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Cristina Kirchner insinua que a Justiça a persegue por ser opositora

No Twitter, a ex-presidenta argentina criticou o juiz que a processou por associação ilícita

Federico Rivas Molina
Cristina Kirchner em Buenos Aires no final de outubro.
Cristina Kirchner em Buenos Aires no final de outubro.MARCOS BRINDICCI (REUTERS)

A ex-presidenta argentina Cristina Kirchner lançou acusações contra o juiz que a processou. Com duras palavras nas redes sociais, Kirchner disse que o processo contra ela, iniciado por suposta associação ilícita com o objetivo de desviar contratos de obras públicas para uma firma de um empresário vinculado ao kirchnerismo, é na verdade uma perseguição política. “Associação ilícita foi a figura penal criada por governos de facto utilizada por todas as ditaduras para perseguir dirigentes opositores”, escreveu a ex-mandatária em sua conta do Twitter, criticando duramente o juiz Julián Ercolini, que a processou. A decisão do magistrado implica que ele considerou suficientes os argumentos dos promotores para julgar a ex-presidenta por corrupção.

O processo não é uma boa notícia para Kirchner: o juiz pode proibi-la de sair da Argentina e até mesmo decretar sua prisão preventiva, decisão que, se for tomada, teria um alto impacto político.

Ercolini também determinou um embargo de 666 milhões de dólares (2,1 bilhões de reais) contra a ex-mandatária. A quantia não sairá das contas bancarias de Kirchner, com uma fortuna declarada de 5 milhões de dólares (16,5 milhões de reais), mas dá uma ideia da dimensão do dinheiro envolvido na investigação. A reação de Kirchner foi imediata. “Agora diz que nossos governos constitucionais são associações ilícitas. Processará também os 46% e os 54% [dos eleitores] que votaram em nós em 2007 e 2011?”, indagou na rede social, onde tem 4,7 milhões de seguidores. Mas a ex-presidenta não foi a única a reagir, sobretudo porque não foi a única processada. A lista também inclui o ex-ministro de Planejamento Julio De Vido; Lázaro Báez, dono da empresa investigada e preso por suposta lavagem de dinheiro; e José López, ex-secretário de Obras Públicas, detido desde junho, quando a polícia o encontrou jogando sacolas cheias de dólares para o interior de um convento.

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De Vido foi um dos homens mais poderosos do kirchnerismo, o único que se transformou em ministro com a ascensão de Néstor Kirchner, em 2003, e se manteve até o último dia da gestão de Cristina, em 10 de dezembro de 2015. Por seu escritório passaram todos os contratos de obras públicas do Governo. Em sua defesa, De Vido usou os mesmos argumentos que a ex-presidenta. “A decisão é sem dúvida uma resolução sob medida para a necessidade do [presidente Mauricio] Macri de encontrar uma desculpa que justifique a gigantesca crise econômica que atinge o país e a incapacidade de seu Governo em encontrar uma saída que não seja mais ajuste, mais desemprego e mais recessão”, disse De Vido num texto publicado no Facebook. “O objetivo central”, escreveu, “é proscrever Cristina Fernández de Kirchner no ano que vem [quando haverá eleições legislativas], em meio a uma perseguição política e judicial que sem precedentes em nossa história recente.”

A ação contra Kirchner é a primeira por corrupção que chega ao grau de indiciamento. Segundo os argumentos dos promotores, entre 2003 e 2015 foi montado “um plano criminoso” na Casa Rosada para favorecer a Austral Construcciones, beneficiada com contratos viários no valor de 3,3 bilhões de dólares (cerca de 11 bilhões de reais) na província patagônica de Santa Cruz, berço político do kirchnerismo. Uma auditoria da Vialidad Nacional [autarquia responsável por manter e ampliar a rede de estradas na Argentina] realizada meses atrás determinou que houve pagamento de sobrepreços totalizando cerca de 1 bilhão de dólares (3,27 bilhões de reais).

Os contratos a favor da Austral Construcciones, graças aos quais o seu presidente, Lázaro Báez, deixou de ser um caixa de banco para se transformar em milionário em poucos anos, já tinham feito parte de uma denúncia por suposta associação ilícita apresentada em 2008 pela ex-candidata presidencial Elisa Carrió, hoje uma deputada de alto perfil aliada do Governo de Macri. “Essa é nossa causa! Vamos! Todos os anos que tivemos de esperar... a justiça começa a ser feita, é nossa causa”, comemorou Carrió no Twitter.

Cristina Kirchner está há pouco mais de um ano longe do poder e também de Buenos Aires, para onde viaja de sua casa em Río Gallegos, capital de Santa Cruz, quando algum juiz pede sua presença no tribunal. A distância e os quatro processos que enfrenta, contudo, não impedem que ela mantenha viva a sua influência. Tanto que uma prisão poderia ter consequências políticas imprevisíveis.

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