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Conservadores obtêm maioria absoluta nas eleições britânicas

Partido de Cameron obtém número de assentos necessário para controlar o Parlamento Derrota expressiva dos trabalhistas e tragédia para os liberais-democratas

David Cameron e sua mulher Samantha, nesta sexta-feira em Londres.Foto: reuters_live | Vídeo: Atlas / Bloomberg
Pablo Guimón

O Partido Conservador, do primeiro-ministro David Cameron, venceu as eleições realizadas na quinta-feira no Reino Unido, com uma força que ninguém esperava. Faltando poucos locais para encerrar a contagem dos votos, os tories (como são chamados os conservadores) já haviam conseguido 331 assentos no Parlamento britânico (de um total de 650 cadeiras), ou seja, a maioria absoluta, o que não era previsto por nenhuma das pesquisas de intenção de voto publicadas nos últimos dias.

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Os resultados provocaram a demissão, na manhã desta sexta-feira, dos líderes dos três partidos perdedores: o trabalhista Ed Miliband, o liberal-democrata Nick Clegg (atual vice-primeiro ministro) e Nigel Farage, do ultraconservador UKIP (sigla em inglês do Partido da Independência do Reino Unido).

O resultado pegou de surpresa a própria rainha Elizabeth II, que estava no palácio de Windsor. Ela teve que mudar seus planos de chegar hoje a Buckingham, onde se espera que nas próximas horas receba a visita do primeiro-ministro para informá-la de que está pronto para formar o Governo.

Os grandes derrotados destas eleições do Reino Unido são os trabalhistas e os liberais-democratas. Os primeiros, praticamente varridos do mapa político da Escócia, devem perder pelo menos 25 assentos, numa noite que seu líder, Ed Miliband, não hesitou em chamar de “muito difícil e desapontadora”. A dimensão da derrota fez com que ele anunciasse sua renúncia da liderança do partido nesta sexta-feira.

Maior é o colapso do Partido Liberal Democrata, do vice-primeiro-ministro Nick Clegg, que manteria apenas 8 das 57 vagas que obteve em 2010, numa noite “cruel e punitiva”, segundo seu líder, que também renunciou. Os centristas pagam um preço altíssimo por fazer parte de um Governo pela primeira vez em gerações. Ocuparão a metade dos assentos que conseguiram nas primeiras eleições que disputaram, em 1992. Pode acontecer, no entanto, que o partido repita a experiência de coalizão com os conservadores, caso eles decidam chamá-los para reforçar seu Governo. Mas a tremenda diferença de vagas em relação às eleições anteriores diminuiria seu peso nesse eventual Governo de coalizão.

Com o semblante vitorioso, Cameron prometeu que não decepcionará ninguém e que trabalhará para manter o país “unido”

Ambos perderam durante a noite os assentos de algumas das suas principais figuras. Por volta de 4h30 (hora de Brasília) terminava a apertada apuração em Morely and Outwood, que levou à saída do Parlamento de Ed Balls, porta-voz econômico dos trabalhistas e até ontem cotado para ser o próximo chancellor of the Exchequer (ministro da Fazenda). Seu rosto, ao ouvir a apuração que o deixava fora do Parlamento, desenhava o sentimento geral de um partido atônito perante a inesperada derrota. “Qualquer decepção pessoal por este resultado não é nada”, disse ele, “em comparação à sensação de dor que me causam os resultados do trabalhismo em todo o país”.

Também o veterano Jim Murphy, que dirige o partido desde o final do ano passado, perdeu seu assento em Westminster. “Fomos golpeados por dois nacionalismos: o escocês e o inglês, este último representado por David Cameron e sua mensagem de que um voto trabalhista era um voto no SNP”, afirmou às 7h15 (hora de Brasília). E o próprio Douglas Alexander, diretor da campanha trabalhista e porta-voz de Relações Exteriores da oposição, perdeu seu assento para uma jovem nacionalista de 20 anos, Mhairi Black, numa disputa que se tornou um símbolo da mudança ocorrida na Escócia. Por parte das liberais-democratas, perdem seus assentos até três membros do atual Governo de coalizão – Vince Cable, Danny Alexander e Ed Davey –, além do ex-dirigente partidário Charles Kennedy.

O resultado implica que o Reino Unido realizará antes do final de 2017 um referendo sobre a sua permanência na União Europeia, conforme prometeu o primeiro-ministro

A outra grande noticia desta jornada eleitoral – considerada pela imprensa em seu conjunto como a mais surpreendente desde 1945 – foi a esmagadora vitória do SNP de Nicola Sturgeon. A Escócia se transforma em uma região praticamente unipartidária, já que o Partido Nacionalista Escocês só não ficou com 3 das 59 vagas destinadas à região. Os trabalhistas, outrora majoritários ao norte da fronteira, elegeram só um deputado na Escócia. “Sabíamos que iríamos bem”, declarou Sturgeon, “mas eu nunca teria sonhado que conseguiríamos 56 dos 59 assentos escoceses”.

O resultado implica que o Reino Unido realizará antes do final de 2017 um referendo sobre a sua permanência na União Europeia, conforme prometeu o primeiro-ministro. Cameron precisará agora controlar as pressões dos setores mais eurófobos do seu partido se quiser manter o país na UE. O partido eurófobo e populista de direita UKIP, por sua vez, elegeu apenas um deputado, embora possa chegar a ser o terceiro partido mais votado, além de obter a segunda colocação em quase 90 distritos. Seu líder, Nigel Farage, uma figura onipresente na atualidade política britânica nos últimos anos, perdeu sua vaga em South Thanet para os conservadores. Farage havia anunciado que não continuaria liderando o partido se não se reelegesse deputado.

Cameron precisará também lidar com as pressões independentistas de uma Escócia que, depois de votar em setembro passado por permanecer no Reino Unido, abraçou agora majoritariamente o partido que defendia a secessão. Sturgeon admitiu à BBC que o resultado, embora surpreendente, não constitui a “mudança significativa” que, como ele havia antevisto, justificaria convocar uma nova consulta sobre a independência. “Insisto que o resultado das eleições não vai provocar um novo referendo”, esclareceu. “As pessoas devem respeitar o resultado na Escócia e fazer com que os escoceses se sintam parte de um Reino Unido forte”, declarou por sua vez o ministro da Fazenda, George Osborne. “Há planos para avançar na devolução de poderes à Escócia. Seria um erro não fazer isso.”

Os três principais líderes se pronunciaram ao terem suas reeleições confirmadas nos respectivos distritos. O tom dos pronunciamentos foi sem dúvida revelador. Clegg subiu ao palanque em Sheffield para admitir o “castigo” sofrido pelos liberais-democratas, apesar de o partido manter consigo a chave para um novo Governo de coalizão liderado pelos conservadores. Poucos minutos depois apareceu Miliband, em Doncaster, para admitir a “decepção” com resultados que não refletem a recuperação trabalhista indicada nas últimas pesquisas. Finalmente, com o semblante vitorioso, Cameron, em sua circunscrição de Oxfordshire, prometeu que não decepcionará ninguém e que trabalhará para manter o país “unido”.

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