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“Pedimos que ele se entregasse, fosse culpado ou não”, diz irmão do suspeito de ataque em Berlim

Mãe e irmãos de Anis Amri explicam em sua casa em Ueslatia (Tunísia) que ele virou religioso quando estava na prisão na Itália

A mãe e os irmãos de Anis Amri, suspeito do atentado de Berlim, em sua casa de Ueslatia (Tunísia), na quinta-feira.
A mãe e os irmãos de Anis Amri, suspeito do atentado de Berlim, em sua casa de Ueslatia (Tunísia), na quinta-feira.MOHAMED MESSARA (EFE)

Com o rosto triste, mas com amabilidade, Amri Walid recebe na porta de sua casa os vários jornalistas que foram chegando ao longo do dia. Não se surpreende, já que seu irmão Anis era o homem mais procurado da Europa depois que a polícia alemã afirmou que ele era o principal suspeito de ter cometido o atentado ocorrido na segunda-feira passada contra um mercado de Natal em Berlim, que resultou na morte de 12 pessoas. “A família pedia que se entregasse, fosse culpado ou não. Se fosse inocente, poderia provar. Caso contrário, deveria assumir a responsabilidade pelo que fez”, diz o jovem motorista, usando um boné e uma jaqueta preta. Anis Amri foi morto nesta sexta-feira em Milão durante um tiroteio com a polícia italiana, que o havia abordado numa operação de rotina.

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Depois de perguntar pela nacionalidade e o meio de comunicação dos repórteres, Walid convidou a entrar na casa da família, uma construção humilde, com um corredor externo ligando os quatro dormitórios. A rua é de terra batida, como a maioria de Ueslatia, uma cidade agrícola situada no marginalizado coração da Tunísia. Em uma sala de estar com paredes nuas e equipada apenas com dois sofás e uma mesa, lentamente vão se reunindo vários membros da família. Após o divórcio dos pais, aqui vive a mãe, Nour al Houda, e duas de suas filhas. O resto de seus nove filhos, quatro rapazes e cinco garotas, emigraram para a cidade em busca de trabalho. Uma ovelha bale muito próximo, provavelmente do quintal.

“A última vez que tinha falado com Anis foi no domingo passado, um dia antes do atentado. E não notei nada de estranho nele. Perguntou sobre a família, e essas coisas. Falávamos com frequência”, explica Nour, uma mulher enrugada, que parece mais velha do que seus 60 anos de idade. Desde então, tentaram ligar várias vezes para ele, mas o celular estava sempre desligado, e não dava sinais de vida através de sua página no Facebook.

A família está em estado de choque profundo, e não podia acreditar nas informações do Governo alemão que descreviam Anis como um “perigoso terrorista”. “Ele sempre foi uma pessoa alegre, com senso de humor, que amava a vida”, diz Saida, uma de suas irmãs. “Por que deixaria seu documento debaixo do assento do caminhão? E se era tão perigoso, por que não o detiveram? Tudo é muito estranho”, revela de repente.

Em uma trágica ironia do destino, um dia que devia ser de alegria para a família, se transformou em um pesadelo. Exatamente na quarta-feira, Anis faria 24 anos, e queria que fosse seu último aniversário longe da família depois de ter emigrado ilegalmente para a Itália em março de 2011. “Se foi ele, trouxe vergonha para a família e para o país” diz Walid, 30 anos. Suas irmãs assentem cabisbaixas. “Lamentamos o que aconteceu. É terrível. Queremos oferecer nossas condolências às famílias das vítimas e ao povo alemão. Nós não justificamos de forma alguma algo assim”, acrescenta Walid, enquanto duas lágrimas começam a percorrer lentamente o rosto magro.

De acordo com a família, o suposto autor do massacre nunca se interessou por política ou expressou algum sinal de ter abraçado uma ideologia extremista. “Quando ainda vivia aqui, não rezava, bebia álcool e gostava de música. Quando esteve na prisão na Itália, começou a rezar. Talvez tenha se radicalizado ali”, lembra Saida. “As notícias nos surpreenderam muito. Por exemplo, falava com a irmã que não usa o hijab, e nunca tentou convencê-la. Além disso, continuava em contato com alguns dos seus amigos que são policiais e soldados”, acrescenta Walid.

Embora Ueslati não seja um reduto islamista tradicional, meses depois da Revolução (iniciada em dezembro de 2010), um grupo salafista usou sua mesquita principal e começou a recrutar garotos para enviá-los para lutar na Síria ou Líbia. “Muitos jovens foram, não sei quantos, mais de 30”, comenta Atef, um rapaz de 20 anos. Alguns anos depois, o imã salafista foi preso e a polícia fechou temporariamente a mesquita. De acordo com um relatório da ONU, saíram da Tunísia cerca de 5.000 jovens que se integraram a organizações extremistas no Levante ou Líbia, o que o transforma no maior país exportador de jihadistas.

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