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Chefe do Banco Mundial: “Ajudar os pobres é positivo, mas com condições”

Sul-coreano Jim Yong Kim alerta contra a tentação de cortar orçamentos educacionais

Antonio Jiménez Barca
Jim Yong Kim
Jim Yong KimGeraldo Caso Bizama (AP)

Na América Latina, ao ritmo que cresce a desigualdade, há uma estatística nauseante: dentro de 10 anos, o 1% mais rico da população do continente terá mais patrimônio que os 51% mais pobres. São dados de um relatório da ONG Oxfam, cujo presidente, Juan Alberto Fuentes Knight, participou na quarta-feira de um debate sobre igualdade, oportunidades e prosperidade, durante a reunião anual do Fundo Monetário Internacional, em Lima (Peru). Antes das porcentagens de Fuentes, Jim Yong Kim, presidente do Banco Mundial, havia declarado que o objetivo declarado por sua instituição de erradicar a pobreza extrema do planeta até 2030 poderá ser obtido. Em 2012, os miseráveis representavam 12,8% da população mundial. Agora, a cifra caiu para 9%. A terceira participante da mesa-redonda, a costa-riquenha Rebeca Grynspan, secretária-geral ibero-americana da ONU, concordou sobre o prognóstico, mas com uma condição: “Para conseguir isso, é preciso reduzir a desigualdade”.

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Nem sempre esses dois conceitos – miséria e desigualdade – andam de mãos dadas. A respeito disso, Kim recordou o revelador exemplo chinês: “Na China, nos últimos anos, a desigualdade cresceu, mas o crescimento beneficiou a todos, incluindo os mais pobres. O desafio é conjugar crescimento e desigualdade”. Grynspan pediu a palavra para observar que precisamente na América Latina isso havia sido possível nos últimos anos, na década que vai de 2002 a 2012. Mas alertou: “Também é verdade que o excesso de desigualdade conduz ao excesso de pobreza, porque há grupos que se unem politicamente para proteger seus privilégios e não querem falar de redistribuição”.

Depois, o presidente do Banco Mundial pôs o dedo na ferida e advertiu para algo que, teme ele, poderá se transformar numa catástrofe latino-americana: “O retrocesso econômico não pode servir de desculpa para que os Governos deixem de investir em educação, em saúde ou em programas sociais”. Fuentes acrescentou que há na América Latina 200 milhões de pessoas que ele qualificou como “vulneráveis”, ou seja, suscetíveis de, à primeira sacudida macroeconômica, voltarem à extrema pobreza da qual saíram há alguns anos. “Por isso é importante continuar investindo em pessoas, como se disse aqui, em educação e em programas sociais. Nos bons tempos, quando as matérias-primas estavam a um bom preço e a China comprava muita coisa de nós, deveríamos ter feito mais redistribuição, mas não fizemos.” O presidente do Banco Mundial respondeu a uma pergunta também crucial feita pela moderadora, Patricia Janiot: “É bom e produtivo em longo prazo ajudar os mais pobres?”. Kim tinha a resposta clara desde o começo: “É bom auxiliar os pobres, desde que haja condições”. Entre elas, Kim citou a frequência das crianças à escola, uma contrapartida adotada, por exemplo, no programa brasileiro Bolsa Família. Para Kim, todos esses programas têm um efeito positivo não só na vida dos pobres, mas também no sistema econômico geral dos países que os realizam. “E além disso”, acrescentou Grynspan, “em sua grande maioria esse tipo de programas não acarreta muito gasto, apenas 1% do orçamento, mas, claro, para que deem certo antes é necessário haver escolas, é preciso colocar certas coisas em primeiro lugar”.

O presidente sul-coreano do Banco Mundial acrescentou que a oportunidade está nas mãos nos jovens, e que um país, qualquer país, não pode se permitir o luxo “de deixar que suas crianças não frequentem a escola, que não se desenvolvam”. Grynspan insistiu nessa tecla: “Dois terços dos universitários latino-americanos são a primeira geração de suas respectivas famílias que vão à universidade. Isto representa um progresso social enorme, mas precisamos dar oportunidades a esses universitários para que consigam alcançar um trabalho compatível com seus estudos”.

A última das perguntas era clara: o que a sociedade civil pode fazer para mudar as coisas? Grynspan acha que “é claro que elas podem mudar”, mas que para isso é necessário “que os jovens acreditem na política, que se envolvam na política, e assim as coisas mudarão”. Fuentes recordou que no seu país, a Guatemala, a sociedade civil forçou no mês passado o presidente Otto Pérez Molina a renunciar. E Kim concluiu: “Peço que não nos fixemos só no crescimento do PIB”.

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