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Editoriais
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Espanha, um país esgotado

Repetição das eleições gerais encontrará sociedade fatigada pela falta de soluções políticas

Salão do Congresso, durante homenagens do 4º centenário da morte de Cervantes.
Salão do Congresso, durante homenagens do 4º centenário da morte de Cervantes.Juan Carlos Hidalgo (EFE)

Contra o que ditavam a responsabilidade e o bom senso, as forças políticas da Espanha não dão sinal de tentar um esforço final para evitar a repetição das eleições, como provavelmente constatará o Rei na rodada de consultas que começará nesta segunda-feira com os dirigentes políticos. A situação leva os espanhóis às urnas por uma mistura de lideranças frágeis e interesses partidários, unida à falta de ambição em um projeto para o país. Se votar de novo fosse a chave para estabilizar a situação política, pelo menos haveria uma esperança, mas há poucos motivos para crer que a dinâmica acionada vá nessa direção.

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Em mais de quatro meses houve somente uma tentativa séria de formar um Governo. Esse único projeto, fruto do pacto entre o Partido Socialista (PSOE) e o Cidadãos, foi ferrenhamente combatido pelo Partido Popular (PP) e pelo Podemos, os grandes culpados, por sua atitude destrutiva, por ser necessário repetir as eleições gerais. O líder socialista Pedro Sánchez, no páreo até os debates de investidura, sumiu do primeiro plano, e ninguém mais voltou a tentar outro acordo, e menos que todos, o atual presidente Mariano Rajoy. Desde a votação fracassada de Sánchez teve início uma sucessão de impasses, falsas largadas e nenhum avanço. É de se supor que o presidente em exercício não cairá na tentação de oferecer um acordo de última hora, para continuar no poder, depois de ter se limitado a ver o que vinha.

A provável convocação às urnas encontrará a sociedade cansada, aborrecida e fatigada. O grau de confiança na situação política é notavelmente baixo, a julgar pelas pesquisas. Quase todo o ano de 2015 foi consumido em campanhas eleitorais de alcances diversos — autonômico, municipal, estadual — antes de entrar em outro grande compasso de espera em 2016. Exceto se houver grandes surpresas, não há perspectiva que não a de organizar uma nova campanha eleitoral e prolongar a interinidade até o verão europeu. Muito tempo para uma condição razoável de estabilidade, e mais ainda para um país pressionado por problemas e fraturas muito urgentes. Nem sequer há garantia de que será aprovado o próximo Orçamento do Estado — ação vedada legalmente ao Governo em exercício —, e fica mais distante o horizonte da reforma da Constituição, mal evocada até pelos socialistas, antes seus grandes defensores.

Partidos chegam desgastados, e as instituições, em crise

Os problemas não podem ser eternamente suportados. Nas palavras de Jean Monnet, um dos pais do que hoje é a União Europeia, “nada é possível sem as pessoas, mas nada é duradouro sem as instituições”. Esgotada pela crise de confiança provocada por tantos anos de problemas econômicos, a Espanha enfrenta também uma crise institucional. Os maiores partidos chegam meio abatidos à provável convocação das eleições. E o Governo em exercício se nega a cumprir os deveres básicos impostos pelo controle parlamentar.

O próprio Parlamento está cambaleante. O Senado não tem praticamente nada para fazer, e o Congresso perdeu a chance de mostrar que uma câmara sem maioria absoluta pode se tornar o centro da vida política. O novo Congresso tem matado o tempo com a tramitação de iniciativas que, como era de conhecimento dos deputados desde o primeiro momento, não teriam viabilidade em caso de interrupção da legislatura. Isso não foi obstáculo para propor desde a revogação da lei de melhora da educação até a redução da idade de voto para 16 anos, ou a bateria de medidas sociais incluídas na chamada lei 25. Com essas tentativas se distraíram alguns grupos refratários a cumprir a primeira de suas obrigações, que era a de preparar a eleição de um presidente do Governo, tarefa constitucionalmente tão vital para o Congresso que seu descumprimento conduz à iminente dissolução do Parlamento.

Congresso perde a chance de mostrar o que pode ser feito sem a maioria absoluta

Se for preciso votar novamente, terá sido perdido mais de um ano sem se fazer nada em relação ao prolongamento dos altos níveis de desemprego e de emprego precário nem às reformas paradas por falta de impulso político, nem à irrelevância no exterior, nem à deterioração da confiança pela Europa. O país vive simplesmente da renda de uma saída de crise econômica que, mal iniciada, já permite entrever o risco da contração do crescimento. Não há como não se alarmar diante da falta de pulso e de coragem representada pela impossibilidade de identificar um projeto capaz de tirar o país da crise.

As forças políticas que tentam polarizar e perturbar, em busca dos votos que não tiveram em 20 de dezembro do ano passado, merecerão uma taxativa desqualificação nas urnas. O mínimo que se pode esperar dos maiores partidos é que mantenham suficiente reserva de responsabilidade para resolver de imediato a formação de um Governo depois das eleições de 26 de junho — caso indispensáveis — e que ponham em marcha uma legislatura digna desse nome.

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