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MEDO À LIBERDADE
Coluna
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Peru: esperando um líder

País é a nação latino-americana que teve o maior crescimento na região

Por isso, a incógnita do país, cujo nome significativamente parece porvir de um caudilho chamado Birú (um cacique indígena rico em ouro), não é seu desenvolvimento econômico, mas estabelecer sua identidade final. A batalha no Peru igualou o grau de crueldade entre espanhóis e incas. A Plaza de Armas de Cuzco demonstra por que o Império espanhol levou adiante, com um custo tão alto em vidas humanas, tantas obras em tão pouco tempo.

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Um dos maiores problemas que os peruanos têm é que, nem mesmo conhecendo toda a Lima, você chegará jamais a abarcar o Peru. Existe um Peru que está em Lima, em Miraflores, no Surco, em Barranco e em Callao. Existe um Peru que nunca terminou de se misturar – de todo – com sua população autóctone e os que acreditam que são o Peru, ou sejam, os limenhos.

Não há como esquecer que o Peru é Machu Picchu. O lugar é em si mesmo uma lição sobre a soberba humana e a crueldade infinita dos conquistadores porque, quando se pensa e se reflete como puderam levar essas pedras da Plaza Mayor até lá em cima, é possível ver também a trilha e os vales de sangue sobre as quais se construiu tudo aquilo.

Mas, além de uma forte personalidade, há os dirigentes históricos peruanos, como Alan García (cavalo louco), que no seu primeiro mandato tinha de ouvir constantemente “vai acabar, vai acabar” para dar a volta por cima e acabar fazendo a modernização, ou Fernando Belaúnde Terry, um dos poucos com paletó, ou os golpes de Estado que no Peru – não nos esqueçamos – costumam ser obra de generais de esquerda, como Juan Velasco Alvarado, que fez a primeira revolução.

Nem sequer conhecendo toda a Lima você jamais chegará a abraçar o Peru

No fundo, a história do Peru está pendente. Por isso, pode ter presidentes muito diferentes com a mesma legitimidade, ou ter a esperança depositada em Nadine Heredia, a mulher de Humala, como o passo seguinte.

Depois, há o Exército peruano, um dos mais profissionais que existem. É o mesmo Exército de Pantaleão e as Visitadoras, o mesmo que tem de administrar vários continentes ao mesmo tempo: o que vai ao Pacífico, ao Amazonas. Desde o mandato de Velasco Alvarado tem sido um Exército consciente de seu poder, mas que também soube que devia permitir aos civis que tivessem sua loucura. Fujimori nunca se foi porque, em certo sentido, com a suspensão das instituições, foi ele quem unificou o Peru, embora fosse sobre a base de criar outra ditadura perfeita. Aquele foi um tempo que lembra no subcontinente uma unidade para um povo que agora emerge como o fantasma, vez ou outra, e que pode devolver a Fujimori, antes de sua morte física, uma espécie de perpetuação histórica por meio de sua filha, Keiko.

A incógnita não é seu desenvolvimento econômico, mas estabelecer sua identidade final

Observe-se que a batalha no Peru não será mais entre um indígena (Alejando Toledo ou Ollanta Humala), já não será entre um jovem cavalo louco transformado em um bom político, chamado Alan García, mas a batalha é, pelo menos até agora, entre duas mulheres: uma de ascendência japonesa, outra peruana pura e finalmente, o técnico eficiente de sempre, o ex-ministro da Economia Pedro Pablo Kuczynski.

Como acontece com tantos elementos de riqueza cultural, o mundo onírico da criação, A Cidade e os Cachorros ou Conversa na Catedral continuam sendo um bom entreato da versão europeia do Peru.

Mas, ao mesmo tempo, não se deve esquecer que Ayacucho – origem do Sendero Luminoso – era o lugar onde a juventude limenha que não podia entrar na Universidade de Lima acabava fazendo cursos técnicos, e disso para o Sendero Luminoso faltava apenas um passo. O mais surpreendente do terrorismo do camarada Abimael Guzmán não era seu maoísmo, mas o fato de que, num salto histórico, da América à eternidade, toda sua cultura e todas as suas ações eram regidas pelo calendário lunar incaico.

O Exército peruano é um dos mais profissionais que existem

Neste mundo sem referências e sem história, o Peru pode seguir qualquer modelo: o chinês, o da integração de suas minorias indígenas, o do triunfo das mulheres ou então continuar esperando um Víctor Raúl Haya de la Torre que faça como todo mundo pensou que Alan García faria em seu primeiro mandato ou um tecnocrata, também de paletó, como Pedro Pablo Kuczynski.

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