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Os trens fantasmas do metrô

Linha 5, segunda mais cheis de SP, tem trens parados por questões técnicas e atraso de novas estações

Trem pichado no pátio Capão Redondo, da Linha 5 - Lilás
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O primeiro dos 26 novos trens saiu da fábrica de Hortolândia, no interior de São Paulo, ainda em 2013. A ideia era que ele entrasse em operação na Linha 5 – Lilás, em 2014, data em que o Governo do Estado previa a entrega da extensão da linha que ligará as zonas sudoeste e sudeste da cidade. O prazo de conclusão das obras foi prorrogado diversas vezes – a nova data para conclusão total dos trabalhos agora é 2018 – e os novos trens continuaram a sair da fábrica. Hoje, das 26 composições, 16 foram entregues e estão estacionadas no Pátio Capão Redondo. Passados dois anos, nenhuma delas teve a oportunidade de transportar sequer um passageiro. Sem utilidade prática no cotidiano da população, por enquanto são verdadeiros trens fantasmas.

Fabricados pelo Consórcio Metropolitano, formado pela CAF da Espanha e do Brasil, os trens custaram 615 milhões de reais e ainda não entraram em operação por dois motivos. O primeiro é mais óbvio: enquanto a linha não cresce e novas estações não são entregues, não há espaço para as composições circularem. Atualmente, segundo o Metrô, a linha, com seis estações e 9,6 km de extensão, é atendida por oito trens antigos. O segundo motivo envolve o CBTC, uma tecnologia que é capaz de encurtar o intervalo de circulação entre trens e, desse modo, aumentar a eficiência do sistema como um todo. O problema é que os 26 novos trens foram programados para operar com a nova tecnologia, mas a linha ainda opera na antiga, o ATC.

Segundo funcionários do Metrô, atualmente os trens estão sujeitos à ação do tempo, oxidando e alguns já foram até pichados. Por meio de sua assessoria de imprensa, a empresa informou que tanto a linha, quanto os trens antigos estão sendo modernizados para operar no sistema CBTC e que uma série de testes deve começar a partir de março. A entrega do novo sistema – que juntamente com a expansão da linha possibilitará que os novos trens comecem a operar – está atrasada. “A Bombardier já foi notificada pelo atraso na implantação do sistema e pode ser multada em até 30 milhões de reais”, informou a assessoria.

Além disso, o Metrô ressalta que o processo de liberação dos trens é demorado, depende de uma série de testes e, por isso, dos 16 já entregues, apenas seis já estariam aptos para circular. De qualquer modo, pelos problemas de incompatibilidade de tecnologias e falta de espaço na linha, nenhum deles tem condições de atender à população neste momento. A empresa também ressalta que as pichações são atos isolados e que isso não significa que os trens estão sendo depredados.

Até pouco tempo atrás uma das linhas mais vazias da cidade, conhecida pelos paulistanos como um trajeto que ligava o nada ao lugar nenhum, hoje a Linha 5 – Lilás é a segunda mais cheia da cidade, transportando 6,1 passageiros por dia nos horários de pico. Por isso, a situação dos trens parados chama ainda mais atenção. Não à toa, o caso, como divulgou o jornal O Estado de S. Paulo, é alvo de um inquérito do Ministério Público Estadual (MPE) desde setembro de 2015. Segundo o promotor Marcelo Camargo Milani, o processo ainda está em fase de apuração, mas pretende esclarecer por que a licitação dos trens foi feita antes da obra de expansão da linha estar pronta. “É necessário avaliar o impacto econômico para os cofres e social para quem usa o sistema”, avalia Milani.

Problemas que se repetem

A Linha 5 – Lilás serve como uma ilustração de como o processo de planejamento da expansão da rede metroviária é estranho, avalia o urbanista Moreno Zaidan. Segundo ele, ainda na década de 1990 ela começou a ser construída pela CPTM, quando ainda era chamada de Linha G. Depois, nos anos 2000, foi transferida para o Metrô e, por isso, acabou ficando desconectada do resto da rede metroviária. Só foi em 2011, com a inauguração da Estação Pinheiros da Linha 4 – Amarela, que ela passou a oferecer uma ligação mais lógica com o sistema do Metrô a partir da Linha 15 – Esmeralda, na Marginal Pinheiros. Em 2010, as obras de expansão da linha, que permitirá conexões com a Linha 2 – Verde e a 1 – Azul, foram interrompidas por suspeita de fraude e formação de cartel entre as empresas que participaram da licitação.

Cada linha de metrô de São Paulo tem sua história e dramas próprios, mas algumas questões são comuns a todas elas. Atualmente, não há nenhuma obra metroviária da cidade que não esteja fora dos prazos inicialmente estimados. As explicações envolvem problemas técnicos, econômicos e de licitação. Por exemplo, assim como na Linha 5 – Lilás, cinco novos trens do monotrilho da Linha 15 – Prata também estão parados por falta de demanda. A linha, na zona leste de São Paulo, opera em apenas duas estações. Além disso, a implantação do CBTC tem se mostrado tecnicamente muito difícil. Na Linha 2 – Verde, o sistema começou a ser testado em 2011 e só recentemente passou a operar em todo o trajeto. Por enquanto, ela é o único trajeto que opera com o sistema.

Apesar da aposta em modernizar a tecnologia de trens e linhas com o CBTC, que segundo o Metrô possibilitará redução de 20% no intervalo entre os trens, só a inauguração de novas estações desafogará o sistema. “A Linha 5 tem um papel fundamental porque ela vai fechar mais um polígono dentro da rede, ou seja, vai possibilitar mais trocas e distribuição das viagens, porque se ligará à outras duas linhas da rede”, comenta o urbanista Moreno Zaidan. Ele avalia que sua extensão será responsável por levar um grande número de pessoas de áreas periféricas para locais mais centrais, com mais oferta de trabalho, como o bairro de Moema.

Almoxarifado

Além dos trens fantasmas, o Metrô, segundo reportagem da Folha de S. Paulo, convive com trens almoxarifados, apelidados assim porque estão sendo desmontados e servem atualmente como estoque de peças de reposição para outras composições do sistema. Para o Sindicato dos Metroviários, responsáveis por divulgar as fotos dos trens desmontados, isso vem acontecendo porque, depois do congelamento da verba repassada pelo Governo do Estado ao Metrô, a empresa teve que começar a economizar na compra de novas peças.

Segundo metroviários, trem em processo de desmonte.
Segundo metroviários, trem em processo de desmonte.

Os cinco trens em processo de desmonte são composições das frotas K, H e L - novas ou que foram modernizadas nos últimos anos. Segundo funcionários do Metrô, a retirada de janelas e portas, fechaduras, lâmpadas, faróis, bancos de passageiros e painéis da cabine se intensificou no começo deste ano.

À reportagem da Folha de S. Paulo, a assessoria de imprensa do Metrô disse que os trens citados estão passado por manutenção e que os metroviários estão manipulando e divulgando informações técnicas que não interferem na operação dos sistema ou na segurança dos usuários. O jornal, contudo, salienta que a assessoria não respondeu quando os trens voltariam a operar normalmente.

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