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Brasil vive a expectativa da marcha contra o Governo de Dilma

Atos marcados para este domingo em mais de 200 cidades reivindicam desde o fim da corrupção, até a renúncia da presidenta. Políticos se manifestam contra o impeachment

Carla Jiménez
Protesto anti-Dilma, em novembro de 2014.
Protesto anti-Dilma, em novembro de 2014.Andre Penner (AP)

Tempos estranhos vive o Brasil às vésperas do que ainda não sabe nomear em sua totalidade. Com as manifestações pelo país marcadas para este domingo, dia 25, em atos que podem cobrir 200 cidades, a tentação de comparar o momento atual com outras passagens de marcado apelo popular, como junho de 2013, ou a marcha do impeachment do ex-presidente Fernando Collor em 1992, é inevitável.

O desenrolar dos atos está sendo tão esperado quanto a ‘lista de Janot’ era há menos de duas semanas, quando havia um suspense sobre a a relação de políticos citados pela Procuradoria Geral da República, no escândalo da Lava Jato. A mesma expectativa parece percorrer o país quanto ao desfecho da marcha anti-Dilma deste domingo. Quantos brasileiros irão? Será maior que o protesto de junho? Qual pauta vai prevalecer? E depois o quê? Ninguém tem certeza.

De certo, apenas o fato que tanto nos protestos de junho de 2013 como na marcha pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello havia uma unanimidade evidente no país. Em junho, o mote era a tarifa zero para o transporte público mas eram os atrasos e gastos excessivos com a Copa do Mundo que iam subtraindo a paciência dos brasileiros, até chegar ao catarse coletivo, que surpreendeu o país e o mundo.

A massa, que marchou unida, no entanto, acabou se dividindo depois, o que ficou evidente em 2014. A presidenta Dilma, identificada como uma das responsáveis por todos os problema do Brasil na ocasião em 2013, acabou sendo reeleita, ainda que com margem estreita. O resto já se sabe de cor e salteado. Parte dos brasileiros que esteve nas ruas há um ano e meio voltou a protestar, logo após a eleição, pedindo seu impeachment e até a volta da ditadura militar. Ainda que a pauta não fosse unânime, foi um empurrão para outros quem estavam engasgados com os erros do PT no poder e os escândalos de corrupção na Petrobras. Os movimentos refluíram, embora tenham chegado a reunir 10.000 pessoas.

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Agora, quem engrossa o coro não são os defensores da volta dos militares, mas quem não se identifica com o PT e cansou das denúncias de corrupção. Gente que não apoia o impeachment, mas não quer ficar calado diante do quadro atual, agravado ainda por medidas econômicas de arrocho. Com a paciência limitada, os brasileiros foram expostos a um aumento da carga de impostos logo no início do ano e do segundo mandato de Dilma, para cumprir um ajuste fiscal e cobrir um rombo que o próprio Governo abriu. Não se sabe se a gota d’água para o revide contra a presidenta foi essa alta de tarifas (de gasolina, de luz) ou a lista de Janot, que saiu no dia 6. O que se sabe ao certo é que quando a presidenta foi à TV, para ganhar a simpatia das mulheres no dia 8, o panelaço mostrou que a sua já baixa popularidade estava sendo rifada. Agora, o Governo conta as horas para ver o que virá.

“Manifestações devem ser vistas com absoluta tranquilidade”, disse ela na quinta-feira. “Pode se manifestar, deve se manifestar, faz parte do crescimento do país, do aprimoramento da cidadania. Agora, sem violência”, afirmou, em evento público no Rio de Janeiro. Mas, é difícil acreditar que no seu íntimo Dilma não esteja sentindo o peso da pressão deste momento e a angústia de não ter ideia de como estará o Brasil nesta segunda. Ainda que milhares de pessoas tenham saído em sua defesa na marcha da última sexta-feira, Dilma vive um inferno astral na política, e com parte da opinião pública, que faz barulho e quer forçar sua renúncia.

O número de pedidos de impeachment de seu mandato, registrados pela Câmara de Deputados, já chega a 19, a grande maioria registrados desde o início do ano, informa o jornal O Estado de S. Paulo. Já são mais do que 17 que Fernando Henrique Cardoso teve também ao longo de suas duas gestões. Mas ainda distante dos 34 que o ex-presidente Lula teve entre 2003 e 2010. Por isso, há uma certa esperança de que tudo esteja dentro da normalidade. Lideranças políticas dos principais partidos já se disseram contrários à ideia. De Aécio Neves, e Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), que estaria na linha de sucessão, em um caso de ruptura do gênero.

Neste sábado, foi a vez de Marina Silva (PSB-Rede) se manifestar a respeito em um texto publicado em seu site. “Há uma campanha pedindo o impeachment da presidente Dilma que foi eleita há poucos meses. Compreendo a indignação e a revolta, mas não acredito que essa seja a solução. Talvez o resultado não seja o pretendido retorno à ordem, mas um aprofundamento do caos”, escreveu. Ela lembrou que quando Collor foi deposto, haviam forças políticas mais favoráveis a uma transição.“Mas hoje quem domina as instituições são as parcelas do PMDB mais envolvidas com as práticas e métodos que estão na gênese da crise política”, explicou Marina.

O cientista político André Singer, autor de Os Sentidos do Lulismo e Esquerda e Direita no Eleitorado Brasileiro, avalia que o apoio de segmentos de centro ao grito anti-Dilma, depois das tímidas manifestações de direita no ano passado, deixam a presidenta na berlinda. “Abrir-se-á um tipo de polarização que, no passado, acabou em golpe”, escreveu ele em artigo na Folha de S. Paulo, neste sábado. “A uma manifestação seguirá, cedo ou tarde, uma contra manifestação, e assim por diante”, continua ele, que admite não acreditar em um desfecho como o golpe de Estado de 1964. Mas, prevê um processo de luta longo. A marcha deste domingo é parte desse processo, que vai testar mais uma vez a capacidade de resiliência da presidenta Dilma.

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