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Coluna
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Os olhos do papa Francisco

É o primeiro Papa, dos sete que conheci, que confessa estar mais interessado no que uma pessoa faz pelos outros do que no número de vezes que vai à missa

Juan Arias
O papa Francisco na missa dominical no Vaticano.
O papa Francisco na missa dominical no Vaticano.ANGELO CARCONI (EFE)

Francisco foi o primeiro Papa que diante do drama dos refugiados fugindo do horror de seus países em guerra pediu que o Vaticano e todas as paróquias da Igreja abrissem suas portas a eles.

A teologia de Francisco é, na verdade, a da compaixão, que se esforça para se colocar no lugar do outro. Seus olhos observam mais com o coração do que com as leis e os dogmas. Quando está ao lado das pessoas, suas pupilas parecem se dilatar para observá-las melhor.

O olhar de Francisco é agudo para descobrir o sofrimento das pessoas mais do que seus tropeços. Ele se fixa principalmente nas cicatrizes que a vida deixa nas pessoas. São olhos mais de mãe do que de juiz. Com os homossexuais, os divorciados, com as mulheres que abortaram, com os teólogos excomungados. Até com as lágrimas do menino que chora a morte de seu cachorro, a quem garante que o encontrará no paraíso. E agora principalmente como calvário daqueles que são forçados a deixar sua terra fugindo do horror da perseguição, da fome e da morte.

Sua reprovação é contra a injustiça que os arrasta ao incerto, e contra o que chamou de “globalização da indiferença”. Aos refugiados, sem se preocupar com sua religião, pede o abraço e que se abram a eles as portas de casa.

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O olhar de Francisco chega a suspeitar que no coração das pessoas existe mais urgência de redenção e de felicidade do que confessamos. Que a humanidade, por vezes tão orgulhosa, é como um cristal fino que precisa de uma mão amiga para não se quebrar. E que pode ser mais solidária do que egoísta quando posta à prova.

Talvez por isso, ao seu lado ninguém se sente com medo ou em perigo. Seus olhos estão limpos de rancor, penetram nas rachaduras da alma, sabem intuir a carga de sofrimento que devem suportar os diferentes, os excomungados, os apátridas. Sua luta é para salvá-los dos restos de inquisição grudados na pele do legalismo.

“Aquele que estiver sem pecado, que atire a primeira pedra” é o seu slogan, o mesmo que Jesus usou para salvar a mulher adúltera.

É o primeiro Papa, dos sete que conheci, que confessa estar mais interessado no que uma pessoa faz pelos outros do que no número de vezes que vai à missa.

Custa-lhe condenar. Isso ele deixa para Deus. Ele prefere consolar, embora saiba ser duro com os poderes prevaricadores.

Francisco é o primeiro Papa que não prega que a Igreja Católica é a única depositária da salvação. Para ele, as religiões são como as faces de um poliedro, todas iguais e diferentes, nenhuma maior do que a outra. Parece dizer, com seus gestos de aproximação com outros credos, que ninguém tem o monopólio de Deus. Para ele não há crentes ou não crentes, apenas pessoas que sofrem e amam. E aqueles que mais sofrem são sempre os mais esquecidos e invisíveis.

O mundo, com suas tristes caravanas de refugiados à deriva, órfão de guias credíveis, está necessitando de olhares e gestos como os de Francisco para se sentir mais acolhido do que julgado. E mais amado.

Não quer ser chamado de Papa.

É só nosso irmão Francisco, que hoje nos interpela para que não fechemos os olhos para o drama que vivem os refugiados, que são os novos crucificados da História.

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