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Planalto e aliados trabalham para conter ‘risco Cunha’ um dia após prisão

Mensagem da gestão Temer é a de que detenção não afetará aprovações no Congresso

Policiais conduzem Cunha para o IML de Curitiba.
Policiais conduzem Cunha para o IML de Curitiba.HEULER ANDREY (AFP)

No dia seguinte à prisão do ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os políticos em Brasília querem se descolar do ex-poderoso presidente da Câmara. A ordem não escrita, entre ex-aliados e no Planalto, comandado por correligionários do parlamentar cassado, é trabalhar para enviar mensagem de tranquilidade e tentar conter o 'risco Cunha', cuja versão mais tóxica é a concretização de uma eventual delação premiada com esperado abalo no governismo. Nesta quinta-feira, o porta-voz do presidente Michel Temer, Alexandre Parola, se negou a responder diretamente às perguntas a ele endereçadas sobre o tema - especificamente, se prisão de Cunha poderia causar danos à gestão de Temer e se ela teria algum impacto na votação em segundo turno, na semana que vem, da PEC 241, que cria um teto de gastos públicos.

As respostas foram vagas na seara política, mas o objetivo era enviar um sinal ao mercado e os apoiadores do Governo entre empresários e investidores: independentemente da crise política, o Planalto quer ver saneada a econômica e os novos desdobramentos não vão atrapalhar o curso dos planos. Primeiro, o porta-voz afirmou que a “Operação Lava Jato é da alçada da Justiça e o Executivo jamais interferirá em suas decisões”. Depois disse que a “agenda política de recuperação e reconstrução do Brasil não se confundem com as investigações levadas adiante pela Justiça”. Por fim, disse que “o Governo do presidente Michel Temer, com o apoio do Senado e da Câmara, seguirá firme com as defesas do crescimento econômico e da recuperação do emprego”.

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O posicionamento oficial difere do adotado nos bastidores. Neles, é evidente uma preocupação dos ministros e outros auxiliares de que Cunha tem capacidade de, se quiser, abalar a república pela segunda vez – a primeira foi quando, na presidência da Câmara, aceitou o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT). “Claro que estamos todos preocupados. Ele era do mesmo partido do presidente e conhece Brasília na palma da mão. Por mais que, em algum momento ele minta sobre alguém, até se provar o contrário o estrago já foi feito”, disse um ministro à reportagem.

A proximidade entre Cunha e Temer ficou mais evidente quando o senador Romero Jucá (PMDB-RR) foi flagrado em um grampo dizendo que “Michel é Eduardo Cunha”. Jucá era um dos homens fortes do Governo Temer e estava na primeira leva de ministros dele que foram defenestrados justamente por serem alvo de investigação policial.

Falsa normalidade

Visto como um exímio manipulador, Cunha conhece a fundo a política brasileira, por onde transita desde o fim da década de 1980. Apoiador e tesoureiro da exitosa campanha presidencial de Fernando Collor à presidência, o peemedebista presidiu a estatal de telefonia do Rio de Janeiro, TELERJ, e foi um dos principais arrecadadores de campanhas de dezenas de políticos nos anos seguintes. Até quando ele próprio se tornou um político, em 1998, ele continuou obtendo financiamentos para outros colegas. Hoje, é visto como um arquivo-vivo.

Sua habilidade de articulador o fez com que conseguisse se tornar líder do PMDB na Câmara e, antes mesmo de chegar à presidência da Câmara, colocou aliados em postos chaves em comissões internas e em CPIs (comissões parlamentares de inquérito). Foi ele quem organizou o centrão, um grupo de deputados de centro-direita de diversos partidos que remavam conforme a maré da política. Esse grupo, no entanto, o abandonou nos últimos meses o que fez com que ele fosse cassado do cargo de deputado em setembro passado.

Após esse abandono coletivo, os antigos aliados chegaram ao consenso de que o ideal é acelerar as votações consideradas primordiais para o Governo Temer com o objetivo de dar um sinal de normalidade no Legislativo, apesar da prisão de Eduardo Cunha e evidente temor de que ele faça uma delação premiada. As lideranças dos principais partidos governistas se reuniram na manhã desta quinta-feira e decidiram afinar o discurso.

Os principais difusores das teses do grupo disseram que não há razões para se temer nada. “Se tem preocupação [com o que Cunha pode delatar], que cada um fique com a sua. Não tem o que fazer, a não ser trabalhar”, disse Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). Na mesma linha seguiu o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a quem Cunha acusa de ter se beneficiado diretamente de sua queda por meio de seu sogro, o secretário Moreira Franco, do Programa de Parcerias de Investimentos. “Eu não recebi nenhum recado. E não tenho nenhum problema. A minha relação com o deputado Eduardo sempre foi política. Entendo a situação que ele vive, mas, do meu ponto de vista, ele pode falar tudo aquilo que ele entender que tem que falar”.

Seja como for, o fato é que o 'risco Cunha' já se faz sentir. Os últimos dois dias foram completamente improdutivos entre os deputados. Na quarta-feira, quando Cunha foi preso, a sessão que tinha um quórum superior a 400 deputados acabou interrompida depois que o foco dos discursos mudou dos projetos de lei em discussão para a detenção do peemedebista. Na quinta-feira, o quórum foi inferior a 300 parlamentares e nada foi votado novamente.

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