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James Gulbrandsen | da NCH Capital

“Se Barbosa não detalhar planos, dá munição a ataques especulativos”

Levy era visto por investidores como um escudo de proteção da economia , diz investidor

Carla Jiménez

James Gulbrandsen, sócio gestor da NCH Capital, já leva um tempo no Brasil e não gosta muito quando estrangeiros que não conhecem o país falam mal daqui. Trabalhando com a gestão de recursos do exterior, tem conversas diárias com investidores do mundo todo. Até a semana passada, reconhecia o momento delicado na economia, mas tinha uma reserva de otimismo quase inabalável de que se trilhava o caminho para desatar os nós. Mas então caiu o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, na última sexta. E Gulbrandsen, natural dos Estados Unidos, balançou.

James Gulbrandsen, sócio gestor da NCH Capital
James Gulbrandsen, sócio gestor da NCH Capital

Para ele, Nelson Barbosa ainda é uma incógnita, algo muito perigoso para um momento vulnerável, que pode comprometer ainda mais o futuro. Não por acaso, o dólar subiu nesta segunda refletindo as dúvidas do mercado financeiro a respeito do novo titular da Fazenda.

Pergunta. Como você viu a mudança do ministro Joaquim Levy pelo Nelson Barbosa?

Resposta. Não era esperado que Levy saísse até um eventual impeachment. Surpreendeu a quase todos nós do mercado. Uma surpresa negativa. Acho que é tudo muito simples. Não tem investidor, estrangeiro ou local, que acredita em política econômica heterodoxa. Nunca funcionou, nem agora e nem nunca, em nenhum lugar do mundo O mercado ainda está tentando entender se Barbosa vai adotar postura heterodoxa ou não. Todos estamos tentando entender qual será a política enquanto essa crise acontece no Brasil.

P. Barbosa já disse em entrevista que ele quer aperfeiçoar a política e já fala em algumas reformas, como da Previdência. É insuficiente?

R. Ele fez esta manhã uma conference call com investidores. Ouvimos dele que há necessidade de ajuste fiscal, mas não temos detalhes. E os detalhes são fundamentais agora. O Brasil quase com certeza vai passar a ter inflação de 10% no ano que vem sem um ajuste fiscal relevante. A moeda está caindo mais, e isso reflete a falta de detalhes [dos planos de Barbosa]. O novo ministro poderia deixar claro o que ele vai mudar. Quais serão as áreas que vão ter menos gastos. Isso nos mantêm muito preocupados, especialmente sobre o quadro cambial, em um momento de economia fraca e sem o fim da crise política em Brasília. Sem clareza os hedge funds internacionais simplesmente podem atacar a moeda brasileira, como aconteceu em setembro. Isso leva a inflação para cima.

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P.  Isso tudo depois de rebaixamento de nota no Brasil

R. Sou normalmente muito otimista, mas não há nada para comemorar com o país esta semana. Só passando as festas com a família... O Brasil está em uma situação muito difícil. A única defesa que tinha até agora era a credibilidade do Levy com investidores estrangeiros. Especialmente dos Estados Unidos. Isso protegeu o país até aqui. Seria realmente necessário um novo ministro continuar com o trabalho que Levy fez, viagens ao exterior, encontros com grandes investidores, etc. Isso foi muito importante, e certamente a Standard&Poor's demorou a rebaixar o Brasil no início do ano por causa dele. Agora com certeza a Moody's também vai rebaixar.

P. Como o Brasil pode sofrer um novo ataque especulativo?

R. Quando os maiores hedge funds do mundo percebem alguma possibilidade de uma economia fraquejar eles testam seus governos, para ver a reação. Isso ficou claro em setembro, quando vários deles testaram as ações do Banco Central, e o dólar chegou a 4,30 reais. Depois voltou para 3,80. Minha preocupação é que isso aconteça de novo. Me preocupa a desvalorização que viria com um terceiro rebaixamento da Moody's, algo muito ruim para a inflação. Se Barbosa não detalhar seus planos, ele dá munição para um ataque especulativo.

P. A carga nos ombros do Nelson Barbosa é maior que a de Levy então...

R. Pode ser uma oportunidade para ele. Ouvimos que Levy tinha as ideias corretas, mas lhe faltavam pontes políticas. Mas que Barbosa as teria. Levy teve muita dificuldade em passar o ajuste fiscal. Com Barbosa, utilizando relações que ele tem com o Congresso, se passar metade do que Levy não conseguiu, então seria uma coisa boa. O que precisa é desfazer essa crise política.

P. Mas o PSDB já dá sinais de que vai desprestigiar Michel Temer [que assumiria em caso de impeachment de Dilma], demonstrando que a crise política ainda tem outras frentes, não?

R. Está claro que o objetivo do PSDB é cassar a chapa de Dilma e Temer. Acho que esse esforço de cassação vão resultar em outra presidência, no caso, Marina Silva. Ela ganha.

P. Como os estrangeiros estão olhando o Brasil neste momento de turbulência com a ameaça do impeachment?

R. O estrangeiro só quer resolução. Não há torcida por uma ou outra coisa, mas pela resolução. Ele não gosta de mudança de Governo em ano que não seja eleitoral. Porém, esta crise, com o país parado há tanto tempo, onde a política agrava a crise econômica, o estrangeiro quer que algo aconteça. Algo seja feito para que a crise política se debele. O gringo está procurando qualquer resolução, seja impeachment, renúncia ou paz, ou que a presidente fique, mas fique em paz com um novo acordo. A economia iria bem sem a crise política. As empresas na Bolsa mostravam isso.

P. Quais empresas na Bolsa estão bem, na sua avaliação, apesar da crise política?

R. Tem várias na bolsa, Itaúsa, Iguatemi, Fleury, Sulamérica. Se a economia brasileira estivesse tão mal, a Bolsa estaria muito mais baixa.

P. Como o estrangeiro enxerga a investigação da Lava Jato?

R. Enxerga o Brasil como uma cleptocracia, um país de bandidos, infelizmente. E isso é muito triste. Um investidor me perguntou se realmente as instituições funcionam aqui, se tem leis de fato. Comparei a crise brasileira com a crise da economia americana em 2008. Quantos CEOs forma para a cadeia? Nenhum. Enquanto aqui, [André] Esteves, [Marcelo] Odebrecht foram presos. Então, eu disse a ele que a percepção é de que este é um país de bandidos, mas a realidade é que o Sergio Moro está provando ao mundo que o Brasil não é. Que tem punição, que não depende de teu cargo.

P. Você tem uma leitura positiva da Lava Jato?

R. Totalmente. Eu sou americano. A grande verdade é que graças à operação Lava Jato e ao juiz Moro o futuro do Brasil será muito melhor do que o passado. O que está precificando é o passado. O futuro tem muito menos risco de impunidade e corrupção. Quando Esteves foi preso, eu pensei...“estão jogando muito a sério”. Essas prisões são muito importantes para provar que não tem impunidade aqui. Nos Estados Unidos não houve. Imagina James Dimon de JP Morgan na cadeia... é igual [ao caso de André Esteves]!

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