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Considerado progressista, indicado ao STF poderá julgar Renan e Cunha

Se confirmado pelo Senado, Fachin, que incomoda ruralistas, não vai alterar perfil da corte

Gil Alessi
Fachin é advogado e professor.
Fachin é advogado e professor.APLJ

“Viverás, e para sempre na terra que aqui aforas: e terás enfim tua roça.” A citação, retirada do livro Morte e Vida Severina, do escritor João Cabral de Melo Neto, foi incluída em um ensaio de Luiz Edson Fachin, 57, indicado pela presidenta Dilma Rousseff para ocupar a vaga de Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal. Na obra, que analisa diálogos possíveis entre literatura e direito à partir da questão do latifúndio no Nordeste, o professor e jurista conclui: “A concentração de terras é tamanha que os 50 milhões de severinos miseráveis só são dela sujeitos quando saltaram da ponte da vida”. Tal como descrito por Melo Neto.

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A indicação de Fachin precisa ser aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado e pelo plenário da Casa -a primeira audiência deve acontecer em 6 de maio. É considerado por juristas mais progressista do que Barbosa. Sua nomeação foi interpretada como um aceno do Governo aos movimentos sociais, já que o professor é ligado à Central Única dos Trabalhadores (CUT) e ao MST (Movimento Sem-Terra), o que causa resistência entre ruralistas no Senado.  “Caso se confirme a indicação de Fachin, será uma mudança perceptível, já que ele está mais à esquerda do espectro político do que seu antecessor, mas isso não chega a alterar o perfil da corte”, afirma Ivar Hartmann, Coordenador do projeto Supremo em Números e professor de Direito da Faculdade Getúlio Vargas do Rio.

Admirador do escritor português José Saramago e do poeta Paulo Leminski, Fachin é sócio da Fachin Advogados Associados, que trabalha com arbitragem e mediação de conflitos, vertentes jurídicas que buscam solucionar disputas sem a judicialização do processo. Ele é especialista Direito Civil e da Família, e já foi cotado para uma vaga no Supremo duas vezes: em 2011, para o assento deixado por Eros Grau, e em 2013, para a cadeira de Ayres Britto. Ele foi preterido por Luiz Fux e Luis Roberto Barroso, respectivamente. Curiosamente, Fachin já foi citado em diversas decisões da corte.

Este ano o Supremo terá alguns julgamentos importantes, nos quais o novo ministro poderá atuar. Os casos que envolvem reforma agrária e terras indígenas preocupam seus críticos, dado seu claro posicionamento pró-distribuição fundiária. Se por um lado Fachin não participará da etapa inicial da Lava Jato no STF – ele ocupará uma vaga na primeira turma, e o caso está com a segunda -, caso o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado (PMDB-AL), se tornem réus no processo, caberá ao plenário completo julgá-los.

O indicado, que fez campanha para Dilma Rousseff em 2010, poderá ter seu suposto alinhamento com o Governo colocado à prova em breve. O Supremo pode julgar este ano a disputa entre bancos e poupadores decorrente dos planos econômicos adotados nos anos 80 e 90 e as eventuais perdas na caderneta de poupança. Em caso de decisão contra as instituições financeiras, os bancos podem ter de pagar entre 8,4 bilhões de reais, de acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, e 341,5 bilhões, nos cálculos da Federação Brasileira de Bancos. Neste caso, o governo terá de pagar metade da conta, que caberá ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal.

Fachin poderá ter seu suposto alinhamento com o Governo colocado à prova em breve

“É uma questão que afeta muitos brasileiros. Eu não me arriscaria prever como ele iria votar, acho que os dois cenários são possíveis”, afirma Hartmann. De acordo com ele, por ter um perfil de esquerda, Fachin poderia tender a apoiar a demanda dos poupadores, mas por outro lado “não é interessante para o Governo que os cidadãos ganhem”, o que pode motivar um voto pró-bancos.

Caso o ministro Gilmar Mendes devolva para o plenário o processo que proíbe doações empresariais de campanha, Fachin não terá direito a deliberar sobre o assunto, já que Joaquim Barbosa votou antes de se aposentar. Mendes pediu para examinar o caso (pedido de vista) há mais de um ano.

Outro caso espinhoso para a corte este ano é questão da divisão dos royalties do petróleo. O Congresso havia aprovado uma divisão mais igualitária dos recursos entre os Estados, mas Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo entraram com uma ação no STF para manter o modelo anterior de repasses. O Governo chegou a vetar a decisão da Câmara e do Senado, mas teve o veto derrubado. A relatora do processo, ministra Carmen Lúcia, já anunciou que o caso terá "celeridade" na corte.

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