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Pacote anticorrupção passa sem anistia ao caixa 2, mas com punição a juízes

Apenas um parlamentar votou contra o projeto do Ministério Público (MPF) na primeira votação na Câmara

O plenário da Câmara nesta terça-feira.
O plenário da Câmara nesta terça-feira.Luis Macedo (Câmara)

A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quarta-feira, em primeira votação, o pacote de medidas anticorrupção sugerido pelo Ministério Público Federal (MPF) por meio de um projeto de iniciativa popular. Tratado inicialmente como as Dez Medidas Contra a Corrupção, o texto principal aprovado terminou com 12 ações. A votação final foi de 450 a favor, um contrário e três abstenções. O único voto contra foi o deputado Zé Geraldo (PT-PA).

O principal ponto que ameaçava a futura lei era uma emenda que anistiaria o crime de caixa 2 – que é a doação oculta e ilegal de recursos para campanha eleitoral. Se aprovada, ela poderia beneficiar principalmente políticos investigados pela Operação Lava Jato. Ao se verem acuados diante da reação popular que era contrária a esse perdão, os presidentes das duas casas legislativas, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) firmaram um acordo com o presidente da República, Michel Temer (PMDB), para impedir a aprovação dessa anistia.

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Temer chamou esse acordo de “ajustamento institucional” que atenderia aos anseios das ruas. Na semana passada, quando o texto seria votado de maneira célere, houve uma grande comoção social nas redes sociais e ocorreram alguns protestos em grandes cidades. O anúncio desse acordo ocorreu no domingo passado. O presidente ameaçou vetar essa medida caso ela fosse aprovada pelo Legislativo.

Entre a noite de terça-feira e a madrugada de quarta-feira, todos os partidos orientaram suas bancadas a votarem a favor do projeto principal do pacote anticorrupção. Um total de 16 emendas (alterações) apresentadas por parlamentares foram analisadas ainda durante a madrugada e alteraram  pontos sensíveis do projeto. Todas foram rejeitadas pelo relator da proposta na comissão especial, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), mas a maioria acabou sendo aprovada pelo plenário.

A principal das emendas, aprovada pelo plenário e sugerida pela bancada do PDT previa a punição de juízes e membros do Ministério Público por conta de sua atuação em processos. Inicialmente essa penalização dos representantes do Judiciário constava do relatório do deputado Lorenzoni. Após uma pressão feita por procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná, o relator alterou o seu entendimento e retirou essa pena.

“Antes, o deputado Onyx achava que valia igualar os juízes e promotores com os demais cidadãos. Depois que esteve com o pessoal de Curitiba, mudou seu juízo. Nós não mudamos o que pensamos, por isso sugerimos essa mudança”, explicou o líder do PDT, Weverton Rocha (MA).  "Temos de entender que todos são iguais perante a lei", declarou o deputado João Campos (PRB-GO).

Lorenzoni sugeriu que não era o momento de fazer essa discussão exatamente quando o país acelera uma série de investigações. “É difícil ouvir a razão, o equilíbrio e o bom senso e a forma verdadeira de se coibir a corrupção política no Brasil”, discursou o relator sob vaias. “Vamos começar um processo de desconstrução e destruição daquilo que tem sido bem feito. É uma ameaça ao que está dando certo”.

Um dos argumentos de Lorenzoni era de que essa questão fosse debatida no projeto de lei que tramita no Legislativo que trata especificamente de crimes funcionais de magistrados e procuradores. Essa proposta mudaria a lei que trata da improbidade administrativa. Não foi ouvido. Essa emenda acabou aprovada por 313 votos a favor, 132 contrários e 5 abstenções.

Pela emenda aprovada, os promotores e procuradores poderão responder pelo crime de abuso de autoridade caso instaurem “procedimento sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito”. O representante do Ministério Público também corre o risco de ter de indenizar quem for denunciado por ele. Seria uma reparação por "danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado”. Nesse caso, os legisladores atuaram em causa própria. Era comum ver deputados reclamarem no plenário de que, mesmo setem terem sido julgados, acabaram com a imagem "suja" por conta de processos que teriam sido abertos, sem embasamento jurídico.

Por meio de seu Twitter, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol. "Está sendo aprovada a lei da intimidação contra promotores, juízes e grandes investigações".

Com relação aos juízes, eles podem ser enquadrados em oito situações. A principal delas é no caso de ele se “expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento”. Caso isso ocorra, ele pode pegar de seis meses a dois anos de prisão em caso de condenação.

Desfigurado

No fim da votação, por volta das 4h20 de quarta-feira, boa parte do projeto havia sido desfigurado. Da proposta original, os deputados retiraram, por exemplo, a medida que previa a punição aos partidos políticos pela prática de caixa 2, acabaram com a figura do "reportante do bem" (que era uma espécie de ajuda financeira a quem delatasse crimes dos quais não participou), reduziram o poder do Ministério Público junto aos acordos leniência e não aprovaram a tipificação do enriquecimento ilícito.

Dessa maneira, da proposta final ficou assim: o crime de corrupção se tornou hediondo se envolver valores superiores a 10.000 salários mínimos, foi tipificado o delito de caixa 2 eleitoral, os tribunais de Justiça terão de ser mais transparentes na divulgação de dados processuais e haverá uma limitação de recursos para evitar a protelação de processos.

Quando as votações acabaram, o relator Lorenzoni desabafou: "O objetivo inicial do pacote era combater a impunidade, mas isso não vai acontecer porque as principais ferramentas foram afastadas. O combate à corrupção vai ficar fragilizado. E com um agravante, que foi essa intimidação dos investigadores".

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