Kerry converte a paz entre israelenses e palestinos na sua cruzada
Secretário dos EUA volta a Jerusalém e Ramala, em sua décima visita em 11 meses Apresentará a ambas as partes um acordo marco para o estabelecimento da paz
O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, não se deu nem o dia 1º do ano de descanso em seus esforços por conseguir um acordo de paz definitivo entre israelenses e palestinos. À noite, aterrissou em Tel Aviv para sua décima visita à região, onde terá reuniões com o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e o presidente palestino Mahmoud Abbas. Em seus 11 meses como chefe da diplomacia norte-americana, Kerry converteu o processo de paz, do qual muitos de seus antecessores se retraíram por enfado, em sua cruzada pessoal. É uma tentativa que alguns qualificam de titânica e outros de quixotesca, na qual o veterano político confeccionou um acordo marco que, segundo fontes conhecedoras do processo, pede a Israel que reconheça, com base nas fronteiras prévias à guerra de 1967 levemente modificadas, a Palestina e a essa que admita a existência de um Estado judeu com direito a defender suas fronteiras, com a garantia do fim declarado do conflito.
Kerry estabeleceu como objetivo que haja um acordo final com uma assinatura histórica do nível da que houve na Casa Branca em 1993, com Yasser Arafat e Yitzhak Rabin. Tantos foram os seus esforços e suas conversas com líderes israelenses e palestinos que ambos os lados admitem em voz baixa que o mediador parece querer mais um acordo que as próprias partes em conflito. Por enquanto, conseguiu grandes concessões. O governo israelense está liberando em lotes 104 prisioneiros palestinos, em sua imensa maioria condenados por ataques com vítimas antes da assinatura dos acordos de Oslo em 1993. A Autoridade Palestina aceitou não recorrer unilateralmente às instituições internacionais --entre as quais o Tribunal Penal de Haia-- até que expire o prazo da negociação, no dia 29 de abril. Há, entretanto, grande resistência em aceitar mais concessões. Netanyahu, reeleito há um ano, enfrenta a resistência dos setores mais à direita da sua coalizão.
"Se em 2013 houve algo que marcou uma diferença, foram os esforços de John Kerry, seu inquebrantável compromisso com a paz. Já deixei de contar as vezes em que ele se reuniu com o presidente Abbas e a quantos lugares nos pediu que fôssemos para fazer reuniões", admitia recentemente numa conversa com jornalistas o negociador palestino Saeb Erekat. Na Organização para a Libertação da Palestina (OLP), entretanto, Kerry é visto como muito solitário nessa tarefa, com a resistência de uma grande parte dos governantes israelenses. Alguns ministros e legisladores, sobretudo os do partido ultra-direitista Casa Judaica (Habait Hayehudi), fizeram circular propostas para expandir as colônias na região palestina e inclusive para anexar o Vale do Jordão, na fronteira com a Jordânia, coisa que enclausuraria o estado Palestino num anel israelense. Em seu balanço de final de ano, a OLP estima que em 2013 morreram 56 palestinos em operações israelenses e que 85 casas foram demolidas.
Entre os colonos, as frequentes visitas de Kerry causaram um grande ressentimento. Na segunda-feira, desconhecidos incendiaram carros palestinos em uma vila perto da colônia de Beit El, depois de picharem nas paredes "Lembranças a John Kerry, haverá mais" e "se derramará sangue por Judeia e Samaria", empregando o nome bíblico da Cisjordânia. Depois das concessões para liberar os presos palestinos, Netanyahu parece ter se visto obrigado a tomar outras medidas menos conciliatórias, como o iminente anúncio de aprovar 1.400 novas moradias em assentamentos em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia. Segundo informou ontem o jornal Haaretz, elas serão licitadas depois da partida de Kerry, para evitar a reprovação que já se viu em 2010, quando foram autorizados 1.600 novos lares na zona ocupada durante uma visita do vice-presidente norte-americano Joe Biden.
Kerry quer agora assentar as bases para um acordo definitivo conseguindo uma prorrogação do prazo para negociar. Seu objetivo é o de que haja paz antes do final do segundo mandato de Barack Obama e, se não houver, que não seja por falta de empenho norte-americano. Para isso, avaliou várias opções, inclusive a de a Casa Branca oferecer unilateralmente um acordo próprio que seria subscrito ou rejeitado --por sua conta e risco-- por israelenses e palestinos. Seu acordo marco inclui todos os pontos de atrito. Sobretudo, a modificação das fronteiras de 1967 com intercâmbio de territórios. Israel anexaria os blocos de assentamentos e a futura Palestina receberia zonas habitadas por maioria árabe. Também pede aos palestinos que aceitem uma presença militar israelense no Vale do Jordão durante um período de tempo considerável depois da possível assinatura da paz. São pontos onde há mais desacordo do que consenso. Mas Kerry mostrou que não se amedronta diante de tamanho desafio.
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