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A história de nove cadáveres que ainda não estão mortos

Um perito externo vai sanar as dúvidas dos familiares do ‘Caso Heavens’ que se negam a recolher e dar por autênticos os restos de suas vítimas

Pablo de Llano Neira
Um cartaz com as fotos dos 12 desaparecidos em um 'after hours' na Cidade do México.
Um cartaz com as fotos dos 12 desaparecidos em um 'after hours' na Cidade do México.Ronaldo Schemidt (AFP)

Os cadáveres de nove das 13 vítimas do ‘Caso Heavens’, o sequestro e assassinato de um grupo de jovens em uma manhã de maio na saída de um after-hours na Cidade do México, estão há dois meses no necrotério sem que seus familiares aceitem reconhecê-los e deem por autênticos seus corpos. As famílias não confiam nas autoridades mexicanas e só levarão os corpos se peritos independentes os analisarem e confirmarem que são, realmente, dos seus. Nesta sexta-feira, a Promotoria da Cidade do México comunicou que está disposta a colaborar com este novo estudo, e a previsão das famílias é que dentro da primeira quinzena de dezembro chegue uma equipe de forenses argentina para realizar esse trabalho.

Os restos dos 13 jovens foram achados no dia 22 de agosto em uma vala comum de um bosque nos arredores da Cidade do México. De acordo com a hipótese da Promotoria, ainda por confirmar, o assassinato ocorreu devido a um conflito entre grupos de pequenos traficantes da capital. Até o momento, só três famílias recolheram e sepultaram os corpos de suas vítimas. As demais seguem esperando que os forenses estrangeiros lhes confirmem que são eles.

Na semana passada, amigos das vítimas organizaram um torneio de futebol amistoso em homenagem aos mortos. Nas arquibancadas do campo estavam algumas das mães dos jovens do ‘caso Heavens’. Eram duas da tarde, fazia sol e estavam assistindo à partida protegidas por sombrinhas.

María Vitória Barranco, mãe de Alan Omar Atiencia, uma das vítimas, disse que sente que seu filho está vivo. Segundo ela, quando uma pessoa falece, seu espírito se despede dos seus com algum sinal, e, por enquanto, ela não sentiu nada disso.

A mãe de Atiencia disse que está muito afetada pelo desaoarecimento de seu filho, mas que não deixou de trabalhar. “Como digo a Juanito, o show continua”. Juanito, 20 e poucos anos, é seu filho mais novo. María Vitória Barranco contou que o jovem está passando mal, e que há algumas semanas teve uma gripe e a febre subiu mais do que o normal. “O médico nos disse que era porque ele estava sanando todo o estresse”, explicou ela. Barranco afirmou que se o perito externo identificar seu filho, irá sepultá-lo.

Um fator que dificultou que as mães se convençam de que são seus filhos foi o mau estado dos corpos, que segundo as autoridades ficaram irreconhecíveis pelos danos que lhes causaram os assassinos e pelos quatro meses que estiveram enterrados na vala clandestina. No mesmo dia do torneio de futebol, Josefina García, a mãe da vítima Said Sánchez, contou o seguinte: “Não temos certeza de que sejam eles. Me mostraram fotos que são apenas de ossos”. E Leticia Ponce, a mãe de Jerzy Ortiz, a mais jovem das vítimas, 16 anos, disse: “Não sei se está vivo ou se está morto, mas o cadáver que me mostraram, sei que não é ele”. Ponce também assegurou que se os peritos estrangeiros identificarem os corpos, ela recolherá e enterrará a seu filho. Enquanto mantém sua esperança em recuperá-lo, ela se lembra dele o tempo todo, sobretudo na hora de comer. “Porque ele é esfomeado”, diz Ponce.

Além da perícia definitiva dos corpos, o ‘caso Heavens’, um fato criminoso de um calibre inusitado na Cidade do México, deixa pendente que se esclareça o motivo da matança. A Promotoria, com base em depoimentos de presos, sustenta que a morte dos 13 jovens foi uma vingança pelo assassinato de um jovem dois dias antes em outra discoteca. O tamanho da revanche, por sua desproporção, faz desconfiar desta hipótese. Outro ponto que contribui para acentuar as incógnitas sobre a razão que há por trás do massacre é a participação no operativo de três polícias locais.

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