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Brasil mostrará o espírito da ‘gambiarra’ na cerimônia de abertura da Olimpíada

Organizadores vão destacar história do país e querem mandar mensagem sobre meio-ambiente

María Martín

Os brasileiros mostraram que não são muito bons para guardar segredos, e alguns detalhes e rumores sobre o que deveria ser a maior surpresa dos Jogos Olímpicos já circulam há alguns dias pela imprensa do país: já se especulou sobre se haverá um símbolo gigante da paz, se a modelo Gisele Bündchen sofrerá ou não um assalto, sobre se Pelé ou Gustavo Kuerten acenderão a pira olímpica… Mas, apesar de toda a indiscrição de quem viu os ensaios — o que obrigou a organização a fazer mudanças de última hora — o Brasil promete surpresas e a cerimônia de abertura mais legal da história recente dos Jogos. "Atenas foi clássica, Pequim teve uma demonstração de força, Londres foi inteligente, e a nossa vai ser cool", explicou o cineasta Fernando Meirelles, diretor-criativo do espetáculo. "É, sem dúvidas, o espetáculo mais cool em que já trabalhei", disse, usando a mesma palavra em inglês, o italiano Marco Balich, que participou das cerimônias de Sochi e Londres.

Fogos no ensaio da festa no Maracanã.
Fogos no ensaio da festa no Maracanã.Buda Mendes (Getty Images)

A história que o Brasil quer contar tem muito a ver com sua história de colônia, com sua música, sua diversidade, seu caráter alegre e sua natureza. Mas haverá uma tecla em que os organizadores baterão durante toda a cerimônia, com a intenção de que uma mensagem chegue às 3 bilhōes de pessoas que verão o espetáculo pela TV: é preciso deixar de maltratar o meio ambiente. "Outros países fazem suas cerimônias olhando para o próprio umbigo, mas nós estamos aqui para dar um recado ao mundo. Uma mensagem para o futuro", explicou Meirelles, diretor de Cidade de Deus, aclamado filme que retrata a vida em uma favela carioca.

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Mas haverá, sim, uma boa dose de orgulho nacional. O espetáculo vai reunir os maiores da cultura brasileira que participarão de graça na cerimônia. Entre eles, a atriz Fernanda Montenegro, que recitará um poema, Paulinho da Viola, que deve cantar o hino do Brasil, Elza Soares, Caetano Veloso e Gilberto Gil. O clássico, no entanto, se integrará com novos ídolos e as funkeiras Ludmila e Anitta, além de Wesley Safadão. "Fomos atrás de pessoas que a gente ama. Não existe uma música clássica e distante e uma música popular, aqui se mistura todo e isso vai estar representado nas nossas escolhas", explicou Daniela Thomas, um dos criadores da cerimônia.

A imaginação também será um dos destaques da produção que, dizem, é a cerimônia mais barata dos últimos tempos (o orçamento não foi divulgado). Os organizadores reconheceram que recorreram a lojas populares e definiram seu trabalho como uma espécie de MacGuyver, o personagem da série dos anos 1980 que conseguia transformar um chiclete em uma bomba. "Tínhamos um orçamento menor do que o que esperávamos, e por isso entramos nesse espírito de improviso e imaginação. Não tínhamos recursos para fazer, mas tínhamos de fazer", disse Thomas.

As vaias contra o presidente Michel Temer são dadas como certas. A imprensa revelou que os organizadores tentarão dissimular os possíveis gritos do público aumentando o volume da música, depois da intervenção protocolar de dez segundos, na qual Temer declarará abertos os Jogos – a organização nega. Não será uma surpresa, em um país dividido pela política e que tem a tradição de humilhar seus líderes nesse tipo de eventos. Em 2013, na Copa das Confederações, e 2014, na abertura da Copa do Mundo, a então presidenta Dilma Rousseff, que agora está afastada e enfrenta um processo de impeachment, foi vaiada e xingada por parte das arquibancadas. Nos Jogos Pan-Americanos de 2007, Luiz Inácio Lula da Silva, então com a popularidade em alta, foi tão vaiado que não pôde nem sequer terminar sua frase.

Com ou sem vaias, o espetáculo terá, curiosamente, uma mensagem contra o ódio. "A parte artística tentará comover as pessoas e deixá-las dançantes. Queremos que elas se perguntem por que odeiam umas às outras, por que maltratam suas cidades, por que brigam com o vizinho… Vamos convencê-las com a emoção do espetáculo", disse Thomas, entusiasmada. Parece que a organização acertou em cheio. Duas pessoas que viram um dos ensaios desta semana descreveram da mesma forma o que sentiram, saindo do estádio do Maracanã. "Voltei a ter orgulho de ser brasileiro".

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