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Nordeste do Brasil vende em Madri o momento de investir

Região apresenta em fórum organizado por EL PAÍS suas possibilidades de negócio

Thiago Ferrer Morini
Da esquerda para a direita, o embaixador do Brasil na Espanha, Antonio Simões; o governador do Piauí, Wellington Dias; o executivo-chefe de EL PAÍS e executivo-chefe da Prisa Noticias, Manuel Mirat; o governador do Ceará, Camilo Santana, e o subdiretor de EL PAÍS, Luis Prados.
Da esquerda para a direita, o embaixador do Brasil na Espanha, Antonio Simões; o governador do Piauí, Wellington Dias; o executivo-chefe de EL PAÍS e executivo-chefe da Prisa Noticias, Manuel Mirat; o governador do Ceará, Camilo Santana, e o subdiretor de EL PAÍS, Luis Prados.Bernardo Perez (EL PAÍS)

O Nordeste do Brasil, historicamente a região mais pobre da nação sul-americana, cresceu durante a última década a um ritmo ainda mais acelerado que o restante do país. E a gravíssima crise econômica da nação (cujo PIB caiu 4,5% nos últimos 12 meses), mais que um freio ao investimento, há de ser um estímulo. Assim argumentaram nesta quinta-feira representantes da região e investidores durante o fórum O Nordeste do Brasil: infraestrutura e energias renováveis, organizado em Madri por EL PAÍS, com o patrocínio do Porto de Itaqui e os governos dos Estados do Ceará, Maranhão e Piauí.

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“Fala-se muito de nuvens negras”, afirmou Ted Lago, presidente do Porto de Itaqui, a poucos quilômetros de São Luís, a capital do Maranhão. “Mas fizemos uma mudança muito profunda, reduzimos os gastos em 40% e abrimos as portas a mais investidores.”

“Vejo a crise como uma crise mais política do que econômica”, afirmou Wellington Dias, governador do Estado do Piauí e membro do PT, o partido da presidenta Dilma Rousseff (que é alvo de um processo de impeachment iniciado — e temporariamente suspenso — no Congresso). “Mas com a democracia que temos vamos superá-la e voltaremos a crescer.”

Os principais pilares sobre os quais a região quer crescer são sua privilegiada posição geográfica (que lhe permite servir como saída para o mar — e, em consequência, os mercados internacionais — da enorme produção agrícola e mineral do interior do país), seu potencial agrícola (especialmente no chamado cinturão MATOPIBA [das siglas de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), que se estende da costa do Maranhão até Bom Jesus da Lapa (Bahia), milhões de hectares de terra fértil até agora sem explorar por falta de recursos hídricos) e seus grandes recursos de energia renovável (especialmente eólica e solar).

Governadores contra o impeachment de Dilma

Entre os presentes ao evento promovido por EL PAÍS em Madri estavam dois (Wellington Dias, do Piauí, e Camilo Santana, do Ceará) dos 16 governadores que assinaram uma "carta pela legalidade" em defesa do mandato da presidenta Dilma Rousseff, que enfrenta as pressões de um pedido de impeachment já aceito pelo presidente da Câmara.

No documento, os governadores dizem que “o processo de impeachment, aberto na última quarta-feira, (02/12), carece desta fundamentação. Não está configurado qualquer ato da presidenta da República que possa ser tipificado como crime de responsabilidade”. Segundo os líderes estaduais, a maior parte deles de Estados do Nordeste, "a história brasileira ressente-se das diversas rupturas autoritárias e golpes de estado que impediram a consolidação da nossa democracia de forma mais duradoura".

Os governadores de estados como Alagoas, Acre, Bahia e Santa Catarina finalizam a mensagem, que foi entregue à presidenta na terça-feira em cerimônia no Palácio do Planalto, conclamando "o país ao diálogo e à construção conjunta de alternativas para que o Brasil possa retomar o crescimento econômico com distribuição de renda".

Mas a má situação econômica mantém os investidores distantes. Para o representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional e ex-vice-presidente do Banco Mundial, Otaviano Canuto, “em princípios do ano sabíamos que estávamos diante de um quadro macroeconômico duro. Teríamos um ano de correção e ajustes, com a revisão da taxa de câmbio e a reversão de fortes políticas anticíclicas que tiveram menos resultados do que o esperado e geraram gastos”. Na avaliação de Canuto, uma parte desse processo terminou. “Não há nada de errado na agenda macroeconômica do Brasil”, argumentou. “A taxa de câmbio já está ajustada, o que se começa a notar na balança de pagamentos, e a reforma fiscal nunca esteve tão próxima”.

Crises e oportunidades

Mas tudo resultou muito pior do que o esperado. “No início do ano ninguém, absolutamente ninguém, esperava que a situação chegasse a esse ponto”, prosseguiu. Para Canuto, a Operação Lava Jato, a ação judicial que desvendou uma densa trama de corrupção que se estende da petroleira estatal Petrobras a políticos, funcionários públicos e empresas, e que enviou à prisão destacados diretores das principais construtoras do país, foi a responsável, ao “secar” o investimento privado, pela desconfiança, e ao criar uma crise política “cuja lógica foge à capacidade de um pobre economista”.

No entanto, o desastre pode ter, para Canuto, “um lado positivo”, pelo seu efeito na imagem internacional e nos futuros investimentos no país. “As instituições brasileiras foram submetidas ao maior teste de estresse possível”, afirmou, “e estão respondendo bem. A prevalência do Estado de direito melhora o prêmio jurídico do Brasil”. Mas não só isso. A bomba atômica que a Lava Jato representou devastou o mapa tradicional das construtoras brasileiras. “As estruturas do mercado estavam extremamente organizadas, e digo isso sem nenhum duplo sentido”, explicou. “Havia até algoritmos pelos quais essas empresas dividiam o mercado.”

A nova situação abre as portas a novos investidores, sobretudo estrangeiros. “Vai aumentar a concorrência no setor porque as barreiras de acesso serão reduzidas”, avaliou o diretor executivo do FMI. “As estruturas de custos e benefícios também mudaram.” Por fim, “vamos ter uma melhor relação entre o custo e os resultados porque todos os atores vão tomar mais cuidado na hora de aceitar ou oferecer subornos”, declarou. Para Canuto, demonstrações simbólicas de que a Justiça e o Estado de direito funcionam são fases pelas quais devem passar inevitavelmente os países que quiserem alcançar o status de economia desenvolvida. “No século XIX, os Estados Unidos tiveram que enfrentar os barões da ferrovia, os grandes oligarcas”, explicou. “França, Japão, todos tiveram momentos como esse.”

Em suma, os presentes defenderam que os fundamentos da economia brasileira em geral e do Nordeste em particular são tão sólidos que as empresas que entrarem agora na região constatarão que, tão logo a crise política passe, seu negócio encontrará um forte vento de popa. Diante da pergunta sobre se, neste momento de incerteza, convém investir antes dos demais, Julian Núñes, presidente da entidade do setor da construção Seopan e vice-presidente da Comissão de Relações Internacionais da CEOE, também patronal, deixou claro: “Sem dúvida”.

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