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Crise política
Tribuna
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Eduardo Cunha: definição de cínico

O senhor Cunha voltou a repetir nesta quinta-feira, após empurrar o Brasil para um abismo político, que o fez pelo bem do país

Cunha durante sessão para leitura de seu parecer sobre o impeachment.
Cunha durante sessão para leitura de seu parecer sobre o impeachment.Andressa Anholete (AFP)

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse que decidiu nesta quarta-feira — precisamente nesta quarta — desencadear o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff por razões técnicas (essa foi a expressão que usou).

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O senhor Eduardo Cunha, que tinha em sua gaveta dezenas de pedidos de impeachment há meses, decidiu colocar um em andamento ontem, duas horas depois — apenas duas horas depois — de ter ficado sabendo que os deputados do PT votarão contra ele na Comissão de Ética que vai julgá-lo.

O senhor Cunha afirma que nunca participou de negociatas ou negociações com terceiros, que nunca especulou com a possibilidade de que se os deputados petistas votassem a seu favor para se livrar da destituição ele não colocaria o impeachment da presidenta Dilma em andamento.

E acrescentou que tomou essa decisão pelo bem do país. Por justiça.

Mas o senhor Cunha não explica por que não decidiu aceitar o pedido de impeachment antes.

Um mês antes. Uma semana antes. Um dia antes. Até mesmo algumas horas antes, naquela manhã. Antes, em todo caso, que se soubesse como votariam esses deputados.

Os motivos jurídicos são os mesmos agora e há um mês, há uma semana. A justiça é a mesma. E o bem do país? O bem do país não era o mesmo antes? Só começou a ser inadiável esse mesmo bem do país duas horas depois de saber que esses deputados decisivos já tinham tomado posição?

O senhor Eduardo Cunha afirmou solenemente há meses, em uma comissão da Câmara que ele preside, que não possuía qualquer conta bancária no exterior.

O senhor Cunha, quando começaram a ser divulgados dados de suas contas na Suíça, alimentadas, de acordo com o Ministério Público, por subornos recebidos na Petrobras, disse que elas não eram suas.

O senhor Cunha, quando apareceu nos jornais a reprodução de seu passaporte e de sua foto entre os documentos dessas contas, o seu nome e o de sua mulher, disse que as contas estavam em seu nome mas que não eram suas, que ele era apenas o beneficiário vitalício delas.

Com essas contas, de mais de 5 milhões de dólares (aproximadamente 18,8 milhões de reais), o senhor Cunha — e sua mulher — pagaram, entre outras coisas, aulas de tênis em Miami e um Porsche de luxo. O Porsche do senhor Cunha, religioso evangélico, estava no nome de uma empresa chamada Jesus.com.

O senhor Cunha, ao abrir contas na Suíça, disse que não enviaram a correspondência ao seu escritório de presidente do Congresso, em Brasília, nem à sua casa no Rio de Janeiro, mas a um endereço postal nos EUA. Ao especificar o motivo, respondeu que o correio do Brasil não funcionava bem.

O senhor Cunha voltou a repetir nesta quinta-feira, depois de empurrar o Brasil para um abismo político imprevisível quando lhe pareceu mais oportuno, que o fez pelo bem do país. Pela justiça.

Definição de cínico: “Aplica-se a pessoas que mentem ou cometem atos vergonhosos com descaramento, sem se esconder ou sentir vergonha”.

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