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Alain Juppé rejeita ser o candidato a presidência da França no lugar do conservador Fillon

Recusa de ex-primeiro-ministro amplia o risco de desastre eleitoral para os conservadores franceses

Carlos Yárnoz
Juppé, pouco antes do seu pronunciamento desta segunda.
Juppé, pouco antes do seu pronunciamento desta segunda.GEORGES GOBET (AFP)

O ex-primeiro-ministro Alain Juppé, atual prefeito de Bordeaux e apontado como substituto “natural” do fragilizado candidato François Fillon, recusou-se a assumir a candidatura dos conservadores à presidência da França – mas tampouco declarou apoio ao aspirante oficial. Ele se considera incapaz de unir a direita diante da “radicalização” promovida por Fillon, que se vê, por sua vez, como vítima de “um assassinato político”, num momento em que está prestes a se tonar réu por causa do pagamento de salários ilegais à sua mulher. O recuo de Juppé elimina a única opção da direita para evitar um anunciado desastre eleitoral na eleição de abril.

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Até domingo, Juppé parecia inclinado a aceitar a tarefa. Tinha inclusive buscado o apoio do ex-presidente Nicolas Sarkozy, o chefe da outra grande família dentro da formação conservadora. “Recebi apelos pela substituição. Eles me fizeram hesitar. Refleti”, afirmou.

Foi na noite do domingo que ele concluiu que não seria capaz de unir o partido. Percebeu isso após observar as imagens do comício convocado por Fillon em Paris e escutar seu discurso e posteriores declarações na emissora France 2. O candidato eleito nas primárias conservadoras do final de 2016 se encastelou e rejeitou a renúncia – condição indispensável para que Juppé aceitasse o desafio.

“Ninguém pode me impedir de ser candidato. Fui designado democraticamente. Não é o partido que vai decidir; não será nos corredores que vão arranjar as coisas”, reiterou Fillon. Ele acrescentou que, nas primárias, o eleitorado conservador consagrou o seu “programa radical”, e não o de Juppé, mais moderado e centrista. Uma candidatura “improvisada”, sustentou Fillon, levaria ao fracasso. “Não escutei Juppé dizer que é candidato”, desafiou.

A atitude imobilista e radical do Fillon – sua “obstinação”, nas palavras do prefeito de Bordeaux – foi avalizada pela presença de 40.000 simpatizantes vindos de toda a França para manifestar sua lealdade a um líder cambaleante, mas que se sentiu novamente legitimado. Muitos manifestantes diziam que, se Juppé fosse o novo candidato, não votariam nele.

Juppé entendeu que, se desse ouvido aos seus partidários, o cisma seria inevitável. “Uma parte do centro nos abandonou. O núcleo dos militantes dos Republicanos se radicalizou”, argumentou o ex-premiê nesta segunda-feira, acrescentando que não se vê atualmente em condições de obter “a unidade necessária ao redor de um projeto federalizante”. “É tarde demais.”

A crise, na verdade, se agrava com a retirada de Juppé, que não apresentou nenhum gesto de apoio a Fillon. Disse estar escandalizado com a violenta reação do candidato aos juízes que devem torná-lo réu na semana que vem e com a maneira pela qual, depois das primárias, dilapidou seu capital eleitoral – “Ele tinha uma avenida pela frente”, afirmou. Sobre a atual situação da direita, Juppé disse: “Que bagunça!”.

A iniciativa de Juppé deixa no ar outros lances previstos para esta segunda-feira. Sarkozy, ativo e ressuscitado politicamente com esta crise, havia proposto uma reunião com Fillon e Juppé “para encontrar uma saída digna e factível para uma situação que não pode se prolongar”. Durante a tarde está prevista também uma reunião de urgência da cúpula partidária “para avaliar a situação”.

Uma renúncia de Fillon está cada vez mais distante, sobretudo porque faltam apenas 11 dias para a apresentação das candidaturas, e, portanto, a margem de manobra dos Republicanos é praticamente nula após o gesto de Juppé. O teimoso candidato segue o seu caminho apesar da avalanche de recriminações públicas entre colaboradores e dirigentes.

Entre os que o abandonaram estão seu chefe de campanha, seu tesoureiro e seu porta-voz. O recuo de Juppé os deixa órfãos, mas eles ainda não abriram mão de encontrar uma alternativa ao obstinado Fillon, já transformado no líder da ala mais dura dos Republicanos.

As pesquisas indicam que a direita tradicional será eliminada no primeiro turno da eleição presidencial, em 23 de abril, algo inédito na França. Se o país já tinha duas esquerdas inconciliáveis, agora enfrenta a mesma situação entre suas facções conservadoras. Por isso, nem a direita nem a esquerda tradicionais estarão no segundo turno das eleições presidenciais, em 7 de maio, segundo os institutos de pesquisa. Um cataclismo no país.

O mais beneficiado, novamente, acaba sendo o ex-ministro reformista Emmanuel Macron, que se fortalece como favorito ao cargo. A chegada de Juppé o teria privado de apoios centristas. Agora, ele é o único capaz de se apresentar aos franceses como o candidato capaz de derrotar a extrema direita, presentada pela Frente Nacional de Marine Le Pen.

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