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Ricardo Teixeira: “Lula não é nada. Diga o que você tem para mim”

Investigação da FIFA mostra que cartola da CBF menosprezou ex-presidente do Brasil. Para favorecer o Catar, teria recebido 5 milhões de reais em conta da filha de 10 anos

Teixeira e Lula, anunciando a Copa no Brasil, em 2007.
Teixeira e Lula, anunciando a Copa no Brasil, em 2007.Ricardo Stuckert (PR)

O escândalo de corrupção da FIFA arrasta-se em tribunais europeus e norte-americanos desde a prisão de sete cartolas, incluindo o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin, em março de 2015, na Suíça. Nesta terça-feira, a própria entidade máxima do futebol mundial incluiu um novo capítulo na trama ao divulgar a íntegra do Relatório García, documento elaborado pelo investigador independente norte-americano, Michael García, sobre suspeitas de corrupção envolvendo seus dirigentes. Com mais de 350 páginas, o relatório cita outro ex-mandatário da CBF, Ricardo Teixeira, que, de acordo com o documento, recebeu propina em negociações como membro do Comitê Executivo da FIFA.

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Um dos episódios detalhados no relatório remete a 14 de novembro de 2009, quando Lord David Triesman, executivo da Associação de Futebol da Inglaterra que conduzia a candidatura do país à sede da Copa do Mundo de 2018, encontrou Teixeira em um evento no Catar. Triesman revelou-se animado com o apoio público do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva à candidatura inglesa. Quatro dias depois do encontro, Inglaterra e Brasil anunciaram a assinatura de um memorando de cooperação, já que ambos receberiam edições dos Jogos Olímpicos de 2012 e 2016, respectivamente. Ao ouvir a declaração de otimismo do executivo inglês, Teixeira menosprezou a influência política de Lula no processo de escolha das sedes da Copa, que é conduzido pela FIFA, e deixou subentendido que poderia ceder seu voto à Inglaterra em troca de dinheiro. “Lula não é nada. Diga o que você tem para mim”, rebateu Teixeira, segundo o testemunho de Triesman.

Porém, o relatório aponta que, por causa do inglês “relativamente limitado” de Ricardo Teixeira, a frase “Diga o que você tem para mim” possui caráter ambíguo e pode ter sido mal interpretada por Triesman, que revelou desconforto com a abordagem indiscreta do então presidente da CBF. Todavia, o documento apresenta outras denúncias contra Teixeira, sobretudo em relação à suspeita de compra de votos para o Catar, que foi escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2022.

De acordo com o relatório de García, o Catar teria concedido uma série de benesses a Ricardo Teixeira para garantir o voto brasileiro no processo de escolha da sede, incluindo hospedagem de luxo no país, propina desviada de receitas de um amistoso da seleção brasileira com a Argentina – repassada por meio de empresas “laranja” e contas em paraísos fiscais – e o depósito de 2 milhões de libras (5,28 milhões de reais pela cotação da época) em uma conta em nome de sua filha de 10 anos. O responsável por enviar o dinheiro a Teixeira, ainda segundo o documento, teria sido Sandro Rosell, ex-presidente do Barcelona que foi preso na Espanha, em maio, sob diversas acusações de corrupção.

Padrinho do segundo casamento de Teixeira, a quem conhece desde meados dos anos 90, quando era diretor da Nike no Brasil, Rosell fechou patrocínio para o Barça com uma empresa do governo catariano em 2011. O acordo era gerido por Andreas Bleicher, alemão radicado no Catar e um dos assessores da candidatura do país pela Copa de 2022. Em depoimento a Michael García, Bleicher afirmou que o pagamento de Rosell a Teixeira não tinha relação com o Mundial, mas sim com um negócio entre ambos envolvendo a venda de um imóvel no Brasil.

Em 2011, a revista Piauí já havia revelado a proximidade entre Ricardo Teixeira e o catariano Mohamed Bin Hammam, que era presidente da Confederação Asiática de Futebol e candidato à presidência da FIFA. Em uma passagem descrita pela revista, a filha de Teixeira – apontada como beneficiária da suposta propina repassada por Rosell – revelava o apoio do pai a Bin Hamman, enquanto o dirigente brasileiro dizia publicamente que votaria em Joseph Blatter. Acusado de corrupção, o catariano desistiu da candidatura naquele mesmo ano e acabou banido do futebol pelo Comitê de Ética da FIFA, que, até a manhã desta terça-feira, vinha se recusando a divulgar o relatório de García. No entanto, diante da publicação de trechos do documento pelo jornal alemão Bild, a entidade se viu forçada a revelar a íntegra de seu conteúdo. A defesa de Teixeira afirma que o relatório é inconclusivo e nega as acusações contra ele, que evita viajar ao exterior para não correr o risco de ser extraditado para os Estados Unidos, onde foi indiciado por corrupção pelo FBI.

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