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Procura-se Bond, Jane Bond

Relatório do Parlamento britânico recomenda recrutar mais mulheres como espiãs Objetivo da recomendação é combater as ameaças à segurança nacional

Pablo Guimón
Homem caminha junto à sede do MI6 em Londres.
Homem caminha junto à sede do MI6 em Londres.t. m. (REUTERS)

O estereótipo do agente secreto britânico como um lobo solitário a serviço de Sua Majestade, dotado de todos os clichês machistas e perpetuado pelos filmes do personagem James Bond, não parece se adaptar às necessidades do mundo atual. O Reino Unido precisa é de mais mulheres espiãs. Essa é a conclusão de um relatório da comissão parlamentar que avalia o trabalho das três agências britânicas de inteligência e segurança (GCHG, SIS e MI5). Uma maior diversidade nas equipes dessas agências proporcionaria “uma melhor resposta às ameaças que nossa segurança nacional enfrenta”, segundo o documento de 63 páginas apresentado nesta sexta-feira pelo Comitê de Inteligência e Segurança. A luta contra o terrorismo, conclui o relatório, seria mais eficaz se se contasse com mais mulheres como espiãs.

O perfil dessas agentes não seria o das atormentadas e sensuais Bond girls. Tampouco o de Carrie Mathison, da série Homeland, entregue obsessivamente ao seu trabalho. Procuram-se mulheres normais. A comissão parlamentar recomenda às agências que se voltem a outros grupos além das recém-graduadas.

As mulheres constituem 37% do pessoal das agências britânicas de inteligência

“As mulheres e mães de meia-idade ou numa etapa intermediária das suas carreiras, que podem ter tirado alguns anos para criar os filhos, são capazes de oferecer um campo de recrutamento não explorado”, observa o relatório. Ele estimula os recrutadores dos serviços de espionagem a utilizarem novos métodos para divulgar as vagas, como o popular site Mumsnet, onde mulheres britânicas compartilham suas experiências na criação dos filhos. “As agências devem examinar seus critérios de seleção de pessoal”, recomenda o relatório. “As mulheres de meia idade têm experiência de vida, mas não necessariamente qualificações acadêmicas convencionais. O que é mais importante?”

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Atualmente, as mulheres constituem 37% do pessoal das agências britânicas de inteligência, segundo o relatório. É um percentual menor que o do conjunto dos funcionários públicos, no qual as mulheres passaram de 46% em 1991 para 53% em 2014. Ainda assim, é uma proporção significativamente maior do que no mundo empresarial, onde elas ocupam apenas 23% dos assentos nos conselhos de administração das empresas que compõem o índice FTSE100 da Bolsa londrina.

“A mudança está sendo mais lenta”, observa o relatório, “e no entanto os serviços de inteligência têm uma especial necessidade de uma equipe diversificada”. A presença feminina é ainda menor nos escalões superiores, já que, segundo o relatório, só 19% desses principais cargos são ocupados por mulheres. “Se você se parece comigo, não pode operar nas áreas em que precisamos operar”, relatou à comissão parlamentar um ex-diretor geral do MI5, o serviço doméstico de inteligência. “Estamos progredindo no recrutamento de mulheres negras ou pertencentes a minorias étnicas, mas leva um tempo até que isso se espalhe para toda a hierarquia do serviço.”

“Quando todos os profissionais da inteligência forem selecionados com o mesmo padrão e compartilharem da mesma origem e de características similares”, aponta a deputada trabalhista Hazel Blears, membro do comitê, “provavelmente eles compartilharão preconceitos inconscientes que circunscreverão tanto a identificação dos problemas como a busca por soluções”.

Mães de meia-idade ou numa fase intermediária da carreira são o perfil recomendado

O comitê se reuniu durante meses com os chefes das três agências e considera que eles estão fazendo “um bom trabalho” nesse terreno. “Há um forte compromisso com a busca pela diversidade nas cúpulas das organizações, mas há espaço para melhorar”, diz o relatório. Ele estabelece também seis recomendações para o trabalho das agências nos próximos 12 meses, como a de romper “a tradicionalíssima mentalidade masculina” que impera nos médios escalões e tratar de assuntos como a conciliação da carreira profissional com a maternidade e a criação dos filhos.

O relatório conclui que, dada a inter-relação entre as agências de inteligência dos diferentes países, o recrutamento de mais mulheres espiãs seria um trabalho a ser feito coordenadamente. “Abordar a diversidade de gênero não é algo que o Reino Unido deva fazer de forma isolada”, afirma. “Estamos convencidos de que podemos aprender com as iniciativas dos nossos aliados.” A ex-secretária de Estado norte-americana Madeleine Albright, que dirigiu uma investigação semelhante na CIA, disse que o relatório britânico “ressalta as tremendas capacidades, o talento e a experiência das mulheres que trabalham para proteger a segurança nacional nos serviços de inteligência” no Reino Unido. “Tenho certeza”, acrescenta, “de que todos nos beneficiaremos de uma estreita colaboração nesse assunto vital entre os dois países”.

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