos Latino Americanos.

“A região de Campinas é historicamente problemática”, diz a socióloga e pesquisadora da USP, Camila Nunes Dias. “É uma região potencialmente violenta, por ser importante na rota do comércio de drogas ilícitas, e com uma relação entre as polícias muito turbulenta, o que corrobora para uma corrupção (policial) muito grande”.

São muitos os episódios que poderiam ilustrar a teoria de Dias. Um deles, ocorrido em meados do ano passado, foi uma operação, feita em parceria entre a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e o Ministério Público, que desarmou uma quadrilha de policiais do Departamento Estadual de Repressão ao Narcotráfico (Denarc). Ao menos 13 PMs foram indiciados por cobrança de propina de um grupo de traficantes.

Outro caso, ocorrido no ano 2000, foi a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (a CPI do narcotráfico) para investigar a lavagem de dinheiro, assassinato, e atividades relacionadas ao narcotráfico de agentes públicos, órgãos estatais e até deputados.

Mas poucos fatos podem superar a inesquecível tragédia para a história do município onde nasceu o maestro Carlos Gomes, autor da ópera O Guarani, como o ocorrido em setembro de 2001. Entregue às moscas, a cidade começava a viver uma onda de esperança no ano 2000, quando o então candidato à prefeitura Antônio da Costa Santos, conhecido como Toninho do PT (Partido dos Trabalhadores), se apresentava como a possibilidade de mudança para uma cidade acometida por graves notícias negativas.

O prefeito tomou posse no dia primeiro de janeiro de 2001, empinando uma pipa no terraço do prédio da Prefeitura Municipal. A imagem histórica era uma metáfora aos novos rumos que Toninho queria dar para Campinas. E ele tinha grandes planos para a cidade, sob a misteriosa frase "A primavera vem aí".

Logo no início de sua administração, Toninho passou a promover ações contra o crime organizado e logrou reduzir em até 40% os valores pagos às empresas licitadas que prestavam serviços como a entrega de merenda nas escolas municipais e a limpeza urbana, um foco de corrupção constante na região.

A gestão de Toninho do PT, arquiteto e professor, pai de uma menina, foi interrompida antes da primavera chegar. Na noite do dia 10 de setembro de 2001, Toninho voltava para casa quando foi assassinado com tiros à queima roupa. Depois de anos de investigação, o caso foi dado por encerrado pelo Ministério Público como um "crime comum", com a explicação de que Toninho atrapalhava a rota de fuga de bandidos perigosos, liderados pelo traficante Andinho. Mas essa tese não foi aceita até hoje. Certamente Toninho estava atrapalhando mais de um caminho naquele ano.

A cidade de coronéis, cujas desavenças são resolvidas como se vivêssemos na era medieval, ficou em choque com a notícia e até hoje cobra explicações. As mesmas que deveriam ser dadas sobre a chacina na última madrugada.

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